Autor original: Marcelo Medeiros
Seção original: Notícias exclusivas para a Rets
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Apesar de ainda não ter um caráter definitivo, o PAS já tem sido posto em prática em diversos programas do governo federal. Entre eles, projetos polêmicos como a pavimentação da rodovia BR-163, que liga as cidades de Cuiabá, no Mato Grosso, e Santarém, no Pará, pelo meio da floresta amazônica. A idéia do governo sempre foi coletar opiniões, muitas vezes antagônicas, antes de iniciar obras consideradas essenciais para o desenvolvimento do país. Assim, procurou agradar tanto desenvolvimentistas quanto ambientalistas. “Buscamos sempre avançar em direção ao consenso. É muito difícil, mas às vezes acontece”, afirma Júlio Miragaya, gerente de Planejamento Territorial do Ministério da Integração, pasta responsável pela coordenação dos trabalhos do PAS. Miragaya foi um dos responsáveis pela redação do texto enviado para consulta, o mesmo que diversas organizações não governamentais receberam para fazerem seus comentários.
A opinião é compartilhada por José Arnaldo Oliveira, diretor do Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), para quem a idéia de consultar a sociedade civil foi boa, mas nem sempre obteve o resultado esperado. “O PAS é uma tentativa de consenso, uma grande idéia que gerou bons frutos em alguns pontos e em outros, não. Mas foi um avanço no planejamento das ações governamentais na Amazônia”. O GTA, como uma rede, participou de diversas consultas do PAS.
Já a secretária de Coordenação da Amazônia do Ministério do Meio Ambiente, Muriel Saragoussi, afirma que o plano sempre foi pensado não como uma queda de braço entre diferentes setores, mas como “a busca por soluções que o Brasil precisa e merece”.
Apesar das críticas e de reconhecer que houve problemas, Miragaya cita uma lista de projetos nos quais ambos os lados saíram satisfeitos depois de cederem um pouco. No caso do asfaltamento da BR-163, considerado uma obra essencial para a região pelo governo, foi tomada uma série de medidas preventivas para evitar o impacto negativo da pavimentação dos 1.765 quilômetros que ligam Cuiabá, no Mato Grosso, a Santarém, no Pará.
As medidas foram decididas após 15 consultas realizadas em 2004 e 2005. Entre as iniciativas planejadas e já postas em prática estão o ordenamento fundiário, o fomento de atividades sustentáveis nos 73 municípios atravessados pela rodovia e a melhoria dos serviços públicos.
O mesmo procedimento foi tomado em outras rodovias, como a BR-319 (Manaus-Porto Velho), cuja obra havia sido embargada pelo Ministério Público Federal em julho do ano passado por descumprimento da legislação ambiental. A última consulta pública sobre as obras nessa rodovia foi realizada no dia 28 de julho, em Beruri (AM). Para compensar o asfaltamento da estrada, processo que atrai migrantes e estimula a ocupação de terra ao redor, o governo pretende criar diversas áreas de proteção. São elas a Reservas Extrativistas de Ituxi e Médio Purus, a Reserva de Desenvolvimento Sustentável Estadual do Igapó-Açu, as Florestas Nacionais de Tapauá e Iquiri, a Floresta Nacional ou Estadual de Beruri, os Parques Nacionais do Umari, Coari e Jari, além da ampliação da Floresta Nacional de Balata-Tufari ou a criação de uma Reserva Extrativista.
Problemas
Para Arnaldo Oliveira, esse tipo de procedimento é um exemplo positivo da ação governamental, mas que ainda precisa de correções. “Houve um plano intenso de controle de desmatamento, a criação de mais unidades de conservação e a contratação de fiscais de controle. Porém ainda restam muitos conflitos de projetos e propósitos até mesmo dentro do governo”, analisa.
O diretor do GTA se refere a trocas de farpas registradas ao longo da atual gestão do Executivo. Em diversos momentos, o Ministério do Meio Ambiente criticou programas de outras pastas, principalmente da Agricultura e da Fazenda, por acreditar que eles em nada contribuiriam para a preservação da Amazônia. Pelo contrário, apenas estimulariam a ocupação ilegal de terras e o desmatamento.
E os desenvolvimentistas por vezes afirmaram que as exigências ambientais estariam atrasando a melhoria econômica da região. O MMA, na maioria das vezes, perdeu as batalhas, apesar de afirmar constantemente que suas reivindicações vêm sendo atendidas. “O MMA é periférico no governo. Nossa questão é saber como influenciar o ‘núcleo duro’”, diz Oliveira.
Saragoussi discorda e afirma que, como em toda família, dentro do governo também há discordâncias. E coloca parte da culpa na mídia: “Essa é uma briga que vem mais de fora do que de dentro. Discutimos sempre para chegar a uma posição equilibrada”, pondera.
