Autor original: Maria Eduarda Mattar
Seção original: Notícias exclusivas para a Rets
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Comunicar-se é bem mais do que receber e emitir mensagens. É direito humano. Mostrar – e comprovar – isso para os cerca de 300 participantes foi o maior desafio do I Encontro Nacional de Direitos Humanos, realizado nos dias 17 e 18 de agosto, em Brasília, tendo como tema principal “Direito humano à comunicação: um mundo, muitas vozes”. O evento foi promovido pelo Fórum de Entidades Nacionais de Direitos Humanos (Fendh) e pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados e, além dos avanços na compreensão de por que a comunicação é um direito humano, foi marcado pelas repetidas manifestações a favor da volta do status de ministério da ex-Secretaria Especial de Direitos Humanos – atualmente uma subsecretaria vinculada à Secretaria Geral da Presidência.
A escolha do “direito humano à comunicação” como tema principal foi ousada. Embora ainda pouco explorado e incorporado pela sociedade civil brasileira – com exceção das entidades que militam diretamente na área de comunicação –, o conceito não é totalmente novo: já em 1980 era discutido e estudado. Exatamente nesse ano o Relatório Final da Comissão Internacional para o Estudo dos Problemas da Comunicação (também conhecido como Relatório MacBride) foi publicado pela Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco). Trata-se do primeiro documento de referência internacional na luta pelo direito humano à comunicação. [Mais informações sobre o relatório MacBride no box ao lado].
Só mais recentemente, porém, este tema passou a se aproximar do conjunto das organizações da sociedade civil. “Foi um desafio grande sua realização. O tema é muito novo e causaria impacto nas organizações de direitos humanos, as quais tratam muito de outras dimensões da realidade: tortura, escravidão, assassinatos de jovens, descaso de autoridades, prisões infectas, crianças e jovens prostituídos... Nesse meio, a comunicação poderia parecer um tema secundário”, relata Ivônio Barros, coordenador do Fendh.
Dessa forma, os cinco painéis e oito grupos de trabalho (GTs) realizados durante o encontro trataram de tentar esmiuçar os aspectos que embasam este direito. Um dos consensos já obtidos até agora – e refletido na Carta de Brasília, documento oficial do evento – é que o direito humano à comunicação conjuga a liberdade de expressão e o direito à informação, que se complementam, mas vai além disso. Passa pela “garantia de diversidade e pluralidade de meios e conteúdos, a garantia de acesso eqüitativo às tecnologias da informação e da comunicação, a socialização do conhecimento a partir de um regime equilibrado que expresse a diversidade cultural, racial e sexual; além da participação efetiva da sociedade na construção de políticas públicas, tais como conselhos de comunicação, conferências nacionais e regionais e locais”, conforme expõe a Carta de Brasília.
E sua importância para a garantia e efetivação dos demais direitos e para o pleno exercício da cidadania é o que ajuda a fazê-lo direito humano. “Na essência do que nos faz seres humanos está a comunicação. Este direito nos constitui, é inalienável. Tirar isso de nós é nos tirar a humanidade”, defendeu Gustavo Gindre, do Instituto de Estudos e Projetos em Comunicação e Cultura (Indecs), em sua apresentação no painel "Direito à comunicação e políticas públicas".
O painel foi um dos quatro realizados simultaneamente na tarde do dia 17. Os outros foram: “A Importância da comunicação na educação para direitos humanos”, “Gênero, raça e etnia na comunicação” e “Estado federado e exigibilidade dos direitos humanos”. Os grupos de trabalho, por sua vez, se centraram nos seguintes temas: "Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher, "Combate à tortura", "Violação de direitos humanos na mídia", "Direito humano à comunicação: conceituação e indicadores", "Educação e comunicação em direitos humanos", "Avaliação de políticas públicas de direitos humanos", "Estado federal e implementação dos tratados internacionais de direitos humanos" e "Defensores de direitos humanos". [Os relatórios dos grupos está disponível na área de Downloads desta página.]
A diversidade de temas dos painéis e GTs, unificados pelo fio condutor da relação de todos eles com a comunicação, demonstra aquele que foi o principal desafio e, ao mesmo tempo, o principal avanço do encontro: mostrar às pessoas como e por que o direito à comunicação é um direito humano e fazer isso começar a ser entendido e incorporado na luta diária das mais variadas entidades de direitos humanos.
“Tenho dúvidas de quanto o tema conseguiu dialogar com as outras entidades de direitos humanos aqui no evento. Mas só de ele ser pautado, encontrar pontos de diálogo e ver esse discurso sendo incorporado aos poucos já é um grande ganho. Não podemos querer que todos mergulhem de cabeça, como se comunicação fosse a sua própria pauta, pois isso não vai acontecer. O que temos que fazer é dar conta de dialogar com quem acha a comunicação importante, sem ser a sua prioridade número um”, diz João Brant, do Coletivo Intervozes e da articulação Cris Brasil. “Falta à sociedade brasileira essa noção do direito humano à comunicação. Na hora que as pessoas se apropriam dessa pauta, começam a entender a importância dela muito fortemente. Mas só se percebe quando se chega perto”, completa.
A deputada Iriny Lopes (PT-ES), presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, considerou o evento eficaz para consolidar essa compreensão. “Toda vez que você socializa o debate, ele propicia a compreensão do tema. E, quando você compreende, está em melhor condição de opinar. Foi uma decisão muito boa da nossa parte ter escolhido o tema da comunicação como central do encontro deste ano. A participação de todos e de todas foi muito grande”, disse ela à Rets.
“Vimos no encontro que a comunicação não é um tema menor. Ele está entrelaçado com todos os demais, está muito ligado com a estrutura de poder que produz e reproduz o desrespeito aos direitos humanos. A qualidade dos debates foi excelente, o que ajudou-nos muito a compreender melhor a dimensão do direito humano à comunicação, perceber que começa com a questão da liberdade de expressão, mas que vai muito além”, diz Ivônio.
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