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Derrubando a porta: como as próximas negociações da OMC ameaçam agricultores em países em desenvolvimento

Autor original: Maria Eduarda Mattar

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Derrubando a porta: como as próximas negociações da OMC ameaçam agricultores em países em desenvolvimento


Milhões de agricultores que vivem em situação de pobreza nos países em desenvolvimento não conseguem ter uma renda adequada em decorrência de importações baratas de alimentos, muitas vezes em regime de dumping. O alimento mais importante do mundo, o arroz, revela a seriedade do problema. Há muito tempo, os países ricos vêm usando o FMI, o Banco Mundial e acordos comerciais bilaterais agressivos para abrir as portas dos mercados de países que estão enfrentando situações de pobreza para inundá-los com arroz barato, inclusive arroz intensamente subsidiado dos Estados Unidos. Agora, os países ricos planejam usar as regras obrigatórias da OMC para derrubar essa porta completamente. No entanto, as regras comerciais deveriam promover o desenvolvimento ao invés de miná-lo. Qualquer acordo novo na OMC deve permitir que países em desenvolvimento regulem o comércio no sentido de promover sua segurança alimentar e meios de vida rurais.

O que está em jogo em Hong Kong?

Na reunião ministerial da OMC a se realizar em Hong Kong em dezembro deste ano, as negociações entre 148 governos do mundo estabelecerão regras para o comércio agrícola global que vigorarão por décadas, definindo as perspectivas de milhões de agricultores de países em desenvolvimento cujos meios de vida dependem da agricultura.

O desenvolvimento rural é urgentemente necessário. Mais de 80 por cento das pessoas do mundo que enfrentam situação de pobreza vivem em áreas rurais e a promoção do crescimento agrícola é um elemento essencial de qualquer estratégia para tirá-las dessa condição. A OMC deve desempenhar um papel central na implementação dessa estratégia.

O que é necessário está claro:

• muito mais investimentos na infra-estrutura e nos mercados rurais visando promover o crescimento agrícola

• os países pobres devem ter a capacidade de regular o comércio no sentido de promover a segurança alimentar e os meios de vida rurais

• a exportação em regime de dumping a preços abaixo dos custos de produção por parte de países ricos deve ser interrompida

• os produtos dos países em desenvolvimento devem ter mais acesso aos mercados dos países ricos.

No entanto, os países ricos têm driblado essa agenda de desenvolvimento para promover uma agenda própria: mantendo pesados subsídios e elevadas tarifas para seus produtores e forçando países em desenvolvimento a abrir seus mercados para os excedentes de sua produção, sem levar em consideração os custos dessa situação para o desenvolvimento.

Por meio do FMI, do Banco Mundial e de acordos de livre comércio, os países ricos têm pressionado os países em desenvolvimento a reduzirem as tarifas que aplicam à importação de produtos agrícolas. Conseqüentemente, entre 1990 e 2000, os países em desenvolvimento reduziram as tarifas médias que aplicam a importações agrícolas de 30 para 18 por cento.1 Agora, os países ricos querem consolidar a abertura desses mercados com regras obrigatórias da OMC, enquanto continuam a exportar os excedentes de sua produção em regime de dumping para eles.

A Oxfam vem trabalhando há muitos anos com comunidades em toda a Ásia, África e América Latina que produzem uma grande variedade de alimentos, como milho, açúcar, leite e aves. O impacto da liberalização do comércio desses produtos sobre essas comunidades é potencialmente devastador — e inaceitável à luz da persistente hipocrisia dos países ricos.

A conferência ministerial da OMC em Cancum fracassou porque os países em desenvolvimento rejeitaram as propostas da União Européia e dos Estados Unidos, que permitiriam aos produtores do Norte ter mais subsídios e um acesso mais desimpedido a mercados sem nada em troca para o Sul. É importante evitar que esse fracasso se repita em Hong Kong. Para que isso não aconteça, os países ricos devem respeitar a necessidade dos países em desenvolvimento de regular o comércio no sentido de apoiar seus agricultores familiares.

Se a reunião de Hong Kong fracassar, a OMC corre o risco de se tornar irrelevante no contexto do comércio global, já que a Rodada de Desenvolvimento de Doha provavelmente se desmantelaria. Os países em desenvolvimento seriam forçados a lidar com as demandas dos países ricos por meio de acordos comerciais bilaterais e regionais. A chance de se reduzir exportações em regime de dumping também se desvaneceria.

Os países desenvolvidos também têm muito a perder. Se a reunião de Hong Kong fracassar, eles perderão uma importante oportunidade de negociar o acesso ao mercado, regras comuns e disciplinas com economias emergentes, como as da China, da Índia e do Brasil, que até agora têm se recusado a negociar acordos bilaterais ou regionais.

Este é um extrato do documento informativo produzido pela Oxfam Internacional intitulado "Derrubando a porta: como as próximas negociações da OMC ameaçam agricultores em países em desenvolvimento". A íntegra do texto está disponível na área de Downloads, ao lado.






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