Você está aqui

Anistia para João Cândido

Autor original: Maria Eduarda Mattar

Seção original: Artigos de opinião

Ivanir dos Santos*

O movimento negro brasileiro pretende com a Marcha Zumbi + 10 reafirmar a luta contra o racismo, pela igualdade e a vida. Neste contexto o evento vai resgatar a memória do marinheiro negro João Cândido, líder da Revolta da Chibata. Com o amadurecimento desta luta a organização da Marcha trabalha com dois eixos o reconhecimento do conceito de reparação para implementação de políticas de combate ao racismo e de promoção da igualdade racial e o cumprimento e fiscalização das orientações da Declaração e do programa de ação da III Conferência Mundial Contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlatas.

Um dos aspectos mais marcantes dos movimentos populares no Brasil é presença da participação da população negra nos movimentos de massa. Com a luta pela anistia, desafiando a ditadura militar, surge o Movimento Negro Unificado, na escadaria do Teatro Municipal de São Paulo, com a participação de mais de duas mil pessoas.

Em 1988, Centenário da Abolição e da Assembléia Constituinte, o movimento negro saiu as ruas para protestar contra a farsa da abolição, e foi no Rio de Janeiro que a população negra sentiu forte repressão policial. A partir de então em todo o Brasil as lutas se intensificaram e conquistas vêm sendo alcançadas. Com a Constituição de 1988 a população remanescente de quilombos garantiu a titularidade da terra e o desenvolvimento de políticas econômicas, educacional e cultural em seu território. No ano de 1984 o Governo de São Paulo cria o Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra do Estado de São Paulo. Seguindo a mesma linha o presidente Sarney criou a Fundação Palmares, do Ministério da Cultura (Minc). Juristas e parlamentares aprovam a Lei Cão, que torna crime o racismo.

No governo atual há uma maior visibilidade da população negra nos cargos de primeiro escalão. Em 2003, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva implanta a Secretaria Especial de Política de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), que representa mais um instrumento que contribui para a desconstrução do racismo institucional. Uma das mais importantes medidas governamentais foi a Lei 10.639 ter sido sancionada, que torna obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileira nas escolas de ensino fundamental e médio em todo o país. Contudo ainda é preciso desenvolver uma política nacional de erradicação do racismo e da pobreza e resgatar os vultos que constroem a história desta nação.

Embora quase um século depois, a Marcha coloca no cenário o compromisso da Comissão de Constituição e Justiça e de Redação do Senado Federal, que aprovou o Projeto de Lei 7198/02, que concede anistia póstuma a João Cândido Felisberto, que em 1910 liderou a Revolta da Chibata, e aos demais marinheiros participantes do movimento. A anistia deve produzir todos os seus efeitos, incluindo as promoções a que teriam direito os beneficiados, se tivessem permanecido em serviço ativo, e a pensão por morte. Além disso é objetivo também resgatar a memória de João Cândido homenageando-o e batizando com seu nome um dos 40 navios que o Ministério de Minas e Energia está comprando para o Brasil. A herança mais terrível do modelo colonial, que é a brutalidade racista e classista, precisa ser extirpada de uma sociedade que tem dívidas com um grupo social que amargou a escravidão e ainda hoje luta contra a discriminação.

A Marcha será no dia 22 de novembro (data da Revolta da Chibata), em Brasília, com concentração marcada para as 8h, na Catedral, saindo às 10h30 percorrendo toda a Esplanada dos Ministérios. Para a parte da tarde estão sendo agendadas audiências com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os presidentes Aldo Rebelo, da Câmara dos Deputados, e Renan Calheiros, do Senado Federal, e o ministro Nelson Jobim, do Supremo Tribunal Federal. Para o final do dia estão sendo preparados shows regionais e artistas da música brasileira.

Comissão organizadora: APNS (Agentes de Pastoral Negros do Brasil), CEAP (Centro de Articulação de Populações Marginalizadas), CNCDR/CUT (Comissão Nacional contra a Discriminação Racial da Central Única dos Trabalhadores), CONEN (Coordenação Nacional de Entidades Negras), Fórum Nacional de Mulheres Negras, INTECAB (Instituto Nacional da Tradição e Cultura Afro-Brasileira), MNU (Movimento Negro Unificado), UNEGRO (União de Negros pela Igualdade), CMP (Setorial de Negros e Negras da Central de Movimentos Populares).


*Ivanir dos Santos é presidente do Centro de Articulação de Populações Marginalizadas (Ceap) - www.portalceap.org.br.






A Rets não se responsabiliza pelos conceitos e opiniões emitidos nos artigos assinados.

Theme by Danetsoft and Danang Probo Sayekti inspired by Maksimer