Você está aqui

Decisão inédita no caso de assassinato de sem terra

Por 4 votos a 3, os jurados que compuseram o Tribunal do Júri desta quarta-feira (27) decidiram pela condenação de Jair Firmino Borracha, acusado de matar, em 1999, Eduardo Anghinoni – irmão de uma das principais lideranças do MST no Paraná.A condenação foi de 15 anos, mas Borracha poderá recorrer a decisão em liberdade.A família da vítima, que acompanhou o julgamento, se emocionou muito com a decisão, mas afirmou que a condenação é de apenas um dos pistoleiros, ficando ainda sem resposta quem mandou cometer o crime e quem arcou com a estrutura montada na região noroeste do Paraná que perseguia, torturava e assassinava trabalhadores pertencentes ao MST.O juiz que comandou a sessão, Dr. Daniel Ribeiro Surdi Avelar, manifestou-se durante a leitura da sentença final ao dizer que, se este julgamento tivesse ocorrido antes, outras vidas poderiam ter sido poupadas. Entre 1995 a 2002, 16 trabalhadores rurais sem terra foram assassinados no estado. O Juiz ainda relembrou das duas sentenças condenatórias dadas pela Corte Interamericana da OEA que condenaram o Estado Brasileiro em casos envolvendo perseguição e assassinato de trabalhadores rurais também na região noroeste (Interceptações Telefônicas e Sétimo Garibaldi). Cabe ressaltar ainda que este foi o primeiro Júri a condenar um criminoso envolvido em morte de sem terra, já que nos julgamentos de Sebastião da Maia e Vanderlei das Neves os acusados infelizmente foram absolvidos. Os depoimentos colhidos e as evidências mostradas durante o Júri sobre a morte de Anghinoni reforçam a hipótese da existência no Paraná de uma organização criminosa que atuava ilegalmente a fim de barrar a luta dos trabalhadores por Reforma Agrária. O Júri foi, inclusive, acompanhado pelo ex-presidente da UDR, Marcos Prochet, que estava com a família do acusado. Prochet é acusado de assassinar outro trabalhador sem terra, Sebastião Camargo Filho.Na avaliação dos movimentos e organizações que acompanharam todo o julgamento, o desaforamento do Júri deu condições reais de realização do mesmo. Para elas, a condenação auxiliará que novos crimes no campo não aconteçam e que os conflitos fundiários e ambientais possam ser resolvidos pelo estado a partir da concretização de políticas públicas garantidoras de direitos, como o direito à terra, à alimentação e, principalmente, à vida.Fonte: Terra de DireitosConheça a história:Pistoleiro envolvido em milícia privada vai a Júri inédito no ParanáAcontece hoje, em Curitiba, o Tribunal de Júri que poderá punir pela primeira vez um caso de milícia privada no campo. O assassinato de Eduardo Anghinoni ocorreu em Querência do Norte, noroeste do Estado, em 1999, e envolve a atuação de milícias armadas, patrocinada por fazendeiros e políticos locais para despejar, ameaçar, torturar e assassinar trabalhadores rurais sem terra. Eduardo Anghinoni foi morto por engano, quando visitava seu irmão, Celso, uma das principais lideranças do MST no Paraná. O acusado do crime é Jair Firmino Borracha, pistoleiro contratado por uma “empresa de segurança”, que chegou a ser preso durante as investigações do caso. No momento de sua prisão, Borracha empunhava uma arma contra os policiais e um exame de balística comprovou que desta arma saíram os tiros que mataram Eduardo. Apesar dos indícios e das testemunhas, o acusado nunca chegou a cumprir pena. Diversos artifícios usados nos trâmites do Judiciário fizeram com que, mesmo depois de 13 anos, o caso permaneça sem resolução. O principal objetivo do Júri é definir se Borracha foi ou não quem disparou o tiro que matou Eduardo, e assim finalmente por fim à impunidade deste assassinato . Para as organizações e movimentos que acompanham o caso, a morte de Eduardo Anghinoni não se trata de um episódio isolado. Ocorrido no auge das perseguições contra o MST no Paraná, este assassinato é mais uma das peças de um complexo mosaico de ilegalidades e violências, motivado pela impunidade e ausência do Estado brasileiro. Milícias armadas ameaçam luta por direitos humanos Eduardo Anghinoni morreu por um engano, já que era seu irmão, Celso, quem recebia as ameaças de morte. Mas o tiro disparado naquela noite de 1999 tinha alvo certo: a luta encabeçada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. O que separou o plano do fato foi uma lâmpada queimada na sala, que impediu o pistoleiro de diferenciar quem era quem no meio do assentamento de Querência do Norte. A região noroeste do