Autor original: Mariana Loiola
Seção original: Notícias exclusivas para a Rets
![]() www.paradasp.org.br | ![]() |
No dia 28 de junho de 1969, gays e travestis que freqüentavam o bar novaiorquino Stonewall Inn resistiram, com pedras e garrafas, a uma das freqüentes batidas policiais feitas sob a alegação de falta de licença para venda de bebidas alcoólicas. Durante essas batidas, além de fechar o estabelecimento, os policiais levavam presas todas as pessoas que estivessem travestidas. A rebelião de Stonewall, que se prolongou nas quatro noites posteriores, foi um marco na luta contra as humilhações e perseguições aos homossexuais. No primeiro aniversário da rebelião, 10 mil homossexuais marcharam nas ruas de Nova Iorque, demonstrando que estavam dispostos a seguir lutando por seus direitos. Desde então, 28 de junho é considerado o Dia Internacional do Orgulho Gay/Lésbico.
A manifestação dos homossexuais em Nova Iorque, segundo Oswaldo Braga, presidente do Movimento Gay de Minas (MGM), deu origem às paradas GLBT (gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros) em todo mundo. No Brasil, atualmente, mais de 50 paradas reúnem milhões de pessoas em torno da mesma causa: respeito aos direitos dos homossexuais. Além do aumento na quantidade de pessoas que participam - sejam homossexuais ou simpatizantes -, percebe-se que esses eventos vêm ganhando peso cada vez maior: hoje, são uma das principais expressões do universo GLBT para ratificação de espaços conquistados e demanda pelo reconhecimento de mais e novos direitos.
A primeira parada GLBT do Brasil foi realizada no Rio de Janeiro em 1995 pelo grupo Arco-Íris. “No primeiro ano, levamos 3 mil pessoas às ruas. Até então não tínhamos nenhuma experiência com movimento massivo”, conta Cláudio Nascimento, presidente do Grupo Arco-Íris. A parada carioca, que no ano passado reuniu 600 mil pessoas, é atualmente a segunda maior da América Latina.
Bandeiras do arco-íris (símbolo mundial do movimento GLBT), trios elétricos, shows, DJs, muita música, efeitos de fumaça, serpentinas e mensagens de apoio à promoção dos direitos humanos da população GLBT compõem o cenário das paradas. Para reforçar a politização dessas festas são realizadas atividades paralelas como filmes, debates, palestras, seminários, exposições, festas, sessões solenes em Câmaras e Assembléias e divulgação na mídia. As paradas GLBT no Brasil contam hoje com o reconhecimento e o apoio de diversos setores da sociedade, classe artística, instituições culturais, ONGs, movimentos sociais, governos municipais e federal.
Entre os objetivos das paradas, de acordo Luiz Mott, fundador do Grupo Gay da Bahia (GGB), estão “mostrar à sociedade global a existência da diversidade sexual da comunidade homossexual e estimular o respeito à livre orientação sexual e estilo de vida; denunciar à população em geral e à mídia as diferentes manifestações de homofobia que pesam sobre a comunidade homossexual e transmitir informações e reforçar junto aos participantes a necessidade da prevenção da aids e outras DSTs”.
Desde 2000, o Ministério da Saúde, por meio do Programa Nacional de DST/Aids, financia as paradas GLBT. O Ministério da Saúde reconhece que esses eventos têm potencial para “fortalecer a cidadania dos homossexuais e promover ações de prevenção das doenças sexualmente transmissíveis, incluindo a aids”. Este ano, o Ministério da Saúde repassou R$ 500 mil a entidades organizadoras de manifestações. A verba é destinada a atividades educativas e de prevenção às DST e aids durante os eventos, como a distribuição de material informativo e camisinhas.
A possibilidade de participação social e a visibilidade do movimento GLBT geradas pelas paradas criam um cenário propício para o exercício da cidadania, de acordo com Eduardo Barbosa, assessor técnico da Unidade de Articulação com a Sociedade Civil e de Direitos Humanos do Programa Nacional de DST/Aids do Ministério da Saúde. “É uma oportunidade para que essa população tenha visibilidade e direito de expressão. Quando a pessoa se assume como ela é, tende a se cuidar mais e se proteger de doenças como a aids”, diz.
Este ano, as paradas GLBT também ganharam o apoio do Ministério da Cultura (MinC). Por intermédio da Secretaria da Identidade e da Diversidade Cultural, o MinC destinou R$ 600 mil para a realização de paradas no país, reconhecidas como eventos de “visibilidade massiva de conscientização cidadã, manifestação cultural e afirmação do direito à expressão de orientação sexual e da cultura de paz”.
O apoio do MinC, segundo Cláudio Nascimento, é um dos resultados do programa Brasil sem Homofobia, lançado em maio de 2004 pelo Governo Federal. Nos próximos dias 23, 24 e 25 de maio, será realizado um seminário de avaliação do programa, que inclui ações como a capacitação de policiais e profissionais de educação e a criação de um banco de dados de crimes contra a homofobia.
Próxima parada
A agenda das paradas GLBT de 2005 no Brasil começa no dia 29 de maio, com a 9ª Parada do Orgulho GLBT de São Paulo, e se concentra em junho - o mês do orgulho gay para muitas organizações. Também se estende ao longo dos meses de julho, agosto e setembro. Os eventos já estão no calendário oficial de diversos municípios.
