Autor original: Marcos da Silva Graça
Seção original: Novidades do Terceiro Setor
Lutar para que todas as crianças e o adolescentes tenham seus direitos respeitados - tais como a garantia à vida, à educação, à dignidade, ao respeito e à liberdade - para que cresçam com dignidade e exercendo plenamente sua cidadania. Esta é a essência da Ação em Rede pela Criança e Adolescente (Arca), projeto lançado no último dia 14, no auditório da Fundação Joaquim Nabuco, em Recife. A nova iniciativa integra seis ONGs pernambucanas para promover o fortalecimento dos programas e do atendimento realizados por cada entidade. O projeto - que conta com o apoio da agência de cooperação para o desenvolvimento Intermon Oxfam - reúne o Centro de Cultura Luiz Freire (CCLF), o Centro Dom Hélder Câmara de Estudos e Ação Social, o Centro das Mulheres do Cabo, o Coletivo Mulher Vida, a Casa de Passagem e o Movimento de Apoio aos Meninos de Rua.
”O trabalho conjunto destas entidades surgiu a partir do Programa Infância Desfavorecida em Meio Urbano, desenvolvido com a cooperação da União Européia, de 1996 a 1999, em quatro capitais do país”, conta o coordenador do Programa de Desenvolvimento Local do Centro de Cultura Luiz Freire, José Fernando Silva. Segundo ele, o objetivo da Arca é contribuir para a melhoria da qualidade de vida da criança e do adolescente em quatro municípios da região metropolitana da capital pernambucana: Recife, Olinda, Cabo de Santo Agostinho e Jaboatão dos Guararapes. “Nossa atuação tem priorizado ações integradas e complementares voltadas à criança e ao adolescente e suas famílias, por meio do diálogo com segmentos sociais e com o poder público”, destaca.
Entre as atividades a serem realizadas no âmbito da Arca estão o atendimento jurídico-psico-social a crianças e adolescentes e suas famílias; formação e capacitação de profissionais especializados para este tipo de atendimento; qualificação profissional e inserção de adolescentes e jovens no mercado de trabalho; fortalecimento institucional de entidades da sociedade civil e participação da Arca nos espaços institucionais de promoção e controle das políticas públicas. “Uma preocupação importante que temos é com a instalação ou fortalecimento dos Conselhos e Fóruns Municipais da Criança e do Adolescente, além dos próprios Conselhos Tutelares”, observa José Fernando, que representa o CCLF na Rede. Para ele, após os dois anos do projeto, que só trabalhará em quatro municípios, a experiência desenvolvida poderá ser estendida para o resto do estado e até transferida para outras redes que existam ou que surjam no país.
Integrante há quatro anos do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, onde atualmente é vice-presidente, José Fernando acredita que a sociedade brasileira tenha avançado no tratamento da questão que envolve 14 milhões de crianças e adolescentes brasileiros sem seus direitos garantidos, segundo estimativas do Unicef. “Temos realizado bons avanços, como o avanço na implementação do Estatuto da Criança e do Adolescente ou do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, mas é necessário um esforço maior para enfrentarmos questões graves como a violência dentro do lar e o envolvimento de adolescentes com o tráfico de drogas”, complementa. Segundo ele, a Arca surge principalmente para estimular os agentes da sociedade no atendimento da criança e do adolescente e potencializar ações que estão sendo realizadas para a obtenção de melhores resultados.
Sonhar coletivamente
“A situação é difícil, mas se sonharmos sozinhos teremos apenas a solidão, enquanto se sonharmos coletivamente teremos a solução”. É assim que o padre Ramiro Ludeño Amigo, que atua como coordenador Movimento de Apoio aos Meninos de Rua, defende a formação da Arca. Somente na região metropolitana de Recife existem, segundo pesquisa do Centro Interuniversitário de Estudos da América Latina, 1.184 meninos e meninas em situação de rua; 34% dos adolescentes entre 15 e 19 anos estão fora das escolas; e na capital existem hoje 35 mil crianças e adolescentes com menos de 16 anos trabalhando ilegalmente.
O padre salesiano já trabalha com este assunto há 29 anos, 14 destes só na entidade recifense. “Queremos unir forças para ampliarmos nossa atuação e envolvermos mais ainda a sociedade civil. Nossa entidade, por exemplo, recupera crianças e adolescentes em situação de rua, mas não tínhamos experiência na influência e negociação de políticas públicas”, destaca. Para ele, desta forma as ações tomam maior amplidão. “Temos a responsabilidade agora de divulgarmos mais a Rede, pois ela ainda é pouco conhecida, mas com a realização de fóruns e seminários programados poderemos reverter esta situação”, afirma. Segundo Ludeño, as crianças têm ido cada vez mais cedo para as ruas e enfrentado os perigos que o cercam. “Temos que priorizar as medidas preventivas em vez das repressivas, pois uma criança na Febem custa mais de R$ 1 mil por mês, enquanto que um programa como o de renda familiar com um salário-mínimo pode afastá-la deste futuro”, completa.
O mesmo defende Maria Aparecida Araújo Santos, coordenadora de projetos no Centro das Mulheres do Cabo, onde trabalha há 10 anos. “É por meio da prevenção que poderemos não só evitar males muito graves que a sociedade enfrenta hoje em dia, como a violência, mas também criarmos jovens conscientes, que serão replicadores da cidadania que conseguiram construir em suas próprias vidas”, observa.
Para a educadora, alguns resultados do funcionamento experimental da Arca, que começou em março, já foram alcançados, segundo levantamento feito até agosto: 22 crianças afastadas das ruas, atendimento de 207 vítimas de violência sexual e de 250 casos de violência doméstica; destes, 166 com ação judicial já impetrada. “Esse é só o começo, pois as metas da Arca são amplas. A Rede pretende até fevereiro de 2005 atender grande parte das 46 mil crianças e adolescentes em situação de grave risco pessoal e social, qualificar profissionalmente 1.520 adolescentes e promover o retorno de 180 crianças e adolescentes em situação de rua para suas comunidades”, afirma.
Maria Aparecida, que faz parte do conselho gestor da Arca, aponta também a importância do trabalho dessa nova rede na elaboração de políticas públicas na área, baseadas na experiência político-pedagógica das entidades da sociedade civil, que poderão monitorá-las. “Tivemos a felicidade de termos organizações sólidas com atuação de longo tempo com crianças e adolescentes para criarmos a rede, mas desejamos que esta iniciativa estimule estados que ainda não possuem este tipo de associação”, finaliza, lembrando, assim, a importância da divulgação da Arca.
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