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Vida nova aos 60

Autor original: Joana Moscatelli

Seção original: Os mais interessantes e ativos projetos do Terceiro Setor






Onde a vida começa aos 60
Divulgação

O envelhecimento da população brasileira é cada vez mais visível. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2000, existiam no Brasil cerca de 15 milhões de pessoas com 60 anos ou mais, o que corresponde a 8,6% da população. Desse número, 8,9 milhões eram mulheres, que tendem a ter menos anos de estudo que os homens. 

E é exatamente através da educação que o Grupo Aurora da Vida busca dar um novo sentido à vida de mulheres idosas do bairro José Pinheiro, em Campina Grande (PB). O projeto funciona desde 2000 e oferece atividades ligadas a ecologia, arte e cultura. O ponto de partida foi um evento ecumênico realizado em Campina Grande, o Encontro da Nova Consciência, que teve como um dos seus temas a qualidade de vida na terceira idade. Durante o evento, a ausência de idosos do bairro José Pinheiro chamou a atenção dos seus moradores, que entraram em contato com a professora Maria de Fátima Ferreira, da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB). Com apoio da universidade e da Secretaria Municipal de Assistência Social, Maria de Fátima começou a fazer visitas à comunidade, convidando pessoas para formarem um grupo de convivência.

A partir do levantamento da situação no bairro, constatou-se que havia uma segregação das pessoas idosas, principalmente as mulheres. Assim, mais de 50 moradoras passaram a freqüentar o grupo, almejando encontrar nesse espaço a oportunidade de conviver com outras pessoas, trocar conhecimentos, voltar à escola, tentar superar o medo da solidão, ocupar o tempo livre e melhorar a qualidade de vida.

Dona Irene, de 71 anos, se diz muito mais feliz hoje e se sente uma pessoa mais digna diante da sociedade. Alfabetizada pelo projeto, Dona Irene contou que, quando criança, só lhe era permitido estudar duas vezes por semana: “Passei minha infância ajudando meus pais, depois casei e tive sete filhos. Não tive mais tempo para pensar em estudar. Hoje sou muito mais feliz, porque tenho tempo para o meu lazer. Vivia cansada e só tinha tempo para criar meus filhos. Depois de assistir às primeiras reuniões do Aurora, passei a ser mais feliz e participar de festas, passeios... É realmente muito bom! Hoje, com certeza, sou mais feliz e me sinto mais digna na sociedade, não sinto mais vergonha de mim mesma”.

Atualmente, o Grupo, que recebeu apoio do Fundo Ângela Borba em 2003, está ligado ao Programa Conviver do Idoso, da Secretaria Municipal de Assistência Social de Campina Grande, e é parte integrante da Política Nacional de Atendimento ao Idoso (lei nº 8.842, de 1994), que estabeleceu que é dever da família, da sociedade e do Estado garantir o direito do idoso à participação na comunidade. Mas só em 2003, com a aprovação do Estatuto do Idoso, foram instituídas penas mais severas para quem desrespeitasse ou abandonasse cidadãos da terceira idade.

Entre as atividades já realizadas pelo projeto estão cursos de alfabetização que já formaram cerca de 50 mulheres. O objetivo do Grupo Aurora de Vida é possibilitar o acesso das idosas ao sistema educacional, desenvolver sua consciência crítica e incentivar a continuidade dos estudos. O projeto já está na quarta turma, com mulheres de 60 a 84 anos. No começo, conta Fátima, 90% das idosas não sabiam assinar seu nome, mas hoje algumas já escrevem até poesias.

Além das práticas educativas, o Grupo Aurora da Vida realiza atividades culturais que visam à socialização das mulheres, evitando a solidão e fortalecendo a auto-estima de cada uma. Durante esses encontros, que são realizados semanalmente, procura-se abordar o próprio processo de envelhecimento. Maria de Fátima explica que toda a programação do Grupo é planejada pela equipe de estagiárias de Serviço Social da UEPB, com ajuda das próprias idosas. São realizadas peças teatrais, grupos de cânticos, oficinas de arte e muitos outros trabalhos manuais e artesanais.

Também são organizados passeios turísticos que buscam proporcionar momentos saudáveis para essas mulheres. Segundo Fátima, a maioria delas não teve oportunidade de participar da vida social por falta de condições econômicas ou por terem que se dedicar somente aos filhos e maridos.

Hoje, uma das principais demandas do Grupo é ter recursos para oferecer bolsas para os alunos da universidade que participam do projeto. Segundo Fátima, os alunos e os voluntários são fundamentais para a sobrevivência do projeto.

Além disso, a falta de uma sede própria e de recursos estruturais também dificulta o trabalho. “Mas não impossibilita”, ela faz questão de ressaltar. A educação, afirma, é um direito que pode melhorar a qualidade de vida dessas mulheres, oferecendo-lhes mais auto-estima e desenvoltura na vida. "Como é um projeto ligado à universidade, são realizadas também pesquisas e estudos sobre o tema. O Aurora da Vida funciona como um laboratório de experiências", acrescenta Maria de Fátima, que enxerga no projeto uma opção de lazer, convivência e aprendizado coletivo.


Joana Moscatelli

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