No ano passado, 1,8 milhão de pessoas participaram da Parada do Orgulho GLBT de São Paulo, que já é considerada a maior do mundo. Este ano, o evento, que acontece na Avenida Paulista, terá como tema "Parceria civil, já. Direitos iguais! Nem mais nem menos".
A parada paulista, organizada pela Associação da Parada do Orgulho GLBT de São Paulo, contará com a participação de ONGs de outros estados, como o Movimento Gay de Minas (MGM), de Juiz de Fora, que receberá o prêmio Cidadania e Respeito à Diversidade na categoria ONG GLBT, conferido à entidade em 2004. O prêmio é promovido anualmente pela Associação da Parada do Orgulho GLBT de São Paulo, para prestigiar pessoas e organizações que desenvolvem as iniciativas mais significativas de divulgação do orgulho GLBT e combate à discriminação. O Grupo Identidade, de Campinas, foi a ONG selecionada pelo prêmio em 2005. Durante as paradas de São Paulo, o MGM aproveitará ainda para divulgar a 3ª Parada da Cidadania e do Orgulho GLBT de Juiz de Fora, que acontecerá no dia 20 de agosto.
O MGM também marcará presença na 10ª Parada do Orgulho GLBT-Rio 2005, no dia 26 de junho, que terá como tema "Direito de amar a quem quiser. União Civil já!", defendendo a aprovação do Projeto de Lei 1.151, de 1995, que institui a União Civil para pessoas do mesmo sexo. Em 2005, completam-se dez anos que esse projeto de lei, de autoria da ex-deputada federal Marta Suplicy, tramita na Câmara dos Deputados.
Para fomentar a realização de mais Paradas do Orgulho GLBT em todo o estado do Rio de Janeiro, o Grupo Arco-Íris criou em parceria com outras ONGs o Consórcio do Orgulho GLBT Rio. Trata-se de uma ação coordenada de capacitação e troca de experiências para aperfeiçoar as paradas realizadas em outras cidades do estado.
Na capital baiana, o Grupo Gay da Bahia (GGB) vai realizar, no dia 4 de setembro, a 4ª Parada do Orgulho Gay de Salvador. “No evento vamos comemorar os 25 anos do GGB na frente da luta contra a homofobia”, adianta Luiz Mott, fundador do GGB. Ele lembra que a ONG foi o primeiro grupo a comemorar o Dia do Orgulho Gay no Brasil, em 1980, com diversas manifestações e atos políticos.
Festa ou manifestação política?
Para Cláudio Nascimento, as duas coisas: “O maior ato político que um gay ou uma lésbica pode fazer é expressar politicamente o seu afeto”. Para Renato Baldin, vice-presidente da Associação da Parada do Orgulho GLBT de São Paulo, as paradas são uma ferramenta para colocar o tema dos homossexuais em pauta: “É uma forma divertida de ocupar espaço social de reivindicação, mobilizar pessoas e se fazer política. Um espaço para os homossexuais mostrarem a cara e exigirem direitos com orgulho. As paradas têm uma força política muito grande”.
É uma festa cívica, enfatiza Oswaldo Braga, presidente do MGM: “Nós saímos às ruas com o nosso gestual extravagante, nossas cores, música, dança e alegria para mostrar a nossa cultura. É uma oportunidade de mostrarmos que nós existimos, gostamos de quem somos e temos que caber nessa cidade”.
Por serem eventos de visibilidade massiva, as paradas tiveram um papel fundamental na construção do debate sobre homossexualidade no Brasil, segundo presidente do Grupo Arco-Íris. As conquistas se devem à aliança desses eventos ao trabalho cotidiano. “A parada não é o único instrumento na luta contra o preconceito, nem poder ser. Por isso, realizamos um trabalho cotidiano de articulação política. Hoje existem quase 180 organizações homossexuais no Brasil. Há dez anos, eram 35 grupos. O nível de crescimento desse movimento social foi meteórico”, diz.
Cláudio Nascimento destaca, no entanto, que as dificuldades na luta contra a homofobia no Brasil ainda são muito sérias. “Houve alguns avanços contra a homofobia, mas pequenos frente aos nossos desafios”. Pesquisa realizada pelo Grupo Arco-Íris em parceria com a Centro Latino-Americano em Sexualidade e Direitos Humanos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e o Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mendes, durante a parada GLBT do Rio, em 2003, refletem essa realidade. Dos participantes entrevistados, 62% sofreram alguma agressão física por serem homossexuais.
Embora quase 100 municípios brasileiros já tenham leis que punem crimes contra homossexuais, o Poder Legislativo, pressionado por setores religiosos e conservadores, continua omisso em relação aos direitos dessa população, afirma Cláudio. “Enquanto projetos de lei importantes para a proteção dos direitos dos homossexuais pelo Estado não forem aprovados, haverá omissão do Poder Legislativo. É preciso haver uma legislação que reconheça que os homossexuais existem e merecem respeito. Não dá mais para o Legislativo ignorar essa parcela significativa da população”, defende.
Enquanto isso, as paradas GLBT seguem buscando mudar o comportamento da sociedade em relação aos homossexuais e criar um clima favorável para a aprovação de novas leis, por meio da promoção da liberdade, da cultura de paz e da diversidade sexual. “É a celebração da diversidade”, define Cláudio.
Theme by Danetsoft and Danang Probo Sayekti inspired by Maksimer