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Nossa rádio é comunitária. E quer funcionar

Autor original: Viviane Gomes

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Nossa rádio é comunitária. E quer funcionar


Quinze rádios comunitárias da região sisaleira da Bahia estão unidas em torno da campanha Nossa Rádio é Comunitária. A iniciativa é da Associação de Rádio e TV Comunitárias do Território Sisaleiro (Abraço-Sisal), com apoio do Movimento de Organização Comunitária (MOC), do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), da Agência Mandacaru de Comunicação e Cultura e de movimentos sociais da região sisaleira e da Bacia do Jacuípe. A principal motivação da campanha é a Lei de Radiodifusão Comunitária (de nº 9612/98) que, de acordo com Paulo Marcos, técnico de comunicação do MOC, “exige inúmeros procedimentos burocráticos e requisitos técnicos para a constituição e para a subseqüente autorização de funcionamento de uma emissora popular, tornando mais comum e temida a repressão praticada contra as rádios”.

Para ele, o governo, através da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e da Polícia Federal, ignora todo o contexto social, político, econômico e cultural das emissoras comunitárias e continua apreendendo e lacrando equipamentos.

A revisão da lei de radiodifusão é ponto da lista de reivindicações das ONGs que organizam a campanha: ampliação da potência de 25 para 250 watts, término da cobrança de direitos autorais por exibição musical e pluralização das freqüências disponíveis para as rádios comunitárias. Entre as demandas, constam também anistia para pessoas processadas, devolução de bens apreendidos e concessão emergencial de licenças provisórias para as rádios comunitárias filiadas à Abraço-Sisal. A campanha também vai trabalhar para que o Ministério das Comunicações aplique como critério para outorga das rádios comunitárias a relevância das mesmas na construção de uma identidade territorial local.

Marcos esclarece que as prescrições mais diversas da lei geram a necessidade de assessoria técnica e jurídica para a montagem de uma rádio comunitária. Isso acarreta uma série de despesas financeiras incompatíveis com a natureza das associações civis sem fins lucrativos, como as rádios comunitárias. “Nessa realidade, a solicitação de documentos registrados, projetos técnicos e taxas diversas praticamente impossibilita o fortalecimento de rádios verdadeiramente comunitárias”, diz o técnico.

Ele acrescenta que a falta de esclarecimento sobre o que constitui “apoio cultural” – única forma de sustentabilidade das rádios comunitárias prevista em lei – dificulta a captação de recursos e permite a livre interpretação dos agentes da Anatel.

Uma das questões mais criticadas na legislação é a área de abrangência de uma rádio comunitária. “A legislação destina às emissoras comunitárias o alcance equivalente a um quilômetro de raio. Logo se vê que este critério traduz uma concepção equivocada do termo “comunidade” ao ignorar aspectos sócio-culturais de compartilhamento de códigos e costumes que extrapolam o ambiente”, explica Paulo Marcos. “Freqüentemente existe apenas uma rádio comunitária em um espaço de muitos quilômetros, e a sede dessa emissora fica, normalmente, no meio urbano. Desse modo, a obediência ao princípio de abrangência estabelecido pela lei significaria desprover a população rural do sertão do acesso aos debates e à informação fornecida pelas emissoras”, completa.

Outra ação da campanha é o encaminhamento da Carta Valente - documento resultante de um seminário regional realizado em Valente (BA) pelos organizadores da campanha - para várias entidades nacionais e internacionais. O intuito da iniciativa é juntar forças e estender a campanha para todo o Brasil. Na carta, além das reivindicações, há um abaixo-assinado com assinaturas de moradores dos 15 municípios envolvidos.

A campanha também tem o objetivo de divulgar o lançamento da pesquisa “Rádios comunitárias da Região Sisaleira da Bahia: memória, conjunturas e perspectivas” [ver link na coluna ao lado]. O estudo tem o objetivo de subsidiar as rádios comunitárias da região a partir do levantamento de sua memória e da análise de sua situação atual. Traz elementos para a elaboração de um plano estratégico de ações que contribuem tanto para o desenvolvimento da rádio como para o aprofundamento das relações com outros movimentos populares.

O técnico do MOC justifica o título da campanha, que alcança mais de 50 municípios baianos através do rádio, do jornal e da TV, dizendo que hoje no Brasil, com a idéia de democratização da comunicação, as pessoas acreditam poder montar uma rádio em casa, no quintal, no escritório, na igreja ou na sede de um partido político. “Não é desse tipo de rádio que estamos falando. Estamos trabalhando com 15 emissoras, tentando fazer com que sejam plurais, façam parte de um interesse maior e não de um grupo ou um partido político. A rádio comunitária que queremos é aquela que preza pelo interesse comunitário, social; que busca a defesa das crianças, dos adolescentes e dos direitos das mulheres. Queremos uma rádio que coloque o prefeito para debater com a sociedade. Uma rádio que denuncie e que toque educação. Ainda estamos longe disso, mas trabalhamos com esse interesse e objetivo”, conclui.

Viviane Gomes

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