Autor original: Viviane Gomes
Seção original: Novidades do Terceiro Setor
A organização não-governamental pernambucana SOS Corpo lançou, no final de março, o Observatório de Violência contra a Mulher. Apoiado pela Secretaria Especial de Políticas Públicas para as Mulheres do estado, o projeto é voltado para a produção de informações sobre a violência contra a mulher e para a criação de espaços de interlocução entre os movimentos de mulheres e os agentes públicos. A finalidade é construir políticas públicas que possam combater as diversas manifestações desse problema. A idéia do projeto é dar início a um processo de produção de informações sobre a violência a partir dos casos de homicídio – tipo marcante de agressão contra mulheres em Pernambuco.
Verônica Ferreira é uma das coordenadoras do projeto. Ela explica que a função do Observatório é abordar o tema de forma mais ampla, de modo a "contribuir para o conhecimento do fenômeno em nosso estado e suprir a carência de informações rigorosas e de fácil acesso aos movimentos de mulheres e demais movimentos sociais”. As informações serão produzidas em oficinas com o movimento de mulheres, debates com a imprensa local e nos Fóruns de Diálogo entre movimentos sociais e representantes do governo estadual.
Inicialmente, os dados sobre a violência contra a mulher serão provenientes apenas do estado de Pernambuco, assim como as atividades políticas que envolvem os movimentos sociais e de mulheres e as autoridades. No entanto Verônica afirma que o SOS Corpo deseja dar uma amplitude nacional ao projeto. “Podemos divulgar as informações para todo o Brasil através das redes e dos movimentos em que estamos inseridas e também com a realização - ao final do projeto - de um Seminário Nacional sobre Violência contra a Mulher para discutir os resultados”. A previsão é que este seminário seja realizado no final de 2005.
Para a coordenadora, a maior novidade do projeto é o conjunto de iniciativas formado pela produção de informações sobre o tema, pela criação de espaços de interlocução e pelas propostas e compromissos dele resultantes. Além da publicação trimestral do boletim, a organização também aposta na manutenção de um ciclo periódico de debates, a cada três meses, para a formulação de propostas políticas. Verônica chama essas atividades de "Jornadas para discutir a violência contra a mulher".
Violência contra a mulher em Pernambuco
O projeto da SOS Corpo em Pernambuco se justifica pelo fato de que o estado lidera os rankings de violência, em geral, e de violência contra a mulher. Além disso, registra o maior índice de crescimento de homicídios do Brasil, à frente de estados como Rio de Janeiro e São Paulo.
“Em relação às mulheres, os homicídios têm crescido nos últimos anos e têm recrudescido em crueldade, o que é um fator que nos chama atenção. Pernambuco é um estado onde as relações de gênero estão marcadamente assentadas em bases patriarcais, o que certamente constrói as bases para que a violência ocorra e, principalmente, naturalize-se. Segundo estudo realizado pela OMS, em 2000-2001, 34% das mulheres pernambucanas da Zona da Mata, uma região onde predominou a cultura da cana, já haviam sofrido algum episódio de violência em suas vidas”, informa Verônica.
A coordenadora esclarece ainda que as informações e a experiência do movimento de mulheres demonstram a gravidade da situação pernambucana. Antes, porém, é preciso entender e explorar mais essas particularidades com relação ao fenômeno universal da violência contra a mulher. Para ela, este é um dos objetivos centrais do observatório.
Neste sentido, os estudos elaborados pela SOS Corpo para o observatório terão recortes. Verônica explica que a entidade já produz informações com as estratificações, mas que a tarefa é difícil, especialmente quando se aborda as questões de raça e etnia – que segundo ela são pouco consideradas nos registros oficiais. “Se a violência doméstica atinge mulheres de todas as classes sociais, quando se trata de homicídios são as mulheres pobres e negras de baixa escolaridade as que compõem majoritariamente as estatísticas em nosso estado”, alerta.
Relações da violência contra a mulher
A violência contra a mulher se expressa em diversas facetas. Atinge, por exemplo, meninas e adolescentes que se encontram em uma situação de vulnerabilidade ainda maior em comparação com mulheres adultas. “Precisamos entender, antes de tudo, a especificidade dessas situações para exigirmos políticas públicas que atendam essas especificidades”, afirma Verônica. Ela explica que as violências social e urbana também se relacionam com o crescimento dos homicídios de mulheres, embora não o explique completamente. “Precisamos conhecer as características do fenômeno da violência (como acontecem, quem são essas mulheres etc.) para construir caminhos necessários para garantir os direitos das mulheres e a prestação de serviços de apoio”.
A SOS Corpo entende que para romper com o processo da violência contra a mulher é “preciso uma ampla, profunda e urgente atuação do Estado na garantia dos direitos, o que implica, portanto, garantir a ampliação e o acesso a políticas voltadas para a segurança, para o trabalho, para os serviços de saúde, a assistência social etc. – itens que possam mexer nas estruturas que favorecem a reprodução das desigualdades de gênero, das desigualdades sociais e das desigualdades baseadas em raça e etnia”.
Quanto aos movimentos sociais, Verônica diz que as organizações estão fazendo a sua parte. “O movimento de mulheres tem a tarefa de compreender este fenômeno para mais fortemente construir suas propostas políticas e incidir politicamente para que a garantia dos direitos das mulheres e a transformação destas estruturas seja possível e plena”, finaliza.
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