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Uma década bem certificada

Autor original: Joana Moscatelli

Seção original: Os mais interessantes e ativos projetos do Terceiro Setor






Uma década bem certificada
Divulgação

O que um lançamento literário poderia ter em comum com um instituto de certificação florestal e agrícola? A princípio, nada. Entretanto, a crescente conscientização da relação entre consumo consciente, desenvolvimento sustentável e qualidade de vida pode explicar a presença do recente lançamento de José Saramago no site do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora). Seu novo livro, “As intermitências da morte”, é a primeira publicação impressa no Brasil em papel certificado pelo Imaflora.

De acordo com dados do Instituto, mais de 80% da madeira tropical consumida no Brasil ainda advém da exploração predatória e ilegal, provocando problemas como falta de água, racionamento de energia, desastres naturais e perda de biodiversidade. A incapacidade do Estado e a ausência de incentivos econômicos às atividades sustentáveis contribuem para que tragédias ambientais como o desmatamento de florestas nativas e a perda da biodiversidade sejam cada vez mais comuns.

Diante dessa situação, fica a pergunta: é possível conciliar atividade econômica com bem estar social e ainda conservar os recursos naturais? O trabalho proposto pelo Imaflora é justamente demonstrar que o manejo florestal e a atividade agrícola podem ser realizados de uma maneira responsável e sem prejuízos a toda a sociedade brasileira, desde produtores até consumidores de produtos florestais e agrícolas.

Desde 1996, um ano após sua criação, o Imaflora desenvolve programas de certificação agrícola e florestal buscando estimular o manejo dos recursos naturais de forma ambiental, social e economicamente responsáveis. Esses tipos de certificação garantem o uso de técnicas e sistemas apropriados para a realidade específica de cada região. E, no caso da certificação florestal, podem contribuir para a capacidade de regeneração das florestas nativas, preservar os habitats de vida silvestre e os recursos hídricos.

Comércio de produtos certificados

Apesar de a maior parte dos produtos certificados pelo Imaflora serem destinados ao exterior, a meta é incentivar cada vez mais a comercialização desses produtos no Brasil. Em uma escala pequena, já existem certificados no país produtos como móveis, materiais de construção, café e outros. Entretanto, o secretário executivo do Instituto, Luís Fernando Guedes Pinto, faz questão de apontar a expectativa para o aumento da oferta de produtos estratégicos como embalagens, cosméticos e papéis, semelhantes ao utilizado no livro de Saramago.

Apesar desse crescimento no número de produtos certificados, o acesso à certificação por parte de produtores e comunidades pequenas ainda é limitado. Além dos custos, que ainda são altos, o diretor aponta outros fatores que dificultam esse acesso, tais como a falta de organização e formalização de procedimentos e a própria ausência de informação sobre o assunto. A fim de aumentar o acesso à certificação por parte de pequenos produtores e comunidades, o Imaflora utiliza ferramentas que reduzem os custos da certificação. Um exemplo desses instrumentos é o Fundo Social, composto por recursos oriundos de uma taxa cobrada de empreendimentos empresariais.

Desenvolver ações que estimulem o consumo e a produção responsável na sociedade brasileira é uma meta importante para o Imaflora. Para o Instituto, é necessário que não só as empresas, mas o próprio governo e a sociedade civil atentem para a importância de se estimular o uso sustentável de nossas florestas e terras. Certificados como os concedidos pela ONG podem contribuir para que a sociedade passe a valorizar produtos advindos de atividades sustentáveis, garantindo assim a preservação do meio ambiente. Por isso é tão importante o trabalho, desenvolvido pelo Imaflora, de capacitação de representantes dos diversos setores da sociedade sobre o conceito da certificação e do bom manejo florestal e agrícola, aprofundando questões conceituais e contextuais. Essa sensibilização é feita através de cursos, eventos, seminários, palestras, publicações e com o estabelecimento de parcerias com entidades de ensino e pesquisa e outras entidades públicas ou privadas.

Atualmente, os altos índices de desmatamento amazônico e a aprovação da lei que libera o uso de trangênicos no Brasil são algumas das medidas que vêm decepcionando muitos ambientalistas e defensores do desenvolvimento sustentável. Guedes não é exceção nesse meio, mas ainda assim vê com otimismo a tramitação no Congresso Nacional do projeto de Lei de Gestão de Florestas Públicas. “Se for aprovado o texto atual e o governo tiver condições de aplicar corretamente as idéias do projeto seria um grande avanço”, acredita. Para ele, a aprovação da lei é a apenas o início de um enorme desafio já que a dificuldade estaria na implementação das medidas previstas.

O projeto prevê o uso sustentável dos recursos florestais em terras públicas e pode contribuir para o desestímulo à grilagem e privatização de terras públicas, principalmente na Amazônia. Se aprovado pelo Senado, introduzirá um sistema de concessão de uso de produtos e serviços florestais pela iniciativa privada ou associações comunitárias. Outra iniciativa que deveria ser tomada, segundo Guedes, é a criação de políticas de incentivo, como remuneração de serviços ambientais, tributação diferenciada e incorporação de critérios de sustentabilidade para o crédito e financiamento de qualquer atividade pública ou privada.

Feira, formação e políticas públicas

Para apresentar à sociedade brasileira as variedades e os benefícios dos produtos florestais certificados, o Imaflora realiza, de 18 a 20 de abril de 2006, a Feira Brasil Certificado. Durante o evento, além da exposição de produtos, serão realizadas oficinas sobre manejo florestal e o mercado para produtos certificados. Na primeira edição da feira, em 2004, mais de 5 mil pessoas participaram do evento.

Um outro exemplo de projeto de capacitação é o Consumo Verde, que procura sensibilizar as empresas que consomem produtos florestais sobre a importância das florestas brasileiras e a necessidade de avaliar a procedência de produtos em suas compras. Parceria com o Centro de Estudos em Sustentabilidade (CES), da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (SP), a iniciativa pretende contribuir para o desenvolvimento de políticas de compras que contemplem o uso racional e a certificação para produtos florestais.

Outra área importante de ação do Imaflora é o incentivo a políticas públicas que visem ao desenvolvimento sustentável e à conservação do meio ambiente. Em parcerias com outras organizações e movimentos sociais, o Instituto busca contribuir com propostas de políticas públicas relacionadas aos Ministérios do Meio Ambiente, Desenvolvimento Agrário e Agricultura.


Joana Moscatelli

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