Autor original: Marcelo Medeiros
Seção original: Os mais interessantes e ativos projetos do Terceiro Setor
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Mas o que significa esse conceito? “É a utilização do talento de cada um para produzir renda através da música. Para isso fazemos do computador mais um instrumento”, explica Leila Marques, coordenadora executiva dessa “cooperativa eletrônica”. Ela explica que o objetivo da Eletrocooperativa não é formar novos músicos, mas aproveitar pessoas que já tenham alguma prática e dar meios para que consigam viver dignamente com esse trabalho. “Nossa base é a potencialização de talentos”, diz.
Para isso há um estúdio na casa que a entidade ocupa, cedida pelo Instituto do Patrimônio Histórico do governo baiano. Nela, algumas máquinas com programas de edição e gravação de áudio baseados em códigos livres e abertos. Na casa da cooperativa, os jovens, selecionados dentro de outros projetos ou grupos soteropolitanos, podem gravar suas produções e mixá-las digitalmente.
O trabalho da organização consiste em três etapas: a primeira é a capacitação dos alunos para que aprendam a utilizar computadores, instrumentos e conheçam teoria musical. Quem ensina a mixar, gravar e produzir digitalmente são monitores do Instituto de Ciência da Computação da Universidade Federal da Bahia. Quando já se sentem seguros para avançar, os alunos entram na segunda etapa, de produção das músicas. Ou seja, é aí que colocam a mão na massa, gravando e mixando. Em seguida, é o momento de difundir suas obras. Para tanto, um novo site está perto de ser concluído [em www.eletrocooperativa.art.net]. Nele as músicas dos alunos estarão disponíveis para download e em streaming [execução imediata] na rádio online que está por vir. Também poderão escrever sobre elas, descrever a cena musical de Salvador, buscar parcerias e muito mais.
A idéia é estimular novos artistas, e também aqueles já consagrados, a oferecer músicas sob licenças do tipo Creative Commons [veja também na área de Links desta página], que permitem o livre uso em remixagens e samplers. “É o que hoje há de mais moderno e sério em termos de licença”, afirma Marques.
Os estilos produzidos são variados: vão da música percussiva ao hip-hop. A decisão cabe aos integrantes do projeto. Assim surgem DJs, produtores musicais, percussionistas, guitarristas etc. Em dois anos e meio, já foram gravados oito discos e formados 500 jovens, a maioria dos quais homens, vindos de 28 bairros populares da capital.
Seleção
No primeiro ano do projeto, a seleção era feita com base em indicações de diretores de blocos afro e na condição social do jovem. Depois, com mais estrutura, à escolha foi adicionada a indicação de ONGs que trabalhassem com infância e adolescência. E agora há também provas de aptidão, pois a demanda está muito grande.
Um exemplo é Vilson dos Santos, de 25 anos e morador da Baixa do Sapateiro, em Salvador. Há pouco tempo, ele fazia parte de uma banda de reggae na qual não via futuro. Largou o grupo e passou a integrar o Suingue do Pelô, outra banda local que ensaiava perto da sede da Eletrocooperativa. Um amigo lhe explicou como funcionava o projeto e o incentivou a se inscrever para o processo seletivo. “Queria tentar algo novo, aprender mais”, lembra.
Vilson entrou no processo seletivo, que consistia apenas na análise de uma ficha sócio-econômica do candidato e na indicação, e foi escolhido para aprimorar seu dom de tecladista. “Gostei das aulas, principalmente as de computador”, afirma. Vilson, agora, já é monitor de outras turmas, que chegam a ter até 15 alunos aprendendo técnicas de estúdio. Ele garante que as aulas foram de grande valia, pois, além do emprego como monitor, já foi chamado para participar de gravações em outros estúdios.
Novos rumos
A saga de Vilson “Capivara”, como o jovem é conhecido no projeto, se deve ao trabalho do administrador de empresas Reinaldo Filho, fundador da Eletrocooperativa. Ex-executivo da Microsoft e músico, em 2003 ele decidiu dar novo rumo à sua vida. Largou o emprego na multinacional e decidiu pôr em prática uma antiga idéia, que unia duas paixões – a informática e a música.
O baiano voltou a Salvador e fundou a cooperativa. “Sou encantado pela idéia de colaboração”, diz. Essa é uma das razões da adoção de softwares livres nas capacitações, para não falar na questão política e econômica. A cooperação também está presente nas produções musicais da Eletrocooperativa.
Apesar da característica pouco comum do novo projeto, Filho quis focá-lo numa faixa etária também pouco lembrada em outros programas sociais: jovens adultos. “Precisamos nos preocupar não só com quem mata e morre, mas também com quem fica”, lembra. Para o coordenador, a maioria dos projetos sociais atende apenas pessoas com menos de 18 anos, deixando de lado quem já é adulto e faz parte de um dos grupos sociais mais atingidos pela violência urbana.
Para esses jovens, acredita, a velocidade de produção é muito importante. Por isso decidiu utilizar computadores e também distribuir música pela internet. Assim, garante, haverá mais trocas entre compositores e músicos e mais produção. Os mesmos jovens, além das aulas de música e informática, têm oficinas de cidadania e são convidados a participar de sessões com psicólogos. De acordo com os coordenadores, esse trabalho melhora sua auto-estima e também os estimula a ter uma vida mais responsável.
A prioridade da Eletrocooperativa no momento é deixar o novo site pronto e torná-lo uma referência de troca musical em Salvador. Daí em diante, a intenção é fazer com que a idéia seja replicada em outras cidades. “Quero ser copiado”, diz Reinaldo Filho.
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