Autor original: Mariana Loiola
Seção original: Notícias exclusivas para a Rets
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Bandeira das mais levantadas em discursos de campanhas eleitorais, a educação de qualidade para todos tem sido fortemente debatida, nos últimos meses, sob uma perspectiva ainda pouco conhecida pela população em geral. Especialistas na área defendem a educação integral como alternativa para melhorar os índices de educação no país e buscam difundir o aprofundamento do assunto na sociedade.
Após dez anos de promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), o tema da adoção de um sistema educacional integral pelas escolas brasileiras (previsto no artigo 87 da lei) está de volta à pauta política, destaca a pedagoga Isa Guará, assessora do Centro de Educação de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec). Segunda ela, o debate ressurge, principalmente, por duas razões. A primeira é a indicação legal, pelo Plano Nacional de Educação, de que as escolas do ensino fundamental deverão adotar o regime em tempo integral até 2007. A segunda se refere a uma demanda social: “As classes média e alta têm tentado dar conta da formação integral dos seus filhos matriculando-os em aulas complementares. Mas as crianças de escola pública só podem ter essa perspectiva se houver extensão do tempo na escola e a oferta de atividades por organizações sociais”.
Apesar do aumento do interesse pelo tema, algumas visões difundidas na sociedade sobre educação integral são equivocadas, alertam os especialistas. As confusões acontecem na interpretação tanto do conceito quanto do propósito desse sistema educacional.
Além da sala de aula
Normalmente confundido com a simples ampliação da carga horária, o conceito de educação integral é muito mais amplo, ressaltam os educadores. A extensão da jornada escolar deve ser acompanhada de outros aspectos necessários para promover a formação integral de crianças e jovens. A idéia, portanto, não é fazer com que as crianças fiquem o dia inteiro na escola, mas que ocupem outros espaços de aprendizagem que sejam enriquecedores para o seu desenvolvimento como cidadãos plenos.
“Temos que procurar garantir o que está previsto na LDB, que não é apenas jornada integral para manter o aluno mais tempo na escola. Inclui também a formação de parcerias para o desenvolvimento de experiências que tenham um valor educativo, com o envolvimento da comunidade, de ONGs e movimentos sociais”, ressalta Daniel Cara, coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação. Essas parcerias podem se dar, por exemplo, com a criação de espaços educativos articulados entre escolas, seu entorno, o setor privado e a administração pública.
Além da extensão da jornada escolar e da criação de parcerias com a sociedade civil, o conceito de educação integral envolve também outros aspectos, como a articulação de disciplinas, pela perspectiva de transversalidade de temas, e o desenvolvimento de habilidades que auxiliem no aprendizado em sala de aula. Cara explica: “O conceito de educação integral diz respeito à ampliação de esfera educacional, que deve englobar não apenas o conteúdo científico tradicional, mas um conjunto de experiências que tenham valor educacional, como música, informática, esportes etc. O importante é que essas atividades criem para o aluno um sentido educativo”.
As conexões entre as várias áreas do conhecimento podem ser organizadas a partir de projetos temáticos, por meio do incentivo à vida prática comunitária. Nesse caso, os alunos são estimulados a solucionar problemas da sua comunidade. Um projeto de reciclagem que resolva o problema da coleta de lixo, cita Daniel Cara, pode envolver a aplicação prática de diversas disciplinas, como ciências, matemática etc.
Para ele, a educação integral é condição necessária para garantir qualidade na educação e deve ter prioridade no orçamento público. “O Brasil tem que se perguntar aonde quer chegar. Se o país quiser realmente dar um salto em educação, tem que colocá-la como prioridade no orçamento e incluir a perspectiva de educação integral”, reforça.
Redes pela educação
Para debater o conceito de educação integral e discutir soluções possíveis para a implantação do sistema, mais de mil atores envolvidos com o tema (educadores, representantes de ONGs e do poder público) se reuniram no Seminário Nacional Tecendo Redes para a Educação Integral, realizado em agosto, em São Paulo, pela Fundação Itaú Social, em parceria com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e com apoio técnico do Cenpec. Seminários regionais deverão disseminar o debate em todo o país, segundo o Cenpec, que lançou ainda, recentemente, um caderno especial sobre educação integral (disponível no site da instituição. [Veja o endereço na área Links Relacionados nesta página]).
No encontro nacional, foram apresentados modelos e experiências de implantação de educação integral realizados em diversas regiões do Brasil. Um deles foi o projeto Bairro Escola, desenvolvido desde o início do ano pela prefeitura de Nova Iguaçu, no Rio de Janeiro, em que alunos das escolas públicas do ensino fundamental participam de oficinas culturais e praticam esportes nos espaços da própria comunidade, como igrejas e clubes. Por esse modelo, a mobilização da sociedade civil resulta na formação de uma rede social que engloba escolas, ONGs e associações comunitárias, iniciativa privada e setor público, em que todos reconhecem ter um papel importante na educação.
As atividades introduzidas no projeto não são apenas para preencher o tempo da criança fora da sala de aula, enfatiza Cida Perez, representante do Instituto Paulo Freire e coordenadora do projeto Bairro Escola. “Existe uma idéia errada de que a educação integral é para tirar a criança da rua, entretê-la. A proposta, na verdade, é mobilizar a comunidade para oferecer às crianças oportunidades de aprendizagem que as escolas não oferecem e que auxiliam no desenvolvimento da criança e na compreensão dos conteúdos em sala de aula”. As artes plásticas, por exemplo, ajudam no trabalho da escrita; os esportes, na socialização e na organização do tempo; e a música pode dar uma grande contribuição na matemática, exemplifica.
Um dos resultados dessa experiência de educação integral é a apropriação do território pela criança, segundo Cida Perez. “É muito importante desenvolver na criança o sentimento de pertencimento à sua escola e à sua comunidade”, diz.
Diversos modelos de educação integral podem, enfim, ser adotados, conforme mostrou o seminário, desde que levem em conta a realidade local e as condições e os recursos disponíveis na comunidade. Devem se basear, principalmente, no “desenvolvimento pleno do sujeito com todas as suas capacidades, acesso a bens culturais e potencialização de talentos”, como sintetiza a pedagoga Isa Guará.
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