Autor original: Mariana Loiola
Seção original: Notícias exclusivas para a Rets
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Depois de crescer em número de participantes, o maior encontro de movimentos sociais e organizações da sociedade civil agora se espalha pelo mundo. Pela primeira vez desde seu início, em 2001, o Fórum Social Mundial (FSM) ocorrerá em três continentes (África, América do Sul e Ásia), sendo assim chamado de policêntrico. As sedes em 2006 serão Bamako, no Mali, de 19 a 23 de janeiro; Caracas, na Venezuela, de 24 a 29 do mesmo mês; e Karachi, no Paquistão, em março. Milhares de pessoas e organizações que não puderam - em razão da distância - participar das edições anteriores, em Porto Alegre (Brasil) e Mumbai (Índia), terão agora a oportunidade de expor as suas experiências no FSM.
“O que o policentrismo de 2006 quer fazer é espalhar ainda mais a dinâmica do Fórum pelo mundo todo”, diz Francisco Whitaker, membro do Comitê Organizador Brasileiro do FSM.
Anteriormente também marcado para janeiro, o FSM no Paquistão teve que ser adiado em conseqüência do terremoto ocorrido no país em outubro. No FSM no Mali, estão previstas mais de 500 atividades e são esperadas mais de 30 mil pessoas. Em Caracas - onde ocorrerá, simultaneamente, o II Fórum Social Américas - espera-se a presença de 100 mil participantes. A Rits estará em Caracas, representada por uma equipe que participará de diversas atividades e fará a cobertura jornalística [mais informações ao lado].
As delegações de Colômbia, EUA e Brasil deverão ser mais numerosas em Caracas, segundo a organização do evento. Das mais de duas mil atividades inscritas, 500 são de instituições brasileiras. As atividades do FSM deverão ocorrer em 250 salas, além de espaços abertos e tendas temáticas. As atividades são autogestionadas, o que assegura a democracia do processo do Fórum, dando a possibilidade às organizações para que debatam os temas que lhes interessem.
Como nos outros anos, o FSM mantém a idéia central de ser um contraponto ao Fórum Econômico Mundial, que ocorre em Davos, na Suíça, e um espaço para debate, reflexão, formulação de propostas e intercâmbio de experiências para construir alternativas frente às políticas neoliberais.
Ocasião e impasse
Em relação às críticas cada vez mais freqüentes feitas por alguns setores ao fato de o FSM não ter um "resultado" oficial, ou uma carta de recomendações, ou seja, um desdobramento prático, Francisco Whitaker comenta: “Quem faz essas críticas ainda não entendeu o que é o Fórum. Pensa que ele é um movimento e não um espaço”. Segundo Whitaker, o FSM é uma incubadora de novas iniciativas na luta pela superação do neoliberalismo. No entanto, nenhuma iniciativa é lançada “pelo” Fórum, mas “por ocasião” dele, ressalta.
Uma das iniciativas lançadas por ocasião do FSM foi o lançamento, na segunda edição do evento, da Campanha pelos Direitos à Comunicação na Sociedade da Informação (Cris, da sigla em inglês), que teve uma atuação destacada no marco da Cúpula Mundial sobre a Sociedade da Informação, realizada em novembro, em Túnis. Agora, em Caracas, deverá ser lançada a Campanha Continental pelos Direitos da Comunicação. Dialogando com a Cris, a campanha continental tem como objetivo aglutinar as distintas lutas e propostas alternativas em comunicação que se desenvolvem na região. Dessa iniciativa deverá surgir uma agenda social em matéria de comunicação e uma maior capacidade de pressão e intervenção social, de acordo com Sally Burch, da Agência Latino-americana de Informação (Alai), uma das organizadoras da campanha. “As redes e organizações de comunicação - que, há muitas décadas, vêm impulsionando lutas nesta área - encontraram no FSM não só um espaço significativo para fortalecer os vínculos entre elas, mas também uma oportunidade inédita para construir pontes com outras lutas e atores sociais”, diz Sally.
Diretor-geral da Associação Brasileira de Organizações Não-governamentais (Abong) e representante do Comitê Organizador Brasileiro do FSM, Jorge Eduardo Durão diz que sente falta de iniciativas mais coordenadas no FSM, mas enfatiza que elas devem ser coordenadas livremente pelos participantes. “O FSM é um espaço plural”, reforça. Embora a idéia do evento seja de abordar temas mais globais, Durão espera que esse FSM ajude na reflexão sobre a solução de problemas da América Latina. “Vivemos um momento de impasse na América Latina. Os avanços democráticos foram acompanhados de poucos resultados de mudança. O desafio dos movimentos agora é fazer com que as formas de resistência democrática tenham mais resultados práticos”, diz.
