Autor original: Marcelo Medeiros
Seção original: Os mais interessantes e ativos projetos do Terceiro Setor
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Há anos a aposentada Sônia Regina Gonçalves da Silva, de 52 anos, dedica seu tempo ao trabalho na Associação de Mulheres e Amigos do Morro do Urubu (Amamu), localizada no bairro de Pilares, zona norte do Rio. Sempre que há algum evento na comunidade, ela, que é presidente da entidade, e mais alguns voluntários comparecem - não apenas para festejar. Sua missão é informar os moradores sobre os riscos da Aids e as formas de prevenir o contágio. “Vamos ao pagode, às festas e até ao supermercado. Montamos uma barraca, distribuímos panfletos, camisinhas e conversamos com quem passar. Além disso, quando necessário, organizamos palestras na associação para chamar a atenção para esse problema”, explica.
Algumas dessas atividades e as formas de desenvolvê-las foram iniciativas da própria Amamu, mas outras são resultado de trocas com outras organizações. O intercâmbio é feito nas reuniões mensais da Rede de Comunidades na Luta Contra a Aids, que foi formada em julho de 2001 e reúne 53 entidades da região metropolitana fluminense. Em 2002, essa área registrou, segundo a Secretaria Estadual de Saúde, 1.466 novos casos, uma taxa de incidência de 15,7 casos por 100 mil habitantes. A rede conta com apoio do Centro de Promoção da Saúde (Cedaps), que ajudou a implementá-la e lhe dá assistência.
O início da rede aconteceu de maneira informal. Algumas líderes comunitárias, entre elas Sônia Regina, já eram assessoradas pelo Cedaps e, em vários momentos, manifestaram interesse em conhecer um pouco mais do trabalho de outras organizações que também combatessem a contaminação pelo vírus da Aids. Havia ainda as que queriam começar atividades, mas não sabiam como e o que fazer. “Sentíamos necessidade de trocar informações e discutir nossas atividades”, diz Sônia.
A primeira reunião foi presenciada por 22 representantes de associações comunitárias de mulheres ou lideradas por elas. A influência feminina fica clara no primeiro nome dado ao grupo: Rede de Associações de Mulheres para o Trabalho Comunitário de Prevenção. Logo o nome mudou, pois outras organizações foram sendo chamadas para dar sua contribuição e aprender um pouco mais. Em maio de 2002 já eram 41 entidades. A coordenação das atividades ficava a cargo do Cedaps, mas há oito meses a entidade deixou o posto, hoje ocupado por uma organização eleita a cada encontro. “O espaço virou um local de produção de conhecimento”, afirma Wanda Guimarães, coordenadora do Cedaps.
Uma das novas entidades é o grupo Ecologic Bike, de Duque de Caxias, que entrou na rede no fim de 2001. “Estávamos em busca de parcerias e conseguimos”, diz Carlos Alberto, um dos diretores da entidade, que, como o nome em inglês diz, promove passeios ciclísticos e defende a natureza em Magé. Uma das novidades aprendidas por ele foi o “camelô educativo”. O nome é uma referência aos comerciantes ambulantes muito comuns no Rio, que montam suas barracas nas áreas mais movimentadas da cidade e gritam para chamar a atenção. Mas, ao contrário dos trabalhadores informais, o serviço dos “nós” da rede é educacional e menos agitado. “Não vendemos mercadorias, distribuímos informações”, brinca Sônia Regina, uma das primeiras a implementar o estande onde são distribuídos panfletos e feitas demonstrações de uso de preservativos, que ficam disponíveis para quem parar na banca.
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O empenho tem surtido efeito. Uma pesquisa feita pelo Cedaps no começo deste ano apontou, como resultado do trabalho das organizações, maior interesse das comunidades por informação; envolvimento dos moradores no trabalho; reconhecimento da instituição comunitária como referência na localidade; aprendizado e crescimento pessoal dos envolvidos nas atividades, além da ampliação da procura por preservativo.
Problemas
A Amamu distribui mensalmente 1.044 camisinhas na comunidade do Urubu e áreas próximas, todas doadas pela Secretaria Municipal de Saúde do Rio ao Cedaps, que as repassa às componentes da rede. A quantidade, porém, é insuficiente para atender a demanda. Segundo cálculos feitos pela associação, seriam necessárias pelo menos mais 600 unidades por mês. De acordo com o Cedaps, o déficit está presente em boa parte das organizações.
O trabalho de prevenção da Rede inclui ainda palestras, campanhas e eventos como o que a Ecologic Bike realizou em comemoração ao dia do trabalhador no bairro do Fragoso, em Magé - cidade que apresentou, em 2002, uma taxa de 25,6 casos notificados a cada 100 mil habitantes, o equivalente a 55 pessoas contaminadas, segundo dados da Secretaria Estadual de Saúde. É a segunda mais alta da região metropolitana, atrás apenas de Japeri. “Aproveitamos o 1º de maio e a presença da mídia para fazer um gancho para o problema da Aids na cidade. Assim, mostramos os males da doença e os benefícios do uso de preservativo para que as pessoas possam pensar melhor sobre suas condutas”, lembra Carlos Alberto. Segundo ele, estiveram presentes mais de seis mil pessoas para as comemorações do dia do trabalho em Magé, o que deu um grande retorno à campanha.
Geralmente, as atividades promovidas pelas organizações da rede juntam de 10 a 30 pessoas, principalmente jovens, alvo prioritário das atividades. A intenção, porém, é ampliar o público, no entanto faltam recursos e pessoal. Todas as entidades dependem de trabalho voluntário, pois não têm dinheiro para contratar. A Amamu de Sônia Regina, por exemplo, só possui uma bolsa, de R$ 120, dividida por três pessoas que trabalham revezando os turnos. No resto do tempo, procuram emprego.
A solução para esse tipo de problema, segundo Wanda Guimarães, é qualificar o trabalho das associações ao mesmo tempo em que elas são capacitadas. “Dessa forma elas podem ter um discurso mais elaborado e projetos melhor estruturados, além de avaliações consistentes de suas práticas. Antes era tudo muito desordenado e sem avaliação. Sei que esse é um modelo típico de ONGs, mas as associações também precisam dele para obter financiamentos”.
Guimarães aponta mais uma dificuldade a ser superada: a vinculação da imagem da rede com a do governo. Segunda ela, muitas lideranças preferem não ser associadas a atividades oficiais para não perderem a independência e crítica. Mas, há alternativas: entre elas está a formação de agentes de saúde dentro da comunidade, com apoio das secretarias. Assim, com a capacitação dos próprios moradores, estes seriam as pessoas identificadas com a promoção da saúde e, não, agentes do governo. “O poder público deve agregar e não ser descartado”, diz a coordenadora do Cedaps, “afinal, o trabalho das organizações é para o bem da comunidade. De qualquer forma, torcemos para que a rede se fortaleça”.
As reuniões da rede acontecem uma vez por mês no auditório do Sindicato dos Bancários do Rio de Janeiro, que fica na Avenida Presidente Vargas, 502, 21º andar, Centro. A participação é aberta a todas as associações interessadas. A próxima acontece no dia 17 de dezembro, às 10h.
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