Estado se transformou em um palco de conflitos sangrentos porque concentrava uma grande parte das terras subutilizadas do Paraná, onde ao invés de pasto deveria haver produção agrícola, que gera renda, mantém famílias no campo e abastece a mesa de milhares de pessoas do campo e da cidade. A intensa atuação do MST no Paraná na década de 90 mexeu com os interesses de muitas elites do estado, que queriam barrar a luta pela reforma agrária. Para isso, arquitetaram um forte aparato repressor, a partir da união entre fazendeiros, empresas de segurança, políticos locais com a permissividade do governo Jaime Lerner e a omissão do estado frente a má distribuição de terras. A responsabilidade pela morte de Anghinoni é de muitos, mas é preciso identificar e responsabilizar pistoleiros, mandantes e patrocinadores para revelar este esquema ilegal que se opõe a atuação dos movimentos sociais no campo. Muitos perguntam por que julgar um crime que já aconteceu há tanto tempo. Mas é preciso refletir que a cultura de violência no Brasil só estará perto do fim quando os culpados forem devidamente julgados e punidos. O silêncio frente a casos como este é o que empobrece a nossa democracia. Defender livremente os direitos humanos é poder contar uma história diferente, de luta, liberdade e justiça. Autoridades federais são notificadas sobre realização de júri no Paraná Além da presença de familiares, militantes e organizações de direitos humanos, o Júri sobre o assassinato de Eduardo Anghinoni deverá ser acompanhado por autoridades federais, parlamentares e políticos locais. A ministra Maria do Rosário, da Secretaria de Direitos Humanos, e o ministro Gilberto Carvalho, da Secretaria geral da Presidência da República, foram avisados sobre o Júri e orientados para o acompanhamento do mesmo, tendo em vista a impunidade crônica relacionada a onda de violência desencadeada no Brasil pelos conflitos fundiários e ambientais. A mobilização de autoridades começou na terça-feira desta semana, dia 19, durante a reunião nacional do Programa de Defensores de Direitos Humanos. Representantes da sociedade civil reforçaram as autoridades presentes a importância do caso, lembrando que os atuais assassinatos ocorridos na Amazônia são respaldados pela impunidade de crimes, como o que matou o trabalhador Eduardo Anghinoni. Até mesmo o Pró-Vita, Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas, recebeu um aviso sobre o Júri, já que uma das testemunhas centrais para o desfecho do caso foi ameaçado recentemente.O caso Anghinoni, juntamente com outros assassinatos ocorridos no Paraná (leia abaixo), irá integrar a lista nacional de mortes por conflitos fundiários, que serão analisadas por comissão do Programa Defensores, composta pela Secretaria de Direitos Humanos, Ministério da Justiça, CNJ, Ministério Público e organizações de direitos humanos. O objetivo é que a cultura de violência e impunidade, que assume caráter crônico em todo o país, chegue a seu fim a partir do julgamento comprometido dos casos, da punição de pistoleiros e mandantes e da implementação de políticas públicas. Conheça os casos de assassinato de trabalhadores rurais sem terra no Paraná: Diniz Bento da Silva (Teixeirinha) – 1993, em Campo Bonito: morto por policiais após uma busca que realizou tortura sobre vários trabalhadores rurais sem terra. Teixeirinha havia se escondido da polícia, até saber que seu filho, com 13 anos, estava nas mãos dos policiais. Entregou-se, foi algemado e arrastado em direção à roça, onde moradores ouviram vários disparos de tiros. O caso teve repercussão internacional e levou o governo brasileiro a ser alvo do relatório, em 2001, da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA. Vanderlei das Neves e José Alves dos Santos – 1997, em Rio Bonito do Iguaçu: no mesmo dia em que o Presidente assinou o decreto de desapropriação de parte da área da empresa Araupel (grupo Giacometi Marodin), seis trabalhadores foram alvejados por pistoleiros. Vanderlei das Neves tinha na época 16 anos. A realização do Júri foi cancelado por oito vezes e os acusados absolvidos. Sebastião Camargo Filho – 1998, em Querência do Norte: Durante um despejo ilegal realizado por uma milícia armada de fazendeiros, pistoleiros mandaram que todos se deitassem no chão, com o rosto voltado para baixo. Sebastião Camargo Filho, com 65 anos, sofria de um problema cervical que o impedia de permanecer agachado. Ao ver que o trabalhador não cumpriu sua ordem, o homem que comandava o despejo