Espaço Brasil
Assim como ocorreu no Fórum de Mumbai, em 2004, o evento de Caracas contará com um Espaço Brasil – uma área a ser compartilhada entre organizações sociais e o governo brasileiro. A área da sociedade civil está sob a responsabilidade do Grupo Facilitador Brasileiro do Fórum Social Mundial e sendo coordenada pelo Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase). O Espaço Brasil terá mostras de documentários sobre a história do FSM (que em suas cinco edições reuniu um total de 340 mil pessoas), exposições fotográficas, apresentações multimídia, painéis interativos, entre outras atividades. De acordo com Francisco Whitaker o Espaço Brasil tem como objetivo ser “um ponto de encontro de todos os brasileiros participantes e um espaço de divulgação de atividades desenvolvidas no Brasil para superar o neoliberalismo”.
Uma versão brasileira do evento deverá ser realizada pela primeira vez em abril, em Recife. O fórum temático será dedicado exclusivamente ao processo político nacional dos últimos três anos. Além de contar com os movimentos sociais brasileiros, o evento pretende atrair muitos intelectuais e ativistas estrangeiros. A proposta do fórum brasileiro é definir um projeto de Brasil independente de partidos e mostrar a força da autonomia cidadã, segundo Cândido Grzybowski, diretor do Ibase e também membro do Comitê Organizador Brasileiro do FSM. “A crise política caiu como uma bomba em vários setores de esquerda. Não podemos tapar o sol com a peneira. Precisamos discutir que Brasil queremos e de que Brasil o mundo precisa: o Brasil potência ou o Brasil solidário e democrático?”, diz.
Nova política
A desconfiança em relação às instituições governamentais é, de modo geral, alta entre os participantes do Fórum Social Mundial, segundo pesquisa realizada pelo Ibase na quinta edição, em Porto Alegre. Os dados da pesquisa, que busca traçar o perfil dos participantes do evento, estão em publicação que será distribuída no Fórum Social de Caracas.
Cândido Grzybowski destaca a presença cada vez mais jovem no FSM entre os dados da pesquisa. “Essa constatação vai de encontro à idéia de que o jovem não se interessa por política. O FSM mostra que os jovens estão interessados no tipo de ação política proposta por movimentos sociais”, afirma.
A pesquisa também aponta a formação de uma nova política esquerda, segundo Grzybowski. “A elite de esquerda agora está mais difusa, não é formada exatamente por intelectuais, mas por líderes de organizações e movimentos”. O crescimento dos movimentos feministas, ambientalistas, de jovens e ligados ao tema da educação também chama a atenção no levantamento.
O policentrismo do VI FSM deverá trazer outros dados para esse perfil, já que contribuirá para aumentar a diversidade do evento. “Agora estamos indo para áreas novas, dando a oportunidade para se acentuar a diversidade sociopolítica e cultural do FSM”, diz Cândido.
Se o balanço da experiência de 2006 for positivo, o modelo policêntrico poderá ser repetido de dois em dois anos. A próxima edição, em 2007, voltará a ter uma sede única, em Nairóbi, no Quênia (África).
Programação
A marca antiimperialista do evento abrirá as atividades em Caracas, no dia 24, com uma “marcha contra a guerra e o imperialismo”, da Plaza de las Trés Gracias em direção ao Paseo los Próceres, onde ocorrerá um grande ato político e shows. O VI FSM se desenvolverá em seis eixos temáticos: Poder, política e lutas pela emancipação social; Estratégias imperiais e resistências dos povos; Recursos e direitos para a vida: alternativas ao modelo civilizatório depredador; Diversidades, identidades e cosmovisões em movimento; Trabalho, exploração e reprodução da vida; Comunicação, culturas e educação: dinâmicas e alternativas democratizadoras.
Sete atividades cogestionadas terão o propósito de dar visibilidade aos temas e debates que formam parte do processo de acumulação política do Fórum Social Mundial: “A batalha de Hong Kong” e a resistência global à OMC e ao livre comércio; Estratégias imperiais, militarização e resistências dos povos; Os novos caminhos da integração latino-americana; Hegemonia, governabilidade neoliberal e movimentos sociais; Capitalismo predatório e bens comuns da terra e da humanidade; Dívida externa, dívida ecológica: construindo alternativas à dominação financeira; e O Fórum Social Mundial policêntrico: futuro do FSM - desenvolvimento e perspectivas das resistências mundiais ao neoliberalismo.
De maneira conjunta, serão realizados outros encontros e fóruns de caráter mundial com as temáticas de saúde, crianças e jovens, autoridades locais, parlamentares, diversidade sexual e educação, como, por exemplo, o VI Fórum Mundial de Educação, que será realizado nos dias 23 e 24, na Universidade Bolivariana de Venezuela.
O VI FSM terminará no dia 29 com a Assembléia Mundial dos Movimentos Sociais na parte da manhã e um ato político, à tarde.
Acompanhe a cobertura especial da Rets em http://fsm2006.rits.org.br.
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