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Sobre as terras indígenas e a Aracruz Celulose

Autor original: Fausto Rêgo

Seção original: Artigos de opinião






Ainda sobre as terras indígenas no Espírito Santo
Fernanda Webler

Na edição de 6 de outubro da Rets, a Aracruz Celulose, em artigo escrito pelo sociólogo Gitibá Guichard Faustino, seu especialista em Relações com Comunidades, se defendeu de acusações feitas aqui, na edição de 22 de setembro, pelo cacique Paulo Tupiniquim. Em entrevista exclusiva, o líder indígena falara sobre o litígio entre a empresa e os povos tupiniquim e guarani pela posse de terras no Espírito Santo. Na última semana, Winnie Overbeek, da Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase), e Helder Gomes, da Cooperativa de Trabalho de Consultoria Multidisciplinar (Coopemult), que integram a Rede Alerta contra o Deserto Verde, enviaram mensagem contestando alguns argumentos apresentados pela Aracruz. Publicamos aqui na íntegra:


É imprescindível responder às argumentações do Sr. Gitibá Guichard Faustino, da Aracruz Celulose, divulgados nesta revista on-line no dia 6 de outubro, por vários motivos.


1. Segundo este senhor, nunca houve ocupação tradicional tupiniquim nas terras em disputa. Tal afirmação nos causa estranheza, já que durante muito tempo ele teve como função profissional paga pela empresa Aracruz Celulose S/A a de relações públicas junto às populações indígenas tupiniquim e guarani. Na época, reconheceu a existência dos tupiniquins, freqüentou suas aldeias e dizia-se amigos dessas populações. Chegou, inclusive, a levar a sua esposa para a aldeia de Caieiras Velhas, quando ofereceu um curso de pintura para as mulheres dessa aldeia. O que teria levado esse senhor a mudar de posição? Será o alto salário que recebe da empresa?


2. Sobre a existência das populações tupiniquins no norte do Espírito Santo, se não bastasse a memória do povo capixaba, há provas documentais produzidas pela Fundação Nacional do Índio (Funai). Ela confirma que as terras em disputa são tradicionalmente ocupadas pelos tupiniquins. Seu parecer, enviado no dia 12 de setembro ao ministro da Justiça, está baseado em estudos de quatro grupos técnicos oficiais, todos assinados por profissionais experientes e nominados para tal tarefa. No entanto a Aracruz Celulose insiste na sua tese oportunista, tomando como base um parecer de um suspeito grupo multidisciplinar, que não tem identidade. Por que manter os tais técnicos que compõem o grupo multidisciplinar no anonimato? Isso nos leva a ter fortes suspeitas de que isso se constitui em mais um blefe da empresa para garantir os seus interesses econômicos.


3. Segundo este senhor, a disputa por terras é “recorrente”, como se os índios quisessem cada vez mais terras. Na verdade, a luta indígena completa 40 anos porque até hoje o governo brasileiro não conseguiu garantir os direitos indígenas sobre as terras que lhes constitucionalmente pertencem: 18.070 hectares. Em 1998, o ex-ministro da Justiça Íris Rezende demarcou apenas 7.061 hectares, revoltando os índios, que posteriormente foram forçados a assinar um acordo inconstitucional que trocava terra por dinheiro. Ficaram também com quase 2.000 hectares de eucalipto nas suas terras. Em 2005, após sete anos vivendo com esse acordo e percebendo cada vez mais como o dinheiro estava dividindo suas comunidades, além de não garantir-lhes um modo de subsistência digno, decidiram, em assembléia geral, que tinham que garantir, primeiramente, seu direito à terra. Quem lucrou muito com o acordo foi a própria Aracruz, cujo negócio está indo muito bem, conforme suas próprias informações. Só em 2005, foram mais de 1 bilhão de reais de lucro.


4. Segundo este senhor, para quem o cinismo não parece ser algo estranho, “a Aracruz não está lutando contra as comunidades indígenas”. Perguntamos: então? Negar a existência dessa população, constrangê-la diante do povo capixaba, estimular os maus-tratos por parte de seus funcionários e de outros cidadãos a crianças e jovens indígenas, isso não é crime de racismo? Isso não é preconceito étnico? Vale ressaltar que a Comissão de Caciques e Lideranças Tupiniquim e Guarani entrou com uma representação no Ministério Público Federal do Espírito Santo, pedindo que este promova ações civil pública e penal contra os diretores da empresa, por causa do crime de racismo. O MPF/ES já confirmou que vai agir e que as informações da Aracruz são, no mínimo, abusivas. Certamente o artigo do Sr. Gitibá servirá como mais uma prova dessa campanha abusiva e, sobretudo, criminosa da Aracruz Celulose.


Winnie Overbeek (Fase-ES) e Helder Gomes (Coopemult), da Rede Alerta contra o Deserto Verde (www.desertoverde.org).






A Rets não se responsabiliza pelos conceitos e opiniões emitidos nos artigos assinados.

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