Autor original: Luísa Gockel
Seção original: Os mais interessantes e ativos projetos do Terceiro Setor
![]() | ![]() |
Dos 2,5 milhões de partos realizados anualmente pelo Sistema Único de Saúde no Brasil, cerca de 25% são de meninas entre 10 e 19 anos. O aumento exponencial da ocorrência de gravidez na adolescência, principalmente entre as camadas mais pobres da população – as famílias com renda de até um salário mínimo por mês concentram 65% das jovens grávidas –, levou a ONG Visão Mundial a implantar o Projeto Maternidade Saudável em regiões carentes do Rio de Janeiro. A equipe de técnicos da organização, junto às comunidades, leva informação sobre saúde e prevenção às futuras mães, além de prover apoio psicológico e capacitação profissional.
De acordo com a coordenadora do Maternidade Saudável, Sueli Catarina, a idéia do projeto nasceu a partir da realização de trabalhos nas comunidades do Rio de Janeiro e da constatação da existência de um grande número de meninas grávidas nestes locais. "Percebemos que existia um público que precisava de atenção especial e um trabalho específico", diz Sueli. O primeiro grupo que participou do programa foi formado em 2002 por 30 meninas grávidas entre 12 e 19 anos. Nessa primeira experiência, o trabalho se concentrou no pré-natal, no apoio psicológico e na realização de uma oficina em que as adolescentes confeccionavam o enxoval do bebê.
Ao mesmo tempo que esse trabalho era realizado, o Projeto Maternidade Saudável promoveu a capacitação de 600 agentes multiplicadores que atuam em toda a região Sudeste. Com o término do projeto piloto, a coordenadora conta que a equipe percebeu a necessidade de alguns ajustes no programa. "Observamos que era preciso dar uma maior ênfase na prevenção. Muitas meninas estavam grávidas do segundo filho e não tinham parceiros fixos", diz Sueli. A partir daí, a equipe elaborou com a ajuda da comunidade um material educativo que aborda temas importantes da adolescência.
"O segundo grupo de atendimento reuniu 25 meninas grávidas. Nos reuníamos três vezes por semana, e elas recebiam alimentação balanceada, aprendiam a fazer massagens com uma fisioterapeuta, e substituímos o trabalho de confecção de enxoval pela capacitação das meninas", explica.
O maior avanço nessa segunda experiência, segundo Sueli, foi o curso de manicure, uma reivindicação das próprias adolescentes, que permitiu que elas conseguissem gerar renda mesmo durante a gravidez. "E principalmente diminuíram sua dependência das famílias", conclui Sueli.
Um dos principais problemas constatado pelos técnicos do projeto é com a auto-estima das meninas. "A maternidade é vista por elas como uma forma de ingresso no mundo adulto. Entretanto, muitas famílias acabam reagindo mal à gravidez da adolescente e excluem a menina, que já está muito frágil e vulnerável", explica. O trabalho de apoio psicológico é realizado por profissionais voluntários e principalmente pela Igreja, uma das principais parceiras do projeto. Para implantar efetivamente uma iniciativa importante numa comunidade é preciso fazer parcerias com várias entidades diferentes e, segundo Sueli, a Igreja é a que tem o maior poder de mobilização.
O aumento da incidência de adolescentes grávidas nas últimas décadas impressiona. De acordo com dados do Ministério da Saúde, as meninas com menos de 15 anos engravidam três vezes mais hoje do que há 30 anos. Por esse motivo, Sueli defende a necessidade de dar continuidade ao projeto que, segundo ela, está na fase de captação de recursos para a formação de mais alguns grupos de trabalho. "Queremos ampliar a área de atuação para outras comunidades. Além disso, nessa próxima fase vamos dar uma maior ênfase à paternidade responsável, ou seja, à importância do papel do pai durante a gravidez e na formação de uma nova família", adianta a coordenadora. Sueli explica que o pai, na maioria dos casos, é um menino mais velho que não participa ativamente do processo de gestação.
Não há ainda dados sobre gravidez na adolescência nos locais onde o projeto atuou. O Maternidade Saudável, no entanto, tem excelentes avaliações. "A expectativa é de que os índices de ocorrência de gravidez em meninas de até 18 anos baixem a partir de 2002 nessas comunidades. Em relação à saúde das mães e dos bebês, não tivemos nenhum caso de complicação. Todos os bebês nasceram saudáveis e foram imunizados, e a taxa de amamentação é de mais de 90%", orgulha-se.
O saldo positivo do projeto foi sendo alcançado a partir de cada experiência, de acordo com a coordenadora. "Foi um exercício de aprendizagem", define. A questão, no entanto, envolve múltiplos aspectos e precisa de uma atenção maior do governo e das organizações da sociedade civil. "A grande incidência de adolescentes grávidas está ligada a uma série de fatores, mas é principalmente uma questão de auto-estima. A necessidade de serem aceitas através da maternidade pode provocar muitas conseqüências negativas para essas meninas, como a interrupção dos estudos". Além disso, a iniciação precoce da vida sexual acarreta outros problemas. "A prevenção de doenças sexualmente transmissíveis e especialmente da Aids é um dos aspectos mais sérios dessa questão", completa Sueli.
Theme by Danetsoft and Danang Probo Sayekti inspired by Maksimer