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Hip-hop, cidadania e cultura

Autor original: Joana Moscatelli

Seção original: Os mais interessantes e ativos projetos do Terceiro Setor





 Foto tirada em São Luiz do Maranhão no dia 07 de janeiro, durante o evento Trocando Idéia no Complexo Cultural GDam
Dudu de Morro Agudo

Com o objetivo de promover o encontro e o intercâmbio entre os adeptos do movimento hip-hop, o Projeto Trocando Idéia surgiu em 1999 oferecendo oficinas gratuitas de break e graffiti na Casa de Cultura Mário Quintana, em Porto Alegre (RS). Promovida por um grupo de amigos que se conheceram através do hip-hop, a iniciativa começou como um espaço para troca de experiências e informações relacionadas à cultura hip-hop.

Hoje o evento busca, também, apresentar novas produções de arte e redes de solidariedade, aproximando os ativistas do movimento no Brasil e na América Latina. Através da cultura hip-hop, o projeto pretende ajudar na articulação dos jovens com os movimentos sociais, promovendo sua cidadania e a inclusão social.

Devido ao potencial mobilizador do hip-hop, o projeto agrega várias iniciativas importantes que buscam a transformação social e tratam de temas diversos como a luta antimanicomial, educação sexual de jovens, situação de adolescentes em conflito com a lei, literatura marginal, dentre outros. Além de possibilitar o conhecimento das diversas formas de organização da cultura hip-hop, a iniciativa busca fortalecer redes e movimentos sociais e culturais, tendo a educação e a informação como instrumentos de promoção de mudanças sociais. São realizadas atividades gratuitas como shows; oficinas de produção musical, dança e rádio livre e comunitária; encontro de mulheres, de ativistas e dos profissionais de mídia ligados ao hip-hop; campeonatos de dança; palestras e debates.

O Trocando Idéia conta com a participação de produtores, oficineiros, DJs, cantores, dançarinos, ativistas e pesquisadores sociais da cultura hip hop de diversos estados do Brasil e até de outros países como Uruguai, Argentina e Chile. Em 2003, a cidade de Recife (PE) foi sede da primeira edição nacional do evento que conta com o patrocínio da Petrobrás e do Ministério da Cultura. Ainda naquele ano, o projeto deu origem ao Instituto Trocando Idéia Tecnologia Social, com o objetivo de gerar uma maior profissionalização do trabalho que, além de fomentar a cultura nacional e regional do hip-hop, promove a capacitação profissional e formação para geração de renda dos jovens.

Fabiana Menini, diretora do Instituto e uma das fundadoras do projeto, caracteriza o projeto como uma rede de amizades que busca trazer novas maneiras de produzir solidariedade, resistência e lutar por melhores condições sociais. Para ela, o hip-hop se diferencia de outros movimentos culturais por ter como protagonistas jovens da periferia que expressam através da arte aquilo que vivem no dia-a-dia. “Muitas pessoas reclamam que o hip-hop fala de muita violência mas não percebem que ele apenas retrata o que é a periferia”, diz Fabiana, que lembra também que “é através do hip-hop que percebemos que estão acontecendo na periferia muitos projetos e iniciativas que buscam mudanças culturais e sociais e que provam que o que caracteriza a periferia não é só a violência.”

Ela explica ainda a importância do trabalho de divulgação do movimento hip-hop em escolas no intuito de levar essa cultura de resistência para pessoas que não estejam ligadas ao movimento. Através de seu potencial mobilizador, o movimento hip-hop oferece visibilidade a várias ações. Aproveitado esse potencial o Trocando Idéia, em parceria com a ONG Cemina Comunicação, Educação e Informação em Gênero e a Rede de Desenvolvimento Humano (Redeh), apóia a Campanha Nacional de Direitos Sexuais e Reprodutivos, levando informação e conscientização para que os jovens iniciem sua vida sexual de forma saudável e segura.

Menini afirma que uma das maiores dificuldades do projeto é conseguir separar aquilo que é veiculado na mídia como hip-hop e o movimento hip hop em si. “Por ser boa e envolvente, o mercado consome a música do hip-hop mas esquece que o hip-hop não é uma música, e sim um movimento político e social de resistência, composto por elementos distintos como a dança (break), a pintura (graffiti) e a música (rap)”, adverte ela.

Os encontros do Trocando Idéia abordam temas diferenciados, promovendo diversas formas de saberes e integração de diferentes atores sociais. Durante o encontro de 2004, em Porto Alegre (RS), foram realizadas palestras e debates que abordaram temas como as raízes negras do hip-hop, relação com a mídia, rumos e ativismo do movimento. Foram discutidas, também, questões como saúde, meio ambiente, protagonismo juvenil, gênero, políticas públicas para juventude e arte. E, em parceria com a Cemina, foi realizada a oficina “Hip-hop na luta contra o tabaco”.

Em 2005, nos mês de janeiro, foi realizada a segunda edição nacional do evento em São Luís (MA) com oficinas de fanzine e rádio, campeonatos de dança de rua (b.boying), batalha entre DJs, ação de pintura-mural (graffiti) e o encontro nordestino do MHHOB. O "Encontro de Mulheres", atividade permanente desde o surgimento do projeto, discutiu temas como DST/aids, gravidez na adolescência, discriminação e formas de organização.

Ainda em 2005, uma Edição Especial para o Fórum Social Mundial foi organizada com a realização de grupos de discussão, debates, apresentação de vídeos e oficinas como a de direitos sexuais e reprodutivos. Um dos assuntos tratados foi a loucura e as formas de cuidado e atenção em saúde mental, como buscar avanços no âmbito de políticas de saúde mental e denunciar arbitrariedades em relação à violação dos direitos humanos e de cidadania das pessoas com deficiência mental. Além dessas atividades, foi construído um mural de cem metros por mais de dez grafiteiros e grafiteiras.

“O movimento hip-hop é uma forma de mostrar para a sociedade o que está passando dentro da periferia, de possibilitar ao jovem ser protagonista de ações sociais que lutem por transformações”, explica Fabiana Menini. Através de ações culturais como essa é que podem ser construídas pequenas revoluções sociais dentro e fora da periferia.

Joana Moscatelli

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