Autor original: Marcelo Medeiros
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Antecipando-se ao bloqueio, as organizações que fazem parte da Chamada Global contra a Pobreza, movimento mundial a favor de uma melhor distribuição de renda ao redor do planeta e de um comércio mais justo, lançaram o Mês da Mobilização Internacional. Serão 30 dias – de 16 de setembro, quando começou a reunião das instituições financeiras, a 17 de outubro, Dia Internacional pela Erradicação da Pobreza – de manifestações contra a desigualdade mundial.
A Chamada Global contra a Pobreza é uma aliança de organizações da sociedade civil de 112 países. Pede mais transparência das instituições multilaterais, comércio justo, cancelamento de dívidas e mais e melhor ajuda internacional. A iniciativa ficou famosa no ano passado, quando a campanha – simbolizada por uma faixa branca – foi lançada mundialmente, com grandes protestos e shows históricos realizados em diversos países europeus. A campanha conta com o apoio de personalidades como o vocalista da banda irlandesa U2, Bono Vox.
Apesar da publicidade, manifestantes não conseguiram chegar perto do prédio onde a reunião das instituições financeiras aconteceria. Alegando ações preventivas contra atos terroristas, o governo de Cingapura isolou os manifestantes em uma área distante. Qualquer manifestação teria que ser realizada naquele espaço de oito metros quadrados, cercado de policiais. Antes mesmo do primeiro dia de evento, 22 pessoas foram detidas para “averiguação”, todas elas ligadas a ONGs. Entre elas, uma brasileira, chefe da delegação da ActionAid. A economista Maria Clara Soares ficou detida no aeroporto por 30 horas, antes de ser deportada de volta para o Brasil.
A atitude do governo de Cingapura levou as organizações a boicotar a reunião que teriam com representantes do Banco Mundial e do FMI e a reforçar os debates do Fórum do Povo Mundial, realizado em Batam, Indonésia, a poucas horas de Cingapura. As financeiras haviam organizado o Fórum da Sociedade Civil, para o qual mais de 500 representas de ONGs haviam sido credenciados para fazer parte de 40 sessões de debate. Tanto o FMI quanto o Banco Mundial afirmaram, em comunicado, que não apoiaram as medidas do governo de Cingapura. Fora do país, os ativistas expuseram sua pauta de reivindicações, perpassando várias áreas.
A principal delas referia-se à reforma pela qual passa o FMI. Todas as organizações pedem que seja dado mais poder aos países em desenvolvimento, seus principais devedores. O Fundo afirma que as mudanças são feitas para equilibrar a contribuição de cada nação à economia mundial com a quantidade de votos a que cada país tem direito.
“Para superar os desafios globais, precisamos ter certeza de que a voz e a representatividade dos membros são apropriadas e de que o sistema que determina a governança do Fundo é o mais transparente possível”, afirmou o presidente da instituição, Rodrigo Rato. A princípio, quatro países ganharam mais cotas de participação: China, México, Turquia e Coréia do Sul. Outros podem receber mais poder ao longo da reforma, que vai durar dois anos.
“Se o FMI quer resgatar sua credibilidade, então precisa parar de fazer remendos e realizar reformas profundas. De outra forma, os países devedores continuarão a votar em protesto”, critica Eric Gutierrez, Coordenador de Políticas da ActionAid Internacional. A ONG, com sede em Londres, afirma que as condições impostas pelo Fundo para conceder empréstimos a países em desenvolvimento impedem a melhoria de seus sistemas educacionais e de saúde, prejudicando a vida de milhares de pessoas. E isso aconteceria pela força que os países ricos possuem no sistema de votação, o que impede a reversão do quadro. Os EUA possuem 17% dos votos no conselho do FMI, ao passo que 25 países africanos têm apenas 1,4%. Cada membro do Fundo possui 250 votos mais um por cada cem mil “Special Drawing Rights”, espécie de moeda utilizada pela instituição para equiparar o valor de cada contribuinte. Ela é baseada numa cesta de moedas internacionais utilizadas em grandes transações internacionais.
“As reformas endossadas pelo nosso comitê executivo mostram que o espírito de cooperação internacional está vivo e bem no FMI. Ainda há muito a ser feito, mas esse é um começo muito importante e positivo”, declarou Rato.
Em relação ao Banco Mundial, as principais críticas foram direcionadas à campanha anticorrupção que será levada adiante pela instituição. A iniciativa pretende promover boas práticas de governança nos países em desenvolvimento, pois, o desvio de dinheiro público e seu mau uso seriam fatores de atraso para o alcance das metas do milênio. Há ainda promessas de levar em conta as especificidades de cada país no momento de conceder empréstimos e financiamentos, o barateamento do dinheiro emprestado e até a melhoria da sinergia entre os braços da instituição. “O comitê [do banco] enfatizou que previsibilidade, transparência, consistência e tratamento igual a todos os países-membros são e devem ser princípios-guia”, declarou, em discurso Alberto Carrasquilla, chefe do Comitê de Desenvolvimento do banco.
Para as ONGs da Chamada Global contra a Pobreza, as medidas propostas pelo Banco Mundial são ótimas e necessárias. O problema é quem as propõe. “O Banco Mundial é claramente antidemocrático em suas ações e não é voltado para o alívio da pobreza, mas sim para o das corporações”, afirma, em comunicado, o Movimento pelo Desenvolvimento Mundial, ONG britânica impedida de participar das manifestações e reuniões do encontro pelo governo de Cingapura.
Para a organização, é preciso reinventar o financiamento internacional, para que ele se torne realmente efetivo. Entre as reformas pedidas, maior participação dos países em desenvolvimento nas políticas internas da instituição, mais doações e menos condições de concessão de empréstimos.
As mudanças nas instituições financeiras internacionais devem acontecer de forma gradual ao longo dos anos. A próxima reunião acontece em 2007.
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