Autor original: Mariana Loiola
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Segundo uma análise exponencial sobre o número de crianças trabalhadoras, em dez anos (2015), o Brasil terá ainda cerca de 2,7 milhões de crianças entre 10 e 17 anos trabalhando. Apesar de uma substantiva redução, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad), do IBGE, referentes a 2003 (4,6 milhões) em relação a 1992, ainda é uma cifra considerável de ocorrências de trabalho infantil. Essa é uma das conclusões do estudo “O Brasil sem trabalho infantil! Quando? – projeção de estimativas de erradicação do trabalho infantil e análises selecionadas, com base nos dados de 1992–2003”, lançado pelo Programa Internacional para Eliminação do Trabalho Infantil, da Organização Internacional do Trabalho (Ipec/OIT).
A principal conclusão do estudo é que, embora o trabalho infantil no Brasil esteja diminuindo, sua incidência continua sendo alta. Será preciso identificar formas de diminuí-lo mais rapidamente. Com base nas análises, pode-se dizer que o trabalho infantil diminuirá significativamente nos próximos anos, mas não se extinguirá. Ainda há muito a ser realizado no nível das ações governamentais e sociais para a completa extinção do problema.
É importante salientar que as tendências são significativamente diferentes em relação à faixa etária e à região do país, por exemplo. Para as crianças entre 5 e 9 anos as projeções são mais otimistas, demonstrando a possibilidade de erradicação do trabalho infantil até 2015. Mas é importante ressaltar as diferenças regionais, que indicam que algumas áreas merecem mais atenção governamental que outras, por estar em pior situação ou por apresentar menor índice de redução. Existem, também, diferenças importantes entre os sexo (meninos trabalham proporcionalmente mais que meninas) e entre as áreas urbana e rural. Os índices de crianças que trabalham na zona rural é mais que o dobro do que na urbana.
Outras análises feitas no estudo mostram que existe um conjunto de fatores sociais com forte correlação com o índice de trabalho infantil. Ações sociais que consigam diminuir a evasão escolar, que apóiem a manutenção da estrutura familiar ou que minimizem a gravidez na adolescência, por exemplo, muito provavelmente levarão à menores índices de trabalho infantil.
Pode-se analisar, inclusive, qualquer esforço de programas de geração de renda complementária deve estar integrado com ações estruturantes no setor da educação.
Tendências estratificadas
- Faixa etária: o número de trabalhadores em todas as faixas de idade tem caído com o passar dos anos, mas, em números absolutos, esta tendência de queda foi maior na faixa entre 14 e 17 anos, no entanto ao analisar a proporção de crianças que trabalham, confirma-se que o decréscimo é real e mais significativo entre 5 e 9 anos.
- Raça: a tendência de queda é evidenciada em todas as categorias de cor de pele utilizada pela Pnad. Mas vale destacar que, em termos absolutos, o número de crianças que se declaram brancas ou pardas e que trabalham se mantem equilibrado ao longo dos anos, e das negras reduz. A categoria amarela é a que sempre demonstra números menores, enquanto a indígena historicamente sempre se mostrou a maior. Conjugando pretos e pardos na categoria “raça negra”, o número absoluto de crianças da raça negra que trabalham é maior que o das crianças brancas.
- Sexo: historicamente, as crianças do sexo masculino trabalham em maior número (quase o dobro), mas as meninas, normalmente, dedicam-se ao trabalho doméstico, atividades culturalmente não consideradas como trabalho. Esse fato pode velar os números observados, fruto de dados autodeclarados. É interessante observar, também, que embora haja tendência de queda do índice de trabalho infantil nos dois gêneros, a queda entre as meninas mostra-se mais lenta.
- Área de moradia (urbana ou rural): resultado também de queda, mantendo a tendência histórica de maior proporção de trabalhadores infantis nas zonas rurais.
- Região: em números absolutos, as regiões nordeste e sudeste são as que apresentam mais trabalhadores infanto-juvenis. A região que apresenta maior tendência de queda é a sudeste, seguida das regiões centro-oeste e sul. A região norte não se ajusta ao modelo exponencial, apresentando grande probabilidade de erro estatístico, e mesmo assim o decréscimo obtido pelo modelo é muito baixo. As projeções recomendam um foco grande na região nordeste para os futuros esforços, já que esta apresentaria a maior taxa em 2015.
