Você está aqui

Nova forma de participar do Legislativo

Autor original: Marcelo Medeiros

Seção original: Novidades do Terceiro Setor

Pouca gente sabe, mas propor uma lei para o Congresso não é exclusividade de deputados, senadores e governo federal. Uma das formas é uma pessoa redigir o que gostaria de ver se tornar uma lei, coletar mais de um milhão de assinaturas e enviar para o Poder Legislativo. Outra, mais fácil, caso a sociedade esteja organizada, é por intermédio da Comissão de Legislação Participativa (CLP) da Câmara dos Deputados.

Este órgão pouco conhecido recebe sugestões vindas de entidades da sociedade civil, as avalia e, caso as aprove, encaminha para votação. Desde abril, graças a uma alteração no regimento interno da Câmara, além de novas leis, é possível também propor emendas a projetos de lei que estejam tramitando em outras comissões. “É um grande avanço e mais um ótimo instrumento de participação popular no processo legislativo”, diz, por intermédio da assessoria da CLP, o deputado e presidente da comissão, André de Paula (PFL-PE). “A comissão é uma antiga demanda da sociedade civil e a possibilidade de emendar projetos de lei pode estimular a participação popular”, afirma José Antônio Moroni, diretor de Relações Institucionais da Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais (Abong) e membro do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc). Apesar do aumento de possibilidades, a CLP continua sendo pouco procurada, embora algumas boas iniciativas tenham saído dela.

Desde a modificação, apenas nove emendas a dois projetos de lei foram apresentadas – um é o que manda o governo federal pagar em uma parcela os atrasados de contribuições para o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) a pessoas com mais de 60 anos (recentemente transformado em Medida Provisória pelo governo) e o outro regulamenta medicamentos fitoterápicos. Nenhuma das emendas, porém, foi aprovada pela Comissão.

O não aproveitamento de sugestões é comum. De agosto de 2001 – quando a CLP foi criada – até hoje, 152 sugestões legislativas foram apresentadas. Dessas, 64 conseguiram ser aprovadas e 73 foram rejeitadas. As demais ainda estão sendo analisadas. Há ainda outras 49 propostas relativas ao orçamento da União, das quais 23 chegaram à plenária da Câmara. Este ano, nenhuma sugestão para a previsão de gastos do governo foi apresentada.

As razões apontadas para o maior número de rejeições são a falta de foco dos textos enviados, a repetição de temas e a má redação das propostas. “Elas apresentam, na maioria das vezes, vício de origem ou matéria não tratada por Lei. O que vai melhorar a qualidade das sugestões é o índice de politização e o senso de coletivismo da sociedade brasileira. É tudo uma questão de tempo”, afirma André de Paula. A maior parte das sugestões (28) está relacionada ao direito civil. Em segundo lugar aparece o direito constitucional e, em seguida, assuntos relativos à administração pública, com 14 propostas.

O deputado considera pequena a participação na Comissão e aponta a falta de divulgação de suas atividades na mídia como o principal motivo do fenômeno. “Ainda há um considerável contingente de associações e entidades da sociedade civil que desconhece a Comissão”, diz. Ele afirma que, na medida do possível, informações têm sido enviadas em cartilhas e boletins afirmativos a sindicatos, bibliotecas e ONGs.

Para Moroni, o problema vai além da falta de divulgação. “Há um descrédito no Legislativo, que está muito distante da população. Só se conhece as atividades quando há problemas no Congresso”.

Há entidades que, apesar da dificuldade alegada pelo presidente da Comissão, informam-se constantemente sobre o andamento do órgão e periodicamente lhe enviam sugestões. A Associação Comunitária de Chonin de Cima, do município mineiro de Governador Valadares, e o Conselho Municipal de Grupiara, também em Minas Gerais, haviam mandado, cada uma, até o fim de 2003, 25 propostas de projeto de lei para a comissão.

Vilson Soares, presidente em exercício da associação de Chonin de Cima, mostra que mesmo sem recursos é possível reivindicar. Por não terem computador na entidade, os documentos são escritos à mão. As informações são obtidas pela programação das TVs Câmara e Senado (transmitidas somente por assinatura), além da leitura de jornais.

Ele conta que tantos documentos foram produzidos a partir dos anseios da comunidade. “Reunimos as pessoas e discutimos nossas necessidades”, explica. “As pessoas não sabem cobrar seus direitos e são mal-informadas. Precisamos pressionar os órgãos públicos”, diz Soares. São da associação os projetos de lei em trâmite no Congresso que determinam o fim da cobrança de assinaturas telefônicas e o pagamento do FGTS a maiores de 60 anos em parcela única.

Podem apresentar sugestões legislativas (projetos de lei, de resolução, requerimento de convocação, informação, audiência pública, emendas ao orçamento e ao plano plurianual) qualquer associação, órgãos de classe, sindicatos e entidades da sociedade civil. Conselhos municipais e estaduais também podem sugerir, desde que tenham representantes da sociedade civil. Na página da CLP [ver link ao lado] há modelos para cada tipo de proposição. Preenchidos, basta completar o formulário com dados sobre a entidade proponente e enviá-lo para a comissão via Internet. Também é possível mandar por correio.

Também existem Comissões de Legislação Participativa ou órgãos similares no Senado, nas assembléias legislativas de Amazonas, Santa Catarina, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul, Paraíba e Minas Gerais e em 18 municípios –entre eles, três capitais: São Paulo, João Pessoa e Manaus.

A outra forma de proposição de leis pela sociedade é por meio de iniciativas individuais. A tarefa, contudo, é árdua. São necessárias assinaturas de 1% do eleitorado – aproximadamente 1,5 milhão de pessoas – em pelo menos cinco estados. Até hoje, somente três projetos de lei foram apresentados ao Congresso com base nesse dispositivo.

Marcelo Medeiros

Theme by Danetsoft and Danang Probo Sayekti inspired by Maksimer