Autor original: Italo Nogueira
Seção original: Novidades do Terceiro Setor
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Para fiscalizar as contas públicas dos municípios, os cidadãos não necessitam de acesso a documentos sigilosos ou outras ações complexas. O artigo 31, parágrafo três, da Constituição Brasileira obriga o poder público a disponibilizar o balanço financeiro do ano anterior por 60 dias e garante a qualquer pessoa o direito de acesso a essas contas. E é justamente isso o que pretende reforçar a campanha "Quem não deve não teme", lançada no dia 21 de março, na Bahia. A idéia é estimular a sociedade civil e os promotores públicos a lutarem pela garantia desse direito. A iniciativa é organizada pela Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais (AATR), pela Cáritas Brasileira, pelo Centro de Assessoria do Assuruá (CAA), pelo Espaço de Participação Social (Espasso), pela Federação de Órgãos para a Assistência Social e Educacional na Bahia (Fase-BA) e pelo Movimento de Organização Comunitária (MOC).
A abertura do balanço do ano anterior é pouco praticada – tanto por causa do autoritarismo de alguns prefeitos como por falta de pressão da sociedade civil. Esta é a avaliação de Juliana Barros, advogada da AATR e integrante da comissão organizadora da campanha. "Existe toda uma cultura histórica de falta de participação. Isso permite que alguns políticos tornem a coisa pública um assunto privado", analisa. De acordo com a advogada, as instituições envolvidas sempre atuaram nesta linha, mas de modo esparso. O que se pretende agora é articular uma atuação integrada e produzir uma intervenção concreta na garantia dos direitos dos cidadãos. "É um movimento que chega fora do tempo, tendo em vista a que ponto chegou a situação da população hoje".
A campanha tem um teor educativo. Uma das suas ações é a distribuição de kits para que os cidadãos conheçam os seus direitos e pressionem o Ministério Público (MP). Faz parte do guia um passo-a-passo sobre como fiscalizar e o que fazer ao enfrentar dificuldades, bem como uma petição padrão para ser utilizada pelos MPs. Além disso, foi distribuída aos promotores públicos da Bahia a "Petição da Cidadania Ativa", estimulando a participação destes na garantia de livre acesso aos documentos públicos referentes a receitas e despesas. "Os cidadãos precisam provocar os MPs para que os direitos sejam garantidos", afirma Juliana Barros.
Um dos grandes empecilhos à participação plena dos promotores públicos e dos cidadãos é a ameaça e o poder que muitos políticos representam em regiões afastadas. "Muitos promotores se veêm isolados na ação fiscalizadora, o que pode tornar seu trabalho arriscado". Para Juliana Barros, a campanha institucionaliza a garantia destes direitos e se estabelece como um centro de referência para os MPs, que podem encontrar ali apoio para exercer seu trabalho.
O método é o mesmo empregado no Piauí pela Força Tarefa Popular – criada pela sociedade civil para combater a corrupção. De acordo com Juliana Barros, desde 1999 o movimento piauiense aumentou o nível de abertura das prefeituras do estado. José Arimatéia, advogado que participou da Força Tarefa Popular, esteve presente ao lançamento da campanha baiana, ao lado do ministro do Controle e da Transparência, Waldir Pires, que deu total apoio à iniciativa. Foi prestada homenagem ao professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA) Elenaldo Teixeira, que produziu vasto material sobre exercício da cidadania através do controle social das políticas públicas.
Outra campanha que estimula a fiscalização das contas públicas é a cartilha "Olho Vivo no Dinheiro Público", lançada no ano passado pela Controladoria Geral da União (CGU). Existe ainda o Portal da Transparência, que divulga os repasses de verbas da União para os municípios. Para Barros, campanhas deste tipo indicam que a participação da sociedade civil é essencial para a consolidação da democracia. "Estas iniciativas apontam para a mudança de uma democracia representativa para uma participativa. É o povo pondo a mão no que é dele, fiscalizando o uso de seu dinheiro".
As receitas e despesas do poder público também podem ser acessadas mensalmente. Isso, no entanto, exige organização e motivação. No entendimento de Juliana Barros, esta seria a melhor forma de verificar as ações dos políticos. "A fiscalização mês a mês permite uma análise mais criteriosa, já que tem um acompanhamento dos processos. Esta é uma meta, mas ainda não pode ser alcançada".
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