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Ameaça concreta

Autor original: Fausto Rêgo

Seção original: Notícias exclusivas para a Rets

O sanitarista e epidemiologista Pedro Chequer foi coordenador do Programa Nacional de DST/Aids de 1996 a 2000 e hoje é representante no Cone Sul da Unaids, órgão da Organização das Nações Unidas que se dedica ao controle da doença. Nesta entrevista exclusiva, concedida por correio eletrônico, ele fala sobre as expectativas em relação ao que pode ser deliberado sobre esse tema na assembléia da Organização Mundial de Saúde. Para Chequer, a aids – cujo primeiro diagnóstico foi confirmado há 25 anos – não deve ser vista como um problemas isolado de saúde, mas sim como uma ameaça concreta ao equilíbrio social e econômico de todos os países.

Rets - A pesquisa sobre HIV/aids é uma das que mais recebem dinheiro no mundo. O senhor acredita que, considerando o impacto causado pela doença, esses recursos são suficientes?

Pedro Chequer - Não são suficientes, principalmente se consideramos a área de vacina e microbicidas, que já poderia ter resultados muito mais avançados se recursos adicionais houvessem sido alocados.

Rets - Os países com mais acesso a tratamentos adequados contra a aids não são os que têm a maior incidência da doença. É possível reverter esse quadro?

Pedro Chequer - Sim, é possível, desde que se estabeleça uma política que corresponda à necessidade do pais, que considere a evidência científica como referencial técnico e que promova de modo integrado assistência, tratamento e prevenção. A abordagem multidisciplinar e multi-setorial também é aspecto fundamental a ser considerado. Intervenções de fundamentação ideológica, religiosa ou com base em princípios morais como a que vem desenvolvendo o governo americano recentemente representam uma verdadeira ameaça a essa meta.

Rets - O senhor acredita que a OMS poderia ter uma postura mais ativa em relação à assistência a países que vêm sendo dizimados pela doença?

Pedro Chequer - Não apenas a OMS, mas todo o sistema ONU, principalmente o Banco Mundial/FMI e os governos dos países desenvolvidos. Aids tem que ser vista não como um problemas isolado de saúde, mas como uma ameaça concreta ao equilíbrio social e econômico dos países afetados e, conseqüentemente, dos demais países, mesmo aqueles de baixa prevalência.

Rets - É possível fazer com que organismos internacionais e Estados se mobilizem mais para tentar fazer com que as pesquisas sobre as doenças dos países pobres fiquem menos reféns do (des)interesse dos grandes laboratórios?

Pedro Chequer - Sem qualquer dúvida! A presença do Estado é essencial nessa área, com o objetivo de orientar prioridades e alocar recursos financeiros, bem como orientar a alocação de recursos para o desenvolvimento de novas tecnologias e, acima de tudo, para não ficar refém de companhias privadas que apenas visam ao lucro.

Rets - Muito se tem falado sobre pesquisa e desenvolvimento no âmbito da OMS. O senhor acredita que é possível envolver os países pobres e mais afetados no processo de pesquisa e produção dessas drogas?

Pedro Chequer - Sem dúvida! Entretanto devemos considerar o atual estágio de cada país com vistas ao melhoramento da capacidade quando necessário e ao aproveitamento adequado da capacidade técnica e tecnológica daqueles que já apresentam algum nível de desenvolvimento científico.

Luísa Gockel

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