Autor original: Italo Nogueira
Seção original: Os mais interessantes e ativos projetos do Terceiro Setor
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O tráfico de pessoas ainda é uma realidade. Não tem a mesma violência física dos tempos em que navios negreiros chegavam ao Brasil para trazer os escravos, mas ainda é uma das principais formas de desrespeito aos direitos humanos.
Criado no ano passado, o Projeto Trama – integrado pela organização de direitos humanos Projeto Legal, pelo Instituto Brasileiro de Inovações em Saúde Social (Ibiss), pela ONG Criola e pela Universidade do Grande Rio (Unigranrio) – luta para garantir o direito das pessoas traficadas, realizar pesquisas sobre esse crime e informar sobre os riscos para quem aceita ofertas de trabalho no exterior.
Promovendo campanhas informativas, o projeto procura cumprir seu principal objetivo: evitar o aliciamento. A iniciativa tem como alvo pessoas que podem, potencialmente, ser aliciadas. E se justifica porque, em muitos casos, o aliciamento não é feito de forma violenta, podendo contar com o consentimento da pessoa traficada. Esse consentimento é obtido com falsas promessas, que não condizem com o cenário que a pessoa acaba encontrando no exterior. E não impede a classificação do ato como tráfico.
Além de disseminar informação, o projeto produz pesquisas para fomentar políticas públicas de combate ao tráfico de pessoas. As pesquisas são feitas privilegiando as experiências de pessoas que já sofreram aliciamento, que podem dar detalhes sobre o processo e onde atacá-lo. O Projeto Trama oferece também atendimento jurídico e psicossocial às pessoas aliciadas. E ainda capacita operadores em direitos humanos, como no curso que realiza de 27 a 29 de junho, em conjunto com o Ministério da Justiça Federal, no Rio de Janeiro, no Ceará, em São Paulo e Goiás – estados considerados pólos desse tipo de crime. O objetivo é estimular a garantia dos direitos das vítimas do tráfico.
Embora o tráfico de pessoas não tenha um alvo definido, as vítimas normalmente são pessoas desinformadas em relação aos seus direitos e, em geral, provenientes de países em desenvolvimento. De acordo com a Pesquisa sobre Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para Fins de Exploração Sexual Comercial no Brasil (Pestraf), a faixa etária mais atingida é de 15 a 25 anos.
No entanto o tráfico de pessoas não se dá somente pela exploração sexual. O aliciamento para trabalho escravo e mesmo o tráfico de crianças também atingem números alarmantes. Somando todas as formas do crime – que pode, até mesmo, incluir aliciamento para venda de órgãos –, quatro milhões de pessoas são traficadas por ano no mundo, de acordo com a Pestraf.
Campanha informativa
Neste cenário, o Projeto Trama procura, principalmente, atuar na área da informação. E lançou uma campanha em maio, para informar pessoas que possam se interessar em trabalhos no exterior, para que estejam atentas ao que lhes é oferecido e aos seus direitos, em caso de violação de direitos humanos. “A idéia é deixar claro a essas pessoas que há um atendimento e que elas têm direitos, mesmo em terra estrangeira”, explica Frans Nederstigt, articulador internacional do projeto.
A campanha conta, entre outros materiais, com um jornal de quatro páginas que, na capa, possui anúncios fictícios de trabalho no exterior. Nas páginas internas da publicação, matérias sobre violação dos direitos humanos no exterior e a dificuldade para sair desse tipo de situação. A meta é atingir pessoas que possam se interessar por ofertas de trabalho no exterior. “Todo mundo tem direito de querer uma vida melhor, trabalhando no exterior. Mas é importante que reflitam se vale a pena ou não o risco. A gente procura também estimular as pessoas a procurarem informações sobre o que é prometido a elas”, comenta Frans Nederstigt.
Para assegurar o atendimento em países estrangeiros, o Projeto Trama tem procurado estabelecer parcerias com ONGs internacionais e com os consulados brasileiros. Todo esse atendimento é garantido pelo Protocolo de Palermo, que assegura também o apoio jurídico e psicossocial às pessoas traficadas.
De acordo com Nedestigt, Espanha, Portugal e Holanda são os principais destinos das pessoas aliciadas. Ele afirma, no entanto, que a variabilidade dos países que recebem essas pessoas é muito grande, o que dificulta as investigações. “Isso é que nem uma bola de ar. Quando a pressão aumenta em um lado, através da repressão ao tráfico, o foco vai para outro lugar”. O articulador do projeto afirma que a punição ao tráfico de pessoas é dificultada pela árdua tarefa de coletar provas e informações sobre as ações. Com a mudança constante de localização dos grupos, dos focos de aliciamento e de destino, não é fácil a tarefa de seguir os passos dos criminosos.
Defesa rígida
Para atender as pessoas aliciadas e combater o tráfico de pessoas, mais de cem países assinaram o Protocolo de Palermo. Existe, porém, a reclamação de que, em vez do combate aos grupos criminosos, muitos países europeus adotaram como tática a contenção da migração legal, para diminuir o número de casos possíveis de tráfico. Esse posicionamento dificulta o trabalho no exterior, que não é o objetivo do projeto.
“Por que será que quase todos os países que assinaram o Protocolo de Palermo ainda não ratificaram a Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros das Suas Famílias, também da ONU?”, questiona o texto no site do Projeto Trama. Essa convenção, assinada por somente 29 países, assegura direitos trabalhistas em países estrangeiros. Para o Projeto Trama, o raciocínio básico deve ser o seguinte: "no dia em que houver possibilidades suficientes para migrar de maneira legal e segura, e os migrantes tiverem os seus direitos garantidos, ninguém mais vai cair nas redes do tráfico de pessoas”.
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