Autor original: Mariana Loiola
Seção original: Novidades do Terceiro Setor
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O descaso do governo pernambucano em relação ao problema da violência contra a mulher levou as integrantes do Fórum de Mulheres de Pernambuco (FMPE) a partir para uma ação ampla que busca dar visibilidade à sua indignação. No dia 31, o FMPE – formado por 67 organizações de mulheres e por feministas autônomas – realizou sua primeira vigília, com a presença de cerca de 700 pessoas. A iniciativa denuncia a falta de políticas de segurança, prevenção e combate à violência contra as mulheres, mobilizando a sociedade pernambucana em torno do tema. Uma vez por mês, militantes do FMPE e de outros movimentos sociais repetirão o ato: partirão da Praça do Diário, vestidas de preto e carregando lampiões e cartazes com os nomes de mulheres assassinadas no estado, até a Praça da República, no centro de Recife.
“Estamos há quatro anos intensificando as ações aqui em Pernambuco. Apresentamos vários dossiês e propostas para o governo. Mas extinguiram-se as tentativas de diálogo. Apesar das nossas tentativas de negociação com o governo, o estado hoje apresenta uma situação de barbárie. Se compararmos os números de 2002 com os de 2006, verificamos um aumento de 100% no índice de assassinatos de mulheres. Por isso as mulheres decidiram ir às ruas”, explica Ana Veloso, uma das coordenadoras do FMPE.
Os dados citados por Ana foram extraídos de estudo do Observatório da Violência contra as Mulheres em Pernambuco, projeto da organização não-governamental SOS Corpo. De acordo com dados da Secretaria de Defesa Social do Estado (SDS), entre os meses de janeiro a agosto de 2005, as quatro delegacias especializadas registraram 185 homicídios de mulheres. Quase 80% das vítimas assassinadas no primeiro semestre de 2005 eram jovens, com idades entre 18 e 30 anos. A partir de matérias veiculadas pela mídia, o Observatório constatou que em janeiro de 2006 ocorreram 37 homicídios de mulheres – em sua maioria, vítimas de seus companheiros ou ex-companheiros. Até o dia 7 de fevereiro, foram contabilizados 44 assassinatos.
Considerando os altos índices de criminalidade no estado de Pernambuco, as mulheres se tornam duplamente vulneráveis, destaca Ana. Conseqüentemente, a violência não é uma ameaça apenas dentro de casa. O número de assassinatos de mulheres em ambientes públicos, segundo a análise do Observatório, tem aumentado consideravelmente no estado.
A Região Metropolitana de Recife concentra a maior parte dos assassinatos. Por outro lado, o índice de violência no interior do estado é altíssimo. “As mulheres do sertão relatam que a violência é naturalizada e invisível no interior do estado. A região canavieira, por exemplo, é marcada por uma cultura patriarcal e machista. Lá as pessoas não se indignam, não há articulação para combater o problema”, diz Ana.
A situação de Pernambuco contrasta com todos os acordo de direitos humanos que o Brasil assinou, lembra Ana: “Este quadro é uma vergonha para Pernambuco. É preciso traçar um conjunto de estratégias em diversas áreas – educação, saúde, geração de renda etc. – para que nós tenhamos a condição de enfrentar essa situação”.
Mobilização
Durante a mobilização para a vigília, o FMPE divulgou uma carta aberta para convocar movimentos sociais e outras organizações da sociedade civil a se juntar a esse movimento de protesto. A carta ressalta a necessidade de cobrar dos governos a responsabilidade constitucional de proteger a vida e manter a segurança da população. Destaca ainda que a ausência de um aparato legal que garanta a responsabilização dos agressores tem favorecido a impunidade e contribuído para que Pernambuco apresente os piores números de violência familiar e doméstica contra mulheres no país.
O FMPE encaminhou a carta à Secretaria Especial de Políticas para Mulheres (SPM), à Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH) e ao Ministério da Justiça, além de um dossiê sobre esses casos para o Sistema Interamericano de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA).
A mobilização do FMPE chamou a atenção da ministra Nilcéia Freire, da SPM, que esteve no dia 7 de fevereiro em Pernambuco, com a finalidade de discutir a situação de violência contra as mulheres e o fortalecimento da rede de atendimento à mulher no estado. Durante a visita, a ministra se reuniu com representantes do governo do estado, da Prefeitura de Recife, do Tribunal de Justiça e do movimento feminista e anunciou a instalação de um Fórum Estadual Permanente pela Segurança da Mulher em Pernambuco. “O apoio do governo federal foi uma reação ao nosso movimento”, enfatiza Ana.
O Fórum Estadual Permanente pela Segurança da Mulher terá o objetivo de elaborar um plano de implementação da Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, além de adotar ações emergenciais como a ampliação e o fortalecimento da rede de atendimento à mulher (delegacias especializadas, centros de referência, defensorias públicas, casas-abrigo etc.) e ações de capacitação dos agentes policiais com enfoque de gênero. "Para isso, o governo federal firmará parcerias com o governo estadual e prefeituras da Região Metropolitana do Recife", afirmou Nilcéa. Outra medida adotada foi a descentralização da Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180 – de âmbito nacional, em regime de colaboração com o governo estadual.
Paralelamente à mobilização em Pernambuco, o FMPE está acompanhando o processo de votação do Projeto de Lei 4.559/04, apresentado pela deputada federal Jandira Feghali (PC do B-RJ), que cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, mas ainda não foi votado. “Se não fizermos uma pressão nacional, esse projeto não vai entrar na pauta de votação”, alerta Ana.
A próxima vigília está marcada para 7 de março, véspera do Dia Internacional da Mulher. Além do evento na capital pernambucana, também estão programadas vigílias nas cidades do interior do estado, com o intuito de criar uma mobilização estadual permanente que estimule a denúncia por parte das mulheres em situação de violência, amplie na sociedade a indignação frente à violência sexista e pressione o governo do estado a efetivar políticas de prevenção e enfrentamento da violência.
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