Autor original: Fausto Rêgo
Seção original: Artigos de opinião
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Desde o escândalo dos Anões do Orçamento (1993/94), que culminou na instalação de uma Comissão Parlamentar Mista de Investigação (CPMI) e na cassação do mandato de diversos parlamentares, existe um clamor público pela necessidade de haver regras e procedimentos mais transparentes para a aprovação, o acompanhamento e a fiscalização das contas públicas. Qualquer iniciativa, inclusive as recomendações feitas pela referida CPMI de 1993/94, sempre esbarrou na relutância e no espírito de corpo da maioria dos deputados e senadores que resistem em efetivar mudanças que possibilitem o controle social, a transparência e a democratização do processo orçamentário. Não está sendo diferente agora, com a proposta da Comissão Especial, integrada por três deputados e três senadores, para propor modificações na Resolução nº 1/2001, que define as regras de funcionamento da Comissão Mista de Orçamentos, Planos e Fiscalização (CMO).
A constituição da Comissão Especial foi conseqüência de novas denúncias contra parlamentares acusados de participar de um esquema de compra de ambulâncias superfaturadas. O Parlamento também respondeu com a criação da “CMPI dos Sanguessugas” para investigar as denúncias e o envolvimento de parlamentares. A CPMI, pela visibilidade que consegue junto à mídia, terá a atenção de deputados e senadores. Já a proposta de reforma orçamentária vem sendo relegada e corre o risco de ser engavetada por falta de acordo. Um dos pontos sem acordo é justamente o que trata da democratização do processo orçamentário, tanto internamente ao Congresso como em relação à sociedade, muito aquém da democratização, do controle social e da transparência demandados pela sociedade.
A comissão propõe reduzir a atual composição da CMO de 84 para 40 integrantes, sendo 30 deputados e 10 senadores. Ainda que essa mudança possa dar maior agilidade à votação do orçamento, há resistências porque altera o poder interno do Congresso Nacional, reduzindo a influência de determinados grupos.
Outra resistência diz respeito às emendas individuais que têm sido utilizadas como negociatas com recursos públicos e utilizadas como moeda de troca quando o Executivo quer pressionar o Congresso nas votações de seu interesse. A comissão não propõe sua extinção – o que seria o desejável – e ainda aumenta a cota de 20 para 25 emendas. O nó está no fato de o parlamentar não poder mais fazer emendas genéricas, tendo que identificar quem são os beneficiários.
A criação de um relator específico para a receita nos processos de tramitação do Plano Plurianual (PPA), da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e da Lei Orçamentária Anual (LOA) é uma das boas novidades. A este relator caberá avaliar a estimativa de receita por meio de um relatório próprio. Reavaliações de receita só poderão ser realizadas uma única vez após sua aprovação.
Na prática, isso implica dividir a apreciação do orçamento em dois momentos: a fase da receita e a fase da despesa. Essa inovação contribui também para diminuir a pressão sobre o relator-geral, retirando dele a possibilidade de mudar a estimativa de receita para o atendimento de demandas de última hora.
Também é proposta a criação de dois novos comitês: de Avaliação, Fiscalização e Controle da Execução Orçamentária e de Avaliação de Receita. Essas iniciativas conferem maior transparência ao processo orçamentário e colocam o Parlamento diante da responsabilidade de aprovar as contas federais e acompanhar sua execução, fiscalizar os gastos e divulgá-los. Nesse ponto, um importante avanço é a determinação de que entidades privadas que recebem recursos de emendas parlamentares passem a ser identificadas pelo endereço, pelo nome dos sócios e da direção, além de explicitadas as metas a serem atingidas.
Embora reconheçamos que há avanços na proposta que se encontra na pauta do Congresso Nacional, acreditamos que uma solução de longo prazo deve ser conduzida no âmbito de uma ampla reforma do sistema político, que contribua para o fortalecimento da democracia representativa, e com a instalação de mecanismos de democracia participativa e direta. Um maior envolvimento do Poder Executivo nesse debate e na efetiva aprovação de uma Lei de Finanças Públicas – nunca votada, apesar de haver previsão constitucional para tanto – é necessário. A ausência dessa lei é um dos motivos de o processo orçamentário previsto pela Constituição de 1988 nunca ter sido plenamente consolidado.
O calendário eleitoral não é aliado nesse processo e pode ocasionar no arquivamento das limitadas propostas da comissão. Mas cabe à sociedade brasileira entender que este é o momento para pressionar aqueles que buscam se eleger e exigir que seus mandatos sejam de fato instrumentos para representar os anseios da sociedade brasileira por mais transparência na gestão publica, acesso às informações e, principalmente, que os escândalos com o orçamento publico não se repitam mais em nosso país.
* José Antônio Moroni é membro do Colegiado de Gestão do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), em www.inesc.org.br, e diretor de Relações Institucionais da Associação Brasileira de ONGs (Abong), em www.abong.org.br.
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