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Direitos sem grades

Autor original: Italo Nogueira

Seção original: Novidades do Terceiro Setor






Direitos sem grades
Roberto Stindl

Depois de anos assistindo a diversas violações de direitos e a ineficácia de algumas leis, funcionárias do sistema penitenciário e do Departamento Geral de Ações Sócio-Educativas (Degase) fundaram recentemente a ONG A Gente Mulher – Centro de Estudo e Pesquisa. O objetivo é elaborar pesquisas sobre as necessidades de detentas, funcionárias e visitantes que freqüentam as prisões.

A entidade é formada por profissionais de medicina, assistência social, psicologia e educação, áreas que podem contribuir para a melhoria do serviço penitenciário e sócio-educativo do estado. Para fundamentar suas reivindicações e apontá-las para as autoridades, a entidade ouvirá todas as pessoas envolvidas com o sistema penitenciário e sócio-educativo.

Reclamações são muitas, e não faltam bases na realidade. Sandra Figueira, diretora executiva da nova ONG e funcionária do sistema há 11 anos, indica diversos casos em que a distância entre os legisladores e o dia-a-dia dos presídios ou o sistema sócio-educativo provoca a falta de humanidade nestes espaços. “Falta observar o lado humano destas pessoas”, afirma. Segundo ela, além de ficarem distantes do cotidiano, os responsáveis por criar leis dificilmente consultam os funcionários sobre o que precisa ser melhorado nas unidades.

Um dos pontos em que a lei peca, para a diretora executiva, é a ausência de um hospital dentro dos presídios. O sistema penitenciário do Rio de Janeiro tem um convênio com o Sistema Único de Saúde (SUS), em que oferece atendimento especializado para as mulheres, porém fora das unidades. Assim, caso as detentas estejam em trabalho de parto, a mulher é levada para um hospital fora da prisão. Para assegurar que não haverá fuga, algema-se a mulher durante e depois do parto. “Caso houvesse um hospital dentro das unidades que pudesse atender estes e outros casos, não seria necessário esta violação de direito. Para esta operação é necessário deslocar policiais, funcionários da penitenciária. Com um hospital nas unidades seria muito mais fácil”, explica Sandra.

A nova instituição pretende também auxiliar as funcionárias do sistema. Uma das dificuldades apontadas é a falta de auxílio às mães que trabalham nos presídios. Como muitas delas fazem plantão de 24 horas, é necessária uma creche que receba suas crianças por este mesmo intervalo de tempo. Sandra afirma que muitas mulheres deixam de ter filhos por este problema.

“O grande problema é que no Brasil, quem faz as leis não sofre com elas. Há uma distância muito grande entre quem faz as leis e os que a vivem no dia-a-dia”, aponta a diretora executiva. Ela aponta os casos dos celulares nas prisões - um dos principais problemas atuais no sistema penitenciário - como emblemático deste distanciamento e os reflexos na sociedade. “Para coibir a entrada de celulares, proibimos funcionários e visitas de entrarem com celulares nos presídios. Só que não há punição para quem tentar. Ou seja, ele pode insistir até conseguir. E aí começam as ameaças que vemos hoje em dia”, explica.

Articulação

Para Sandra Figueira, todos estes problemas surgem da falta de diálogo entre os legisladores e as funcionárias do sistema. Outro fator seria a indicação política de nomes para ocupar os cargos de decisão. “Raramente os que tomam as decisões visitam as unidades. Tem ainda muita politicagem no meio”, explica Sandra.

Para ganhar força, a recém-criada ONG já procura se articular com outras entidades e pessoas ligadas à questão. A instituição já tem apoio do Fundo Ângela Borba, e contou com a presença, na cerimônia de fundação, do Subsecretário Adjunto de Infra-Estrutura da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seap) do Rio de Janeiro Luiz Monnerat.

Sandra comenta que por ser recente, a nova entidade pode até gerar receio nas próprias funcionárias do sistema penitenciário, pelo medo de falta de propostas. No entanto, ela avisa que a ONG A Gente Mulher conta com profissionais de diversas áreas, detectando os mais variados problemas, e a instituição irá propor políticas públicas para melhorar a situação nos presídios femininos.

Italo Nogueira

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