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Os bilhões contidos no lixo

Autor original: Mariana Loiola

Seção original: Artigos de opinião

Olimpio Araujo Junior*






Os bilhões contidos no lixo


Muito se fala sobre os supostos “bilhões perdidos no lixo”. Com o tempo, a reciclagem e a coleta seletiva tornaram-se campanha política e modismo na mídia, apontadas sempre como as melhores soluções para os problemas ambientais urbanos, demonstrando o desconhecimento que a maioria das pessoas tem da realidade.

Em algumas prefeituras brasileiras, foi estabelecida uma política de coleta seletiva de lixo baseada no mito de que assim teriam grandes resultados positivos nos campos social e ambiental aliados ainda ao lucro financeiro (resultado da venda do material), independentemente do tamanho e da localização do município. Isso resultou em um aumento dos custos, principalmente de coleta e tratamento, que normalmente não é coberto pela venda dos materiais selecionados. Em outros municípios, começaram a surgir dezenas de cooperativas, sendo que a maioria acaba não conseguindo se manter no mercado, ou pelos baixos ganhos dos cooperados, ou pela dificuldade em comprar os caros equipamentos necessários, ou na maioria das vezes, pela inviabilidade de venda do material coletado, que se não for absorvido por alguma indústria local acaba dando prejuízo, pois o custo do frete acaba se tornando igual ou maior que o custo da carga.

O erro não está no incentivo à reciclagem, mas sim em pensar que o poder público pode se transformar em comerciante de recicláveis e matérias-primas secundárias, quando sua real função é resolver os problemas sanitários, de saúde pública e de cunho social decorrentes do acondicionamento, da coleta, do transporte e do destino final dos resíduos sólidos urbanos. Os resultados obtidos nos campos social, educacional e ambiental devem ser os reais objetivos do poder público. Além de ser totalmente inadequado induzir a população de municípios de pequeno e médio portes a esperar obter lucros com seus resíduos.

Realmente, o valor dos materiais recicláveis é inquestionável, porém a capacidade de absorção destes materiais pela indústria ainda faz com que este seja um mercado limitado competitivo e onde poucos realmente lucram. Sabemos que é possível, sim, gerar renda com materiais reciclados, porém, geralmente, quem realmente sai ganhando são os atravessadores e algumas poucas cooperativas. Os chamados “catadores” ou “carrinheiros”, além de serem obrigados a trabalhar, na maioria das vezes, em péssimas condições, sempre ganham muito pouco pelo que coletam, dinheiro que mal sustenta suas famílias.

Além disso podemos citar exemplos de prefeituras, como as de São Paulo e Angra dos Reis, que chegaram a ter custos da ordem de R$ 475,00 e R$ 900,00 respectivamente, por tonelada de lixo selecionado, o que inviabiliza a continuidade do processo. Outro bom exemplo é a Alemanha, onde através da criação do “Sistema Duales” os produtores tornaram-se responsáveis pela recuperação e reciclagem de todos os produtos manufaturados e os materiais de embalagens. O que não se esperava é que 95% das residências participassem do programa, gerando 400.000 toneladas de lixo reciclável anualmente, contra uma capacidade industrial de reciclagem de menos de 125.000 ton/ano. Esse excedente de material reciclável, além de amontoar-se em galpões e campos, resultou em dinheiro público desperdiçado, pois o custo seria muito menor se o mesmo tivesse como destino o aterro sanitário.

A indústria ainda não tem capacidade de absorver todo o resíduo que produzimos, além da necessidade de investimento em equipamentos que precisam de um longo prazo para retorno e um médio risco mercadológico. Isso tudo não significa que o processo de sensibilização e a educação ambiental deixe de ser importante. A separação do lixo precisa ser incorporada aos hábitos de todos, contudo precisamos insistir na diminuição da produção de embalagens, na reciclagem, no reaproveitamento e na reutilização, pela necessidade de melhoria de nossa qualidade de vida e pela consciência da conservação de nosso planeta para as futuras gerações, e não pela busca do ganho financeiro.

*Olimpio Araujo Junior é geógrafo-ambientalista e gestor nacional de conteúdo da Rede de Comunicação Ambiental EcoTerra Brasil






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