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Vossas Excelências

Autor original: Joana Moscatelli

Seção original: Novidades do Terceiro Setor






Vossas Excelências


Manipulação de licitações, pagamento de propina, prevaricação e tráfico de influência ... Essas são algumas das práticas ilegais que fazem parte do currículo de certos candidatos a deputado federal nas eleições 2006. Já conhecidas pela população brasileira - que assiste todos os dias pelos telejornais a denúncias do tipo -, essas práticas, em sua maioria, acabam sem punição devida, inclusive por parte dos eleitores que, ignorantes de muitas das acusações, acabam votando nos mesmos políticos que tanto criticam. É para tentar melhorar essa situação que a Transparência Brasil acaba de lançar o portal Excelências. Como afirma seu coordenador, Marcelo Soares, informação é poder, e torná-la facilmente acessível o democratiza. "Tendo informação sobre o exercício do poder, os cidadãos podem fiscalizá-lo e, até certo ponto, tentar fazer com que ele seja melhor exercido”, defende Soares.

A proposta do Excelências vem, então, ao encontro dessa necessidade e busca apresentar de forma simples e atraente todas as informações públicas referentes aos candidatos à Câmara nas eleições de outubro. No site, há dados sobre a atuação dos políticos - faltas, votações, uso de verbas de gabinete, emendas ao orçamento apresentadas nos últimos anos - além da declaração de bens apresentada à Justiça Federal, os nomes dos doadores de suas campanhas, referências de processos judiciais existentes contra o candidato assim como notícias de jornais que o associem a algum caso de corrupção (desde que divulguem aquilo que está comprovado nos tribunais).

Segundo o coordenador, apesar de existirem muitas informações públicas a respeito do Legislativo brasileiro, a população ainda tem dificuldade de acessá-las, seja pela complexidade com que são apresentadas ou pela própria falta de educação e cultura política. “O brasileiro, em média, trabalha muito mal com a informação - tem aí a questão do acesso e a questão da educação. Política é um assunto que costuma ser visto como chato. O voto é obrigatório. A cobertura da imprensa é majoritariamente declaratória, ou seja, se concentra mais nos adjetivos imputados por alguns políticos a outros do que no que eles fazem quando não estão se xingando. Tudo isso ajuda a afastar as pessoas da política”, comenta Soares.

O novo portal da Transparência Brasil, que atua desde 2000 buscando democratizar e facilitar o acesso às informações públicas no país, foi lançado há poucos dias. A idéia inicial era organizar o perfil dos candidatos à reeleição, mas logo se percebeu a necessidade de incluir políticos como o ex-governador Paulo Maluf, o ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta e o ex-ministro Antonio Palocci, todos famosos no noticiário brasileiro pelas denúncias de corrupção. Assim, o portal conta hoje com perfis de candidatos postulantes à reeleição e ex-governadores, ex-ministros, ex-senadores e ex-prefeitos de capitais que estejam concorrendo à Câmara.

Segundo Soares, essa mudança tem um motivo importante: ex-autoridades costumam ser muito processadas e, uma vez eleitos deputados, passam a contar com foro privilegiado na Justiça. “Ou seja, as ações que correm contra eles sobem para o Supremo Tribunal Federal. Dar essa informação ao eleitor é importante para que ele pese o valor de seu voto’, explica o coordenador. Ao mesmo tempo, ele acha que deve ser estimulada na população a demanda por informações desse tipo, seja através da imprensa ou de sites como o Excelências. No entanto, Soares destaca que a questão da formação vem de casa e da escola e vai além, acrescentando que é preciso estimular uma cultura de uso inteligente da informação.

De acordo com os cálculos de Soares, a média de visitas no site tem sido de em torno de 100 mil por dia. Os três políticos mais procurados até agora foram Antonio Palocci (PT-SP), Paulo Maluf (PP-SP) e Aldo Rebelo (PC do B- SP). Logo atrás, estão o deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (PFL-BA), a deputada Ângela Guadagnin (PT-SP), Enéas (Prona-SP) e Celso Pitta (PTB-SP). No lançamento do portal, o site contava com 150 perfis de candidatos de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, que são os três principais colégios eleitorais do país. Mas, até o fim de agosto, serão introduzidos dados de candidatos de um estado por dia, em média. Os deputados que desejam incluir seu histórico ou manifestações próprias no site podem enviá-los para perfil@transparencia.org.br, mas devem informar um telefone de contato.

Soares diz que foram poucos os candidatos que se manifestaram de forma negativa ao novo serviço. “Geralmente corrigem informações erradas - as quais aceitamos na hora - ou tentam minimizar a importância de alguma informação correta - alteração que normalmente não aceitamos. Uma deputada escreveu solicitando a retirada de seu CPF, visto que não incluímos os de alguns colegas. Respondemos que na verdade o que faremos será incluir esses CPFs que faltam. O CPF é o único documento uniforme para todos os brasileiros e ele permite saber se um deputado - que é alguém que tem o poder de votar aumentos nos impostos que cobram da gente - está em falta com os seus impostos”.

A expectativa é que cada vez mais pessoas acessem o site e divulguem as informações que leram ali. “Da forma como fizemos - um perfil abrangente dos candidatos - um dos nossos estagiários brincou dizendo que parecia um orkut dos deputados. Acabou ficando popular. Outro dia, um taxista indicou o site a um jornalista amigo nosso”, conta Soares.

Ele espera que as informações que constam no site sirvam para que o eleitor contraponha o discurso do candidato com as informações públicas a seu respeito, tornando-se, assim, um eleitor melhor informado. Mas, acrescenta que “é importante que a vigilância do eleitor sobre como os políticos usam o poder - um cheque em branco dado pelo voto - não se restrinja a anos eleitorais ou CPIs”. Ele acha que se mais cidadãos procurarem usar as informações disponíveis, e os políticos se derem conta de que estão sendo vigiados, há a possibilidade de o poder ser exercido com maior responsabilidade.


Joana Moscatelli

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