Autor original: Joana Moscatelli
Seção original: Os mais interessantes e ativos projetos do Terceiro Setor
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Com o objetivo de combater a exploração sexual comercial de mulheres e meninas, foi criado em 1991 um espaço de produção e divulgação de informações sobre esse tema: a organização não-governamental Serviço à Mulher Marginalizada (SMM). A entidade, cuja sede é em São Paulo, pretende sensibilizar e conscientizar a sociedade brasileira sobre essa questão, dando a ela mais visibilidade.
Segundo a pesquisadora e articuladora política da SMM, Eloísa Gabriel dos Santos, “a exploração sexual de mulheres, crianças e adolescentes tem raízes na estrutura política, econômica, cultural e social” de nossas sociedades. Para ela, “a desigualdade de gênero, o machismo, a impunidade e a pobreza política e social da maioria da população brasileira são os fatores principais que colocam milhares de mulheres, crianças e adolescentes na condição de grupos vulneráveis à exploração sexual”.
“A pobreza e a falta de perspectiva têm papel determinante na inserção de mulheres e adolescentes no espaço de exploração sexual. Muitas mulheres se iludem com uma boa oportunidade de trabalho, serviço bem remunerado, muitas vezes com chance de morar em um país desenvolvido e aprender uma língua estrangeira ou novas habilidades. Uma proposta que fascina muita gente e que, não raro, se transforma em trabalhos forçados, imigração ilegal, semi-escravidão, e exploração sexual”, alerta a pesquisadora.
A intenção da SMM não é assumir o papel do Estado, mas ser mais uma parceira na luta contra a exploração sexual. Através de seminários e reuniões com diversas instâncias governamentais, a SMM busca contribuir com propostas de combate ao tráfico de seres humanos. Por exemplo, desde o início da Campanha de Enfrentamento ao Tráfico de Seres Humanos, promovida pelo Ministério da Justiça, a entidade tem participado ativamente de suas discussões e, em alguns casos, liderado ações concretas.
No entanto a organização ainda tem como principal dificuldade construir em conjunto com o governo federal uma política específica de combate ao tráfico de seres humanos em nível nacional e internacional e que trabalhe não só a questão jurídica e policial, mas também o aspecto social e humano.
Outro fator preocupante é o aumento do número de rotas do tráfico de seres humanos a cada ano. Segundo dados da SMM, o tráfico ilegal de seres humanos é a terceira atividade mais lucrativa do mundo (movimenta cerca de US$ 12 bilhões por ano), ficando atrás apenas do contrabando de armas e de drogas.
Segundo Pesquisa sobre Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para Fins de Exploração Sexual Comercial (Pestraf) realizada em 2002 (coordenada pela professora Maria Lúcia Leal, da Universidade de Brasília), a rota do tráfico segue a do dinheiro. Parte de regiões pobres para regiões ricas, tanto dentro como fora dos países. No Brasil não é diferente, mas cada lugar também tem suas particularidades. Maranhão, Paraíba e Rio Grande do Sul são os estados brasileiros onde a incidência da exploração sexual da mulher é maior. No caso de Maranhão e Paraíba, o turismo sexual é o que fortalece ainda mais esse crime. O Rio Grande do Sul, por sua vez, tem nas agências de modelos, de casamentos e de ofertas de trabalhos suas principais recrutadoras de jovens para exploração sexual.
Um dos fatores que contribuem para o aumento do tráfico de seres humanos é a impunidade. Eloísa afirma que, no Brasil, ainda são poucos os casos em que as investigações chegam ao final, já que a legislação encontra-se defasada. “Mesmo com a alteração no Código Penal aprovada em março de 2005, precisamos ousar mais para que se criem leis e programas que dêem conta de combater e punir o tráfico de seres humanos”, observa a pesquisadora.
Nesse diálogo com o governo, a SMM propõe uma série de medidas para enfrentar a questão da exploração sexual comercial no Brasil. Entre elas estão a criação de comitês formados por sociedade civil e governo para fortalecer a mobilização da sociedade; a revisão da legislação sobre o tema; o fortalecimento do diálogo oficial e civil entre países da América Latina e do Caribe; o incentivo à participação de universidades, escolas, empresários e mídia nessa luta; a formulação de uma convenção interamericana que permita a cooperação entre os países apontados como rotas de tráfico; a promoção e participação em debates (nacionais e internacionais) sobre a migração, a flexibilização das leis migratórias e os direitos do imigrante.
Além da articulação com órgãos públicos, a SMM procura estabelecer parcerias com outras organizações civis e criar redes nacionais e internacionais de combate ao tráfico de seres humanos. Segundo Eloísa, essas redes formadas por organizações da sociedade civil cumprem um papel de denúncia e contribuem com propostas, mas não têm a função do Estado. Ela afirma que uma rede nacional e internacional de apoio às vítimas e combate à exploração sexual comercial só cumprirá seu dever quando as embaixadas criarem atendimentos com serviços 0800 [de atendimento telefônico gratuito para denúncias] e oferecerem profissionais preparados para lidar com pessoas em estado de vulnerabilidade. Além disso, considera fundamental a criação de um maior número de escritórios estaduais da Campanha de Enfrentamento ao Tráfico de Seres Humanos do Ministério da Justiça – para apuração de denúncias e proteção às vítimas, oferecendo um atendimento psicossocial adequado.
Em contato com entidades civis parceiras, a SMM estabelece diálogos com países como Holanda, Noruega, Bélgica e Alemanha, realizando debates em escolas, sindicatos, igrejas e comunidades locais. O objetivo é discutir o tráfico de brasileiros para países mais ricos.
No Brasil, a SMM realizou nos estados de São Paulo e Rio Grande do Sul parcerias com escolas da rede pública, promovendo reflexão e elaboração de trabalhos sobre a questão da exploração sexual comercial. “Percebemos ser este um trabalho válido", diz Eloísa. "Por isso persistimos em articulações com escolas e universidades, que muitas vezes se dão pela porta da sala de aula de um professor que esteja sensibilizado com o tema”.
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