Autor original: Mariana Loiola
Seção original: Novidades do Terceiro Setor
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Há quatro anos, três organizações não-governamentais do Brasil e uma do México se uniram para criar um programa com o objetivo de envolver homens jovens de seus países em projetos e políticas de promoção de saúde e eqüidade de gênero. Trata-se do Programa H, que consiste em trabalhos, junto à população masculina jovem, de encorajamento de atitudes e comportamentos que ressaltem a igualdade de direitos entre homens e mulheres e de promoção de uma maior atenção sobre a importância do cuidado com a saúde. Hoje o Programa H – iniciativa do Instituto Promundo, Instituto Papai e Ecos, do Brasil, e do Salud y Género, do México – conta com a parceria de instituições como a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), entre outras. Sua metodologia é aplicada em diversos países da América Latina e da América Central e na Índia. Nos EUA e no Canadá, o programa está em processo de implementação, segundo o diretor do Instituto Promundo, Gary Barker.
Para avaliar o impacto dessa iniciativa, cada vez mais multiplicada, o Instituto Promundo e o Horizons Program (programa do governo dos Estados Unidos voltado para a área de gênero e Aids) realizaram em 2003 uma pesquisa com 780 homens jovens de 14 e 25 anos que participam do programa em três comunidades de baixa renda da cidade do Rio de Janeiro (Maré, Bangu e Morro dos Macacos). Para o diretor do Promundo, a pesquisa aponta tendências que são reveladoras do comportamento de jovens não apenas dessas comunidades, mas de outras comunidades pobres de centros urbanos no país. A média de renda e escolaridade dos entrevistados corresponde à média dos dados do IBGE sobre a situação dos jovens da periferia urbana, segundo Gary Barker. Os resultados dessa pesquisa foram apresentados no último dia 26, no auditório da Opas, em Brasília.
Ameaça à saúde
O estudo mostra que atitudes machistas estão intimamente ligadas ao aumento de casos de violência sexual e doméstica, de gravidez indesejada e de disseminação de doenças sexualmente transmissíveis, como o HIV. Por outro lado, mostra que, por meio de intervenção social, é possível ajudar na mudança de comportamento dos jovens. Essa avaliação foi feita a partir de uma comparação com os resultados de uma entrevista realizada em 2001 e 2002, antes da participação dos jovens em atividades do programa, como oficinas e discussões sobre sexualidade, mulheres e violência. Esse teste preparatório também foi uma oportunidade de verificar a consistência das perguntas aplicadas na pesquisa.
O questionário foi construído com afirmações às quais os entrevistados deveriam responder "concordo" ou "não concordo" – por exemplo: "é a mulher quem deve tomar providências para não engravidar", "existem momentos nos quais a mulher merece apanhar" e "eu nunca teria um amigo gay". Os resultados indicam que jovens que têm preconceito em relação às mulheres tendem a usar menos preservativos, envolver-se em atos violentos e não ir a médicos.
O diretor do Instituto Promundo, que coordenou a pesquisa, diz que, durante o ato sexual, se a mulher mostra que tem camisinha, muito homens se recusam a usá-la e outros podem até ficar violentos. "Por pensarem que essa atitude pode sugerir a existência de outros parceiros, muitas mulheres sentem medo de propor o uso da camisinha, temendo a reação do homem", diz Gary. Ele acrescenta que existe um número crescente de homens que tem aceitado essa atitude das mulheres. O número de jovens que, segundo a pesquisa, concordam que seria uma ousadia a parceira pedir o uso da camisinha caiu de 22% para 13%.
Além da recusa em usar preservativo, a cultura machista afeta em muitas outras atitudes que comprometem a saúde sexual tanto dos homens quanto das mulheres com quem se relacionam: desde a falta de diálogo até a resistência à procura de serviços de saúde. O levantamento mostrou que 45% dos jovens que fizeram afirmações machistas apresentaram, nos três meses anteriores, sintoma de alguma DST.
De acordo com Gary Barker, houve mudanças significativas no comportamento dos jovens após participarem das atividades do programa (cujos efeitos a longo prazo serão avaliados em levantamentos futuros). "Percebemos a diminuição de atitudes machistas. Por exemplo, o uso de preservativo na última relação com parceira fixa aumentou de 58% para 84%. Antes, mais de 25% diziam ter tido sintomas de DST nos últimos três meses. Depois de um ano de atividades do programa, esse percentual caiu para 4%", diz.
A violência é outra conseqüência do machismo que ameaça a saúde e a vida dos jovens. A pesquisa mostra que quanto maior grau de machismo, maior é a probabilidade de conflito. Dos jovens entrevistados, 54% concordam que "se alguém me insulta, defendo minha honra até com a força, se necessário". "Questionando o modelo machista, estamos questionando também o modelo masculino de violência", acredita Gary.
Políticas para mudança
Os resultados da pesquisa, que indicam a mudança de atitude dos jovens participantes do programa, servem para estimular outras organizações a realizarem ações semelhantes, de acordo com Gary Barker. Para ele, também é essencial que as políticas públicas voltadas para a redução da desigualdade de gênero incluam ações que visem à redução do machismo. "O machismo está presente em todas as classes, nas políticas públicas, nas escolas etc. Dessa forma, não haverá muito avanço se as políticas de proteção dos direitos das mulheres não forem acompanhadas de mudança de cultura", acredita.
O convênio firmado no último mês de março entre o Instituto Promundo e Ministério da Saúde parece ser um passo importante nesse sentido. O convênio prevê para este ano a capacitação dos profissionais que atuam no Programa de Adolescentes e Jovens do Ministério da Saúde, presente em todas as regiões do país. A capacitação será feita pela equipe do Promundo, que repassará a metodologia do Programa H.
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