apontou uma escopeta calibre 12 e disparou contra ele a menos de um metro de distância. O ex-presidente da União Democrática Ruralista – UDR, Marcos Prochet, foi identificado como o atirador e poderá ir a Júri Popular. O caso foi levado à OEA e a Comissão IDH recomendou ao Estado brasileiro, dentre outras medidas, a apuração do caso. Sétimo Garibaldi – 1998, em Querência do Norte: Assassinado durante outro despejo ilegal realizado por pistoleiros. Durante a ação, Sétimo recebeu um tiro na coxa e morreu sem atendimento. O inquérito policial do caso havia sido arquivado em 2004 pela juíza Elizabeth Kather, que em outra ação ilegal da polícia compactuou com os grampos ilegais em integrantes do MST, caso que o Brasil foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA. Com o arquivamento do inquérito da morte de Sétimo, ninguém foi denunciado pelo crime. Após grande pressão dos familiares, do MST e de organizações de direitos humanos em 2011 o Ministério Público apresentou a denúncia criminal sobre o caso contra o fazendeiro Morival Favoreto. Sebastião da Maia – 2000, em Querência do Norte: Durante uma emboscada, o lavrador Sebastião da Maia foi morto com dois tiros a queima-roupa por pistoleiros. Na Justiça, o caso foi marcado por irregularidades permitidas pela então juíza Elizabeth Kharter. Manobras realizadas pela defesa do acusado fizeram com que o Júri fosse adiado por três vezes, o que arrastou o julgamento em seis anos. Apesar de uma testemunha reconhecer o pistoleiro durante o julgamento, o acusado foi absolvido. Antonio Tavares – 2000, em Curitiba: Assassinado pela polícia militar durante uma marcha pela reforma agrária em Curitiba. Logo na entrada da cidade, cerca de cinqüenta ônibus que chegavam para o ato foram interceptados pela PM. Assim que os primeiros trabalhadores desceram dos ônibus, policiais começaram a atirar. Cerca de 180 pessoas ficaram feridas durante o incidente. Antônio Tavares foi atingido no abdômen e faleceu horas mais tarde. O policial responsável pelo disparo foi absolvido pela Justiça Militar e o caso foi arquivado na Justiça Comum. Pelas irregularidades do caso, foi encaminhada uma denúncia para a OEA, que em 2009 admitiu o caso na Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Elias Gonçalves de Meura – 2004, em Guaiçará: Elias tinha 20 anos quando foi assassinado, dentro da Fazenda Santa Filomena. Em julho de 2004, trabalhadores se organizaram para ocupar a propriedade improdutiva, mas foram recebidos com disparos de arma de fogo, que feriram sete trabalhadores rurais sem terra. Um dos tiros acertou o trabalhador Elias de Meura, que faleceu logo em seguida. Mesmo após sete anos do crime, o inquérito policial permanece inconcluso. Valmir Motta de Oliveira, “Keno” – 2007, em Santa Tereza do Oeste: O MST ocupou a área da empresa Syngenta, porque a transnacional realizava testes ilegais com transgênicos nas proximidades do Parque Nacional do Iguaçu – fato que rendeu uma multa de 1 milhão de reais, nunca paga pela empresa. Pistoleiros arrombaram o portão e executaram o militante Valmir Mota com um tiro no peito. No Boletim de Ocorrência feito pela Polícia Militar, os pistoleiros informaram que foram contratados pelo Movimento de Produtores Rurais e a Sociedade Rural de Cascavel. O processo criminal que apura a responsabilidade pelo ataque armado ainda está na fase inicial. Ninguém da Syngenta e nenhum mandante foi processado, enquanto oito vítimas do ataque acabaram sendo processados. Eli Dallemole – 2008, em Ortigueira: Após dois anos de ameaças, Eli foi morto em sua casa, na frente de sua esposa e filho, enquanto preparava um chimarrão. Tinha 42 anos e era coordenador estadual do MST. Estava assentado na Fazenda Copramil, onde dois supostos proprietários disputavam a titularidade. Dias antes de sua morte, Eli tentou registrar um boletim de ocorrência sobre ameaças, mas foi informado de que não havia ninguém para escrever o BO. Antes do assassinato, os pistoleiros foram à fazenda por duas vezes, onde renderam e espancaram trabalhadores rurais. Eli havia expulsado do acampamento um homem que estava infiltrado na área, e que foi preso no mesmo ano pelo Cope (Centro de Operações Policias Especiais), acusado de pertencer a uma quadrilha que roubava gado e, aliada a ruralistas, infiltrava pessoas no MST para desestabilizar o movimento. Mais informações:www.terradedireitos.org.brwww.mst.org.brNo Twitter: #jurianghinoni 

Theme by Danetsoft and Danang Probo Sayekti inspired by Maksimer