Miragaya concorda e alega que, com o PAS, a discussão mudou de foco. “A polêmica deixou de ser em relação a fazer ou não a obra para se tornar 'como fazer'”. Segundo o secretário do Ministério da Integração Nacional, apesar de o governo ainda não ter feito uma avaliação oficial do processo de consulta do Plano Amazônia Sustentável, há um sentimento de que a iniciativa foi bem recebida. “Isso apesar de ter acontecido num período ruim para conhecer melhor a opinião das pessoas. A proximidade das eleições afetou bastante o processo”, lamenta.
A secretária do MMA afirma que o pleito apenas diminuiu o tempo disponível para discussões, para evitar manipulações dos debates e tentativas de promoção política. Porém diz que o processo consultivo não aconteceu com tranqüilidade devido à intransigência de alguns setores. “Não precisamos chegar a consensos, mas ter bom senso e respeitar a legislação”, critica.
Saragoussi dá como exemplo as discussões em torno da pecuária na Amazônia. De acordo com ela, alguns – poucos, ressalta – grupos não têm trabalhado com “visão de conjunto”. Isso os teria levado a pedir a proibição completa da presença de gado na região, deixando de lado famílias que criam bovinos para sua própria alimentação. “Estão, literalmente, querendo tirar o leite das crianças”, ironiza. Para ela, a pecuária extensiva deve mesmo ser vetada, porém, se o agricultor respeitar a legislação ambiental, que permite o desmatamento de 20% da propriedade, não há problemas com a criação de gado.
Apesar das críticas, ela classifica a participação de ONGs e movimentos sociais como “muito qualificada”, mesmo com pouco tempo para o debate. A brevidade das discussões foi contornada com a extensão do prazo para envio de contribuições para mais de um mês em todas as consultas realizadas.
O PAS
O PAS foi criado em 2003 e reuniu não só diferentes áreas do governo federal e ONGs, como também os governadores dos nove estados que compõem a Amazônia Legal (Amazonas, Pará, Tocantins, Rondônia, Roraima, Acre, Mato Grosso, Amapá e Maranhão). Sua semente estava no relatório “Amazônia Sustentável: diretrizes e prioridades do Ministério do Meio Ambiente para o desenvolvimento sustentável da Amazônia brasileira”, apresentado como base para o Plano Plurianual 2004-2007. Lá já estavam as seis diretrizes do PAS: ordenamento territorial, diminuição do desmatamento ilegal ao transformar a estrutura produtiva, capacitação tecnológica de setores tradicionais, estímulo ao desenvolvimento com equidade, estímulo à cooperação entre estados e fortalecimento da sociedade civil.
A secretaria executiva do PAS ficou a cargo do MMA e a coordenação foi entregue ao Ministério da Integração Nacional. Foram criados diferentes grupos de trabalho, que procuraram chegar a um consenso em diferentes assuntos, para depois levar a posição do governo para a sociedade civil opinar antes da implementação de fato das idéias.
O Plano traz um vasto diagnóstico econômico e social da região amazônica, desde a infra-estrutura de comunicações até as atividades econômicas tradicionais e novas, passando pela geografia e cultura local. Para aproveitar todo o potencial da região, o governo assume ser melhor descentralizar a política de desenvolvimento – forma contrária à adotada até agora. “Já está suficientemente demonstrado que a descentralização de políticas reduz custos, além de aumentar a transparência e o controle social”, afirma o resumo executivo do PAS (veja a íntegra no link ao lado).
Foram, então, criadas câmara setoriais (que reúnem diferentes atores econômicos) e fóruns territoriais cujo objetivo é organizar o desenvolvimento de um território, como no caso da BR-163. As atividades foram separadas em cinco eixos temáticos relacionados ao desenvolvimento amazônico: gestão ambiental, novas formas de financiamento, inclusão social e cidadania, produção sustentável com competitividade, gestão ambiental e ordenamento territorial.
Sua idéia é garantir não apenas a implementação de áreas de proteção, mas também o aproveitamento racional das demais terras. “O problema principal de segregar áreas protegidas das produtivas é que se sugere que tudo é permitido nas áreas não protegidas e que nada é permitido nas Unidades de Conservação, o que não reflete a realidade, sobretudo nas áreas destinadas ao uso sustentável”, afirma o Plano. Daí a escolha pelo desenvolvimento sustentável das Unidades de Conservação e mesmo do seu entorno.
Dado o detalhamento do PAS, ele servirá de base para o próximo Plano Plurianual, para o período de 2007 a 2010. Miragaya acredita que as últimas contribuições feitas mudarão pouco o texto final, já que foram elaboradas em meio a discussões com representantes do governo. O MMA mantém um acordo com o Ministério do Planejamento para que o PAS seja referência para o PPA, sem modificações em seu conteúdo.
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