Autor original: Fausto Rêgo
Seção original: Notícias exclusivas para a Rets
Um caso exemplar de luta contra a exploração gananciosa da água ocorreu na cidade boliviana de Cochabamba, no final da década passada. A privatização do sistema público de abastecimento no país entregou à corporação norte-americana Bechtel o controle do fornecimento por 40 anos, através da Aguas del Tunari, sua subsidiária local. De imediato, a empresa decidiu aumentar o valor das tarifas, que chegou a triplicar, inviabilizando o consumo da população mais pobre, e manifestou interesse em manter a posse de fontes, rios e mananciais. Houve enorme revolta e uma multidão foi às ruas para protestar e pedir o cancelamento do contrato, o que acabou acontecendo – o governo rescindiu o contrato em 2000 e o sistema voltou a ser administrado pelo poder público, a despeito dos protestos da multinacional, que entrou na Justiça para exigir uma indenização milionária.
No Brasil, uma batalha semelhante se trava na cidade de São Lourenço, em Minas Gerais, com outra multinacional. A Nestlé, por intermediário de sua subsidiária Empresa de Águas, explora comercialmente fontes de água mineral da região. Em 1999, um relatório encomendado pelo governo do estado à Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais denunciou o risco de desaparecimento da fonte magnesiana e redução das demais fontes em decorrência da superexploração. Outra acusação que pesa sobre a Nestlé é a de que a instalação do seu parque industrial dentro do Parque das Águas, principal ponto turístico da cidade, contraria as normas ambientais e o código de obras do município. Além disso, a empresa estaria restringindo, por diversas ocasiões, o acesso da população a algumas fontes.
Mais recentemente, a multinacional passou a produzir uma nova água, a Pure Life, cuja matéria-prima é obtida na Fonte Primavera. No entanto a água original, que tem propriedades medicinais, é desmineralizada pela companhia, que posteriormente adiciona oxigênio e outros minerais. Para o coordenador do projeto Gente Cuidando das Águas, Demóstenes Romano, esse procedimento é absurdo. "Que pegassem uma água não mineral! Águas com essas características são um privilégio. É preciso respeitar a nobreza da água mineral como água medicinal".
A mobilização da sociedade civil se deu através do movimento Cidadania pelas Águas, que desde 2001 tem pressionado as autoridades locais e a Nestlé em nome da preservação do Parque das Águas e das fontes. A empresa prometeu interromper a produção da Pure Life no local e construir um fontanário dentro do parque para que os visitantes tenham acesso às águas da Fonte Primavera. A luta, no entanto, ainda parece longe de terminar. A comunidade teme que o acordo não seja cumprido, mantém-se em estado de alerta e pede o boicote a produtos fabricados pela Nestlé.
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