Autor original: Marcelo Medeiros
Seção original: Novidades do Terceiro Setor
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No dia 8 de março, a avenida Paulista, centro financeiro de São Paulo, será fechada para que milhares de mulheres marchem em nome da igualdade de direitos perante os homens, do fim da miséria, dos direitos delas em relação a seus corpos e do fim da violência. Essas serão as principais bandeiras da Carta Mundial das Mulheres para a Humanidade, lançada pela Marcha Mundial das Mulheres. O documento, que percorrerá o mundo em manifestações e eventos, terá sua etapa inicial no Brasil e depois seguirá para todos os continentes com o objetivo de chamar a atenção para os problemas enfrentados por elas em todo o mundo. No total, serão 51 países visitados.
O documento viajará acompanhado de uma colcha na qual a coordenação da marcha em cada país costurará um retalho expressando qual reivindicação considera mais importante e como ela pode ser posta em prática em sua localidade. “Constituímos mais da metade da humanidade. Damos a vida, trabalhamos, amamos, criamos, militamos, nos divertimos. Garantimos atualmente a maior parte das tarefas essenciais para a vida e a continuidade da humanidade. No entanto, nessa sociedade continuamos sendo oprimidas”, diz o texto.
De São Paulo, o tecido segue para a cidade de Porto Xavier, na fronteira entre Brasil, Argentina e Uruguai. As argentinas assumem o movimento a partir de então e já organizaram manifestações para os dias 13 e 14 de março. De lá, a colcha será entregue às bolivianas e depois às peruanas. O símbolo das reivindicações continua a viagem pela América do Sul, de onde ruma para o norte até chegar no Canadá, passando pelo Caribe, México e EUA. A “turnê” pela América termina na cidade canadense de Quebéc. Esta cidade é importante como símbolo, pois foi lá que surgiu a idéia de se fazer uma marcha de mulheres. Em junho de 1995, 850 mulheres caminharam 200 quilômetros até Montreal reivindicando medidas contra a pobreza. Depois de Canadá, será a vez, então, da Europa receber a colcha e a carta e, em seguida, Oceania, Ásia, Oriente Médio e África, onde termina a viagem.
A idéia é divulgar a carta em países nos quais os problemas enfrentados pelas mulheres sejam diferentes e em áreas de conflito, para pedir a paz e o diálogo entre os povos. A fronteira entre México e EUA, por exemplo, ganhará um evento especial por causa da dificuldade enfrentada por imigrantes mexicanos e mexicanas para atravessar para os Estados Unidos. O País Basco também terá evento separado do da Espanha para marcar a luta pela identidade cultural da região, que vê a violência de grupos separatistas voltar a crescer. “São fronteiras de interesse econômico e nós podemos superá-las”, declara Miriam Nobre, uma das coordenadoras da iniciativa e diretora da Sempre Viva Organização Feminista (SOF), entidade que faz a coordenação da Marcha Mundial das Mulheres no Brasil.
Um ponto polêmico será a passagem da Carta de Israel, onde termina a volta pelo Oriente Médio, para a África. O encontro de mulheres israelenses e sudanesas, onde terá início a viagem pela África, está marcado para o final de agosto. O Sudão está no processo de pacificação de uma guerra civil e teme-se que sua maioria muçulmana reaja à presença de israelenses em seu território. Por isso, a entrega da colcha nessa área é a única que ainda não possui data exata. A organização ainda busca formas de evitar manifestações contrárias à marcha ou atitudes violentas.
“Temos preocupação quanto à segurança das participantes, mas a idéia da marcha mundial é justamente superar as diferenças em nome do alcance de melhores condições de vida das mulheres de todo o mundo”, argumenta Nobre.
Reivindicações
Tão diversos quanto os locais são os pedidos feitos pelas participantes. Eles vão do fim da violência doméstica até a criação de impostos sobre transações financeiras internacionais, como a Taxa Tobin. A idéia geral da carta afirma que, mesmo desempenhando diversas tarefas e tendo grande importância econômica, as mulheres ainda são discriminadas em todo o mundo. Por isso suas reivindicações são agrupadas em quatro itens: igualdade, liberdade, solidariedade, justiça e paz.
Entre as afirmações de igualdade estão as de que todos têm direito às inovações tecnológicas e a salários iguais por desempenhos iguais em funções semelhantes. “As tarefas não remuneradas, ditas femininas, que garantem a vida e a continuidade da sociedade (trabalhos domésticos, educação, cuidado das crianças e dos familiares) são atividades econômicas que criam riqueza e que devem ser valorizadas e partilhadas”, diz o quinto item do tópico Igualdade.
Em relação à liberdade, há conclamações contra a exploração sexual e à ignorância do direito da própria mulher decidir quando terá filhos. “As mulheres tomam livremente as decisões no que se refere ao seu corpo, sua sexualidade e sua fecundidade”, afirma o texto. O direito à livre escolha, entretanto, esbarra num ponto polêmico das reivindicações, o direito ao aborto. A Igreja Católica se opõe a essa medida e organizações ligadas ao catolicismo compõem o movimento de mulheres. A questão, porém, não preocupa a organização da marcha. “Temos diálogo franco com a Igreja e nunca tivemos problema. De qualquer forma, precisamos tirar o véu desse assunto e discuti-lo”, afirma Nobre.
As atenções do item solidariedade se voltam para o uso sustentável de recursos naturais. “A economia de uma sociedade está a serviço daquelas e daqueles que a compõem. Ela é dirigida à produção e intercâmbio das riquezas socialmente úteis, que são distribuídas entre todas e todos, que garantem principalmente a satisfação das necessidades coletivas, eliminam a pobreza e asseguram um equilíbrio entre o interesse geral e os interesses individuais”, diz a carta.
Quanto à paz e à justiça, as reivindicações se concentram no acesso universal aos direitos da humanidade e no fim de todo tipo de violência, entre elas a econômica. Para acabar com a miséria, uma das maiores bandeiras da marcha, há pedidos de, além da adoção de taxas sobre transações financeiras, cancelamento de dívidas externas e de campanhas pelo desarmamento. Há também pedido de implementação de um Conselho Mundial para Segurança Econômica e Financeira. Sua função seria “redefinir as regras para um novo sistema financeiro internacional centrado na distribuição justa e igualitária das riquezas e baseado no aumento do bem-estar e na justiça social para a população mundial, particularmente para as mulheres que compõem mais da metade desta população”.
Ampliando o leque de reivindicações, a organização da marcha espera reunir todas as entidades representativas de mulheres no Brasil e fazer da manifestação na Avenida Paulista um exemplo para o mundo.
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