Autor original: Marcelo Medeiros
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Em 14 de dezembro se comemorou um ano da entrada em vigor da Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção. O documento, ratificado pelo Brasil em junho de 2005, é o primeiro instrumento internacional anticorrupção juridicamente vinculante, ou seja, que obriga o cumprimento. O texto traz uma série de normas a serem adotadas pelos países ratificantes que facilitam o combate ao desvio de dinheiro público e privado em todo o mundo.
Em comemoração à data, o Escritório das Nações Unidas contra Drogas e Crime (UNODC) iniciou a campanha “Você pode deter a corrupção”, que pretende mobilizar a população de vários países e organizações da sociedade civil contra esse mal que atinge todo o planeta em maior ou menor escala. No Brasil, a iniciativa ganha força em janeiro, quando o UNODC divulgará o pacto firmado pela instituição internacional com empresas privadas nacionais por uma boa prática de negócios. “Vamos mostrar a dimensão do problema e anunciar medidas a serem tomadas para que ele seja evitado”, diz, em entrevista à Rets, o representante do UNODC no Cone Sul, Giovani Quaglia. O próximo passo será um acordo semelhante com estatais.
Em relação ao Estado, Quaglia afirma que ainda falta serem implementados os artigos 7, 20 e 21 da Convenção. Eles fazem referência, respectivamente, a normas de contratação e treinamento de funcionários públicos; criminalização de enriquecimento ilícito e de suborno no setor privado. Tendo ratificado a Convenção, o Brasil é obrigado a se adequar às novas normas.
Nesta entrevista, o diretor executivo da UNODC fala sobre o problema da corrupção no Brasil e no mundo e sobre a campanha que o escritório apóia.
Rets - Anualmente a ONG Transparência Internacional divulga um ranking dos países onde a percepção de corrupção é maior. Em 2006, a percepção cresceu no Brasil. O governo estaria compromissado a combater a corrupção?
Giovani Quaglia - Quando se ratifica um documento internacional, é obrigatório assumir esses compromissos. Mas temos que ter cuidado com esse índice, pois ele mede apenas a percepção. Quando a população está mais alerta, a percepção aumenta mesmo sem haver vínculo direto com a corrupção de fato. Não há uma medição da corrupção, a metodologia é outra e estamos tentando desenvolver algo para mensurar.
Rets - Como seria essa metodologia?
Giovani Quaglia - Não posso dizer ainda, pois ela ainda está sendo discutida. Inclusive, há um encontro acontecendo na Jordânia (nos dias 14 e 15 de dezembro) para avaliar como isso será feito e analisar os avanços no combate à corrupção.
Rets - Nessas discussões a ONU cogita alguma sanção a países corruptos?
Giovani Quaglia - Não é papel da ONU sancionar ninguém, mas um relatório de corrupção já afetaria um país, pois os investidores tomariam medidas diferentes em relação a ele. Mas precisamos de mecanismos para avaliar bem os índices, é algo bastante complicado de se fazer.
Rets - A UNODC lançou a campanha “Você pode deter a corrupção”. Como ela foi pensada?
Giovani Quaglia - Hoje [14 de dezembro, quando foi feita a entrevista] comemoramos o primeiro ano da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção. Por isso decidimos lançar uma campanha dirigida à sociedade com a mensagem de que a corrupção pode ser detida. Muito se fala da corrupção no setor público, mas ela afeta toda a sociedade.
Rets - Como está estruturada a campanha?
Giovani Quaglia - No momento ainda está fraca. Temos uma mensagem que começou a ser divulgada nos meios de comunicação, mas, a partir de janeiro, haverá mais impacto. Vamos divulgar um pacto empresarial firmado contra a corrupção. Vamos mostrar a dimensão do problema e anunciar medidas a serem tomadas para que ele seja evitado. Depois serão as empresas públicas, que nos procuraram para fazer um acordo semelhante ao setor privado.
Estamos gerando um movimento que vai levar tempo para ganhar força, mas cada setor deve começar a trabalhar o mais rápido possível.
Rets - Que medidas podem ser tomadas?
Giovani Quaglia - Em primeiro lugar, não pagar suborno. Para isso acontecer, são necessários controles internos mais eficientes, uma contabilidade bem feita para evitar a existência de caixa dois. Há ainda uma série de medidas disponíveis em nosso site [endereço disponível em Links Relacionados, ao lado].
Rets - Há alguma diferença no pacto firmado entre empresas privadas e públicas?
Giovani Quaglia - O pacto das públicas será feito nas mesmas bases do setor privado. O interessante é que o próprio setor público nos procurou para firmar o pacto depois de um seminário. Gostaram da idéia. Agora, as estatais estão em contato com o Instituto Ethos de Responsabilidade Social e conosco, mas ainda estamos negociando a versão final do texto.
Se já temos o interesse dos agentes econômicos e da mídia, será mais fácil avançar. Não queremos que o combate à corrupção seja feito em apenas um dia, mas sim que seja um movimento constante.
Rets - Como avalia o combate até agora no Brasil?
Giovani Quaglia - Não se iniciou ainda, a Convenção é muito jovem. Em 2006 foram tomadas algumas medidas pela Controladoria Geral da União (CGU) para aperfeiçoar os controles, mas a programação vai até 2009. O Legislativo ainda tem coisas por fazer, como terminar a aprovação da Convenção. Acredito que seja cedo para dizer se a convenção é um sucesso ou não.
Rets - O que falta para o Brasil terminar a ratificação?
Giovani Quaglia - Os artigos 7, 20 e 21 ainda estão tramitando no Congresso. São relativos ao enriquecimento ilícito e à corrupção.
Rets - O UNOCD desenvolve no país seu maior programa de cooperação técnica. Por que a escolha?
Giovani Quaglia - Temos programas semelhantes em todo o mundo, não é algo específico no Brasil. O país, porém, se destaca pelo peso na ONU e pela facilidade de estabelecer parcerias. Além disso, é um país grande e de economia média. Não é um local pobre, logo pode investir recursos próprios também.
Rets - As instituições que deveriam controlar a corrupção no Brasil atuam de maneira eficiente?
Giovani Quaglia - O problema brasileiro não está na legislação, que é muito boa. Está na tradução das leis em ações concretas. É preciso trabalhar bastante para que isso aconteça, mas já há resultados. De qualquer forma, porém, é preciso fiscalização por parte da sociedade civil. Há menos corrupção onde a sociedade civil é mais ativa.
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