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Vida após o câncer

Autor original: Fausto Rêgo

Seção original: Novidades do Terceiro Setor





Vida após o câncer

Wanir Rotta dava aulas de educação artística para crianças. Mas preferiu parar de lecionar para poder cuidar dos filhos. Nessa época, sequer passava por sua cabeça que uma criança pudesse ter câncer. E a descoberta veio da pior forma possível. Wanir e seu marido, o cirurgião José Marcus Rotta, souberam que o filho Thiago estava com leucemia numa época em que no Brasil ainda não se faziam transplantes de medula. A família tentou o que foi possível e chegou a levar o menino para os Estados Unidos, mas Thiago não resistiu. Enquanto lutavam contra a doença, Wanir e Marcus começaram a nutrir o projeto de ajudar outras crianças em situação semelhante. Foi assim que nasceu, há 19 anos, a Associação de Apoio à Criança com Câncer (AACC). De lá pra cá, outros sonhos foram acalentados e realizados. E agora o mais ambicioso deles está bem perto de virar realidade.

Até o final do mês, será lançada a pedra fundamental do Instituto Pós-Câncer Thiago Cavalcanti Rotta, que vai ocupar um terreno de 1.100 metros quadrados na Vila Clementino, na capital paulista. A obra está orçada em aproximadamente R$ 9,4 milhões e resultará em um prédio de sete andares com capacidade para atender cerca de 500 crianças por ano. A intenção é que o instituto seja o mais completo centro de tratamento pós-câncer do país, voltado para um público de até 20 anos de idade. Wanir Rotta não se contém: "Estamos muito ansiosos, eufóricos, não vemos a hora de o instituto começar a funcionar".

Para ela, a iniciativa vai complementar o trabalho que a AACC vem desenvolvendo há 19 anos. "Inicialmente oferecíamos apenas o alojamento; depois passamos a dar alimentação, condução e escola. E fomos ampliando, identificando as necessidades dos pacientes. Nós conhecemos bem o problema, sabemos o quanto é difícil e procuramos dar todo o suporte para que os pacientes sejam atendidos da melhor forma possível", diz. A criação do instituto, continua, garantirá melhores condições para que se desenvolva o trabalho de acompanhamento psicológico e reintegração, com orientação de psicólogos, pedagogos e terapeutas. "A humanização do tratamento é muito importante", afirma. "Queremos que os pacientes tenham todo esse suporte que já oferecemos na associação e ainda o atendimento pós-câncer. Um paciente pode, após o tratamento, ter ficado com seqüelas psicológicas ou físicas, como a amputação de um membro, e precisa voltar ao convívio social. Por isso vamos oferecer todas as especialidades médicas para facilitar sua reintegração", explica. O apoio psicológico é extensivo também às famílias dos pacientes. "Costumo dizer que o câncer é uma doença familiar, porque envolve todo mundo e exige um tratamento muito longo", justifica.

De acordo com o projeto, o prédio terá sete andares, reunindo centro cirúrgico, unidade de terapia intensiva, ambulatório e laboratório. Dois andares serão reservados para internação e um outro vai abrigar o setor de transplantes de medula óssea. Os sistemas elétrico e hidráulico serão "inteligentes" e devem proporcionar uma economia estimada em 30% – iluminação e ar condicionado serão desligados automaticamente quando não houver ninguém no ambiente e um reservatório vai armazenar a água da chuva e das duchas para aproveitamento nos vasos sanitários. "Pretendemos ter a obra terminada em três anos, mas o instituto já estará funcionando parcialmente dentro de um ano", promete Wanir.

Segundo ela, a AACC está trabalhando com uma meta inicial de sustentação por cinco anos. A verba é obtida em ações e campanhas realizadas pela entidade e também por meio de doações de algumas empresas. Além disso, a instituição deverá receber recursos oriundos do Sistema Único de Saúde (SUS).

A associação

Estima-se que mais de 40 mil crianças tenham sido atendidas pela AACC desde sua criação, em abril 1985., No início, a entidade se dedicava a alojar crianças pobres provenientes da periferia de São Paulo, do interior ou de fora do estado. As famílias que não tinham como manter o tratamento após a alta hospitalar encontravam ali condições adequadas para prosseguir. Com o tempo, a entidade passou a oferecer também alimentação, medicamentos, próteses, transporte e apoio psicológico em suas duas unidades na capital paulista. Em 1995, a associação inaugurou uma escola para que os seus pacientes não precisem interromper os estudos durante o tratamento. Dessa forma, podem continuar levando uma vida normal e concluir o ano letivo após terminarem o tratamento. "Quando um paciente chega, nós entramos em contato com a sua escola de origem e passamos a dar a ele ou a ela o mesmo currículo que vinha recebendo", conta Wanir. Além do currículo tradicional, a criança assiste a aulas de informática e inglês.

A maior parte dos profissionais da AACC trabalha voluntariamente e as atividades se mantêm graças a doações, campanhas e à contribuição de cerca de 500 sócios.

Fausto Rêgo

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