- Estado: ao se analisar o detalhe por estado, a tendência de queda observada por regiões ou mesmo no país como um todo não se repete, o que exige uma reflexão focada e localizada nas particularidades de cada estado, para que as ações voltadas à eliminação do trabalho infantil possam progredir.
Estudos específicos de 2003
Quanto mais cedo uma pessoa começa a trabalhar, menor será, em média, sua renda por toda a vida. Os grupos que começaram a trabalhar ainda quando crianças (até 17 anos), não apresentam médias de renda superiores a R$ 1.500,00. Mais do que uma coincidência de números, os dados indicam que o trabalho infantil condena a pessoa a permanecer em um circulo vicioso: trabalho infantil, baixa escolaridade, baixo rendimento.
Outro dado importante na análise dos dados da Pnad 2003 se refere a relação entre migração e trabalho infantil. Os jovens entre 10 e 17 anos que moram no município de nascimento trabalham em menor proporção que aqueles que se mudaram.
O trabalho infantil está intimamente ligado à renda domiciliar. Para as crianças de 10 a 17 anos, a diferença na renda domiciliar não altera a proporção de crianças que trabalham até o valor R$ 1.800. No entanto, para as crianças de 5 a 9 anos, qualquer aumento na renda domiciliar influencia. Assim, provavelmente, os programas de incentivo financeiro para redução do trabalho infantil, surtam mais efeito para a eliminação do problema na faixa de 5 a 9 anos, sem atingir plenamente seus objetivos na faixa entre 10 e 17 anos.
Outro dado interessante na relação entre trabalho infantil e renda domiciliar é que a renda média das crianças que trabalham aumenta conforme a renda domiciliar. Existe uma linearidade entre a renda da criança e a renda do domicílio até a faixa de R$ 2.400,00 de renda domiciliar para crianças entre 10 e 17 anos, indicando que, quanto maior a renda da família, maior a média da renda oriunda do trabalho da criança.
Os dados da Pnad 2003 também demonstram que, em geral, os “programas sociais voltados para a educação” conseguem diminuir a proporção de crianças entre 10 e 17 anos que trabalham, mas não de forma significativa. Para crianças menores, ser beneficiária não diminui a proporção. Este resultado pode estar relacionado à importância da renda da criança para a família e que o ensino básico no país se inicia a partir dos 7 anos. É de se anotar que o Bolsa Escola contempla crianças em idade escolar.
Já a correlação trabalho infantil e freqüência escolar é significativa. A proporção de crianças que não estudam e que trabalham é mais do que o dobro quando se compara com aquelas que estudam. Não se pode concluir qual seria a causa e qual o efeito, mas uma verdade é que as crianças que freqüentam escola trabalham menos.
Ainda foi analisada a relação trabalho infantil e maternidade, mostrando que a proporção de meninas com filhos que trabalham é muito superior àquelas que não tem filhos. E também que a existência de mãe viva e que more no domicílio tem impacto positivo no combate ao trabalho infantil.
Análise de impacto
Além das projeções de estimativas e da análise de dados específicos da Pnad 2003, o estudo lançado pela OIT/Ipec também reúne algumas análises cruzadas, isto é, que se utilizam de algumas variáveis para a previsão de outras. Assim pode ser relacionado o impacto da eliminação do trabalho infantil em alguns indicadores macro e microeconômicos.
- Renda da pessoa relacionado à idade e faixa de início de trabalho: uma pessoa terá entre 35% e 85% a mais de renda se não trabalhou enquanto criança, iniciando o trabalho respectivamente após 9 anos e após 18 anos.
- Impacto da eliminação do trabalho infantil na renda nacional (renda do trabalho): com base nas correlações anteriores, fez-se um exercício do impacto do fim do trabalho infantil no país, chegando a conclusão que, no futuro, o total da renda nacional poderia aumentar cerca de 37%.
Um outro possível impacto positivo da extinção do trabalho infantil seria que ele deixaria de concorrer com o mercado de emprego dos adultos.
Texto de divulgação fornecido pela Organização Internacional do Trabalho (www.oitbrasil.org.br). O estudo da OIT está disponível na área de Downloads desta página.
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