Equação da transformação

Autor original: Mariana Hansen

Seção original: Os mais interessantes e ativos projetos do Terceiro Setor

Projeto Histórias do Quilombo Serra do Talhado | Artesã: Maria de Fátima

Fundado em 2005, o Instituto Soma Brasil (ISB) é resultado da união de sete profissionais que queriam contribuir para a solução dos principais problemas do estado da Paraíba. Provenientes de diferentes estados e atuantes em diversas áreas, essas pessoas tinham em comum a passagem por ONGs, assim como a realização de projetos sociais e culturais voltados para o desenvolvimento sócio-econômico de comunidades de baixa renda.
 
"Por alguma razão cósmica, ou outra que não se sabe explicar, essas pessoas se encontraram durante a realização de projetos. A partir de então, começou-se a esboçar a criação de uma ONG na Paraíba, que, como é sabido, é um dos estados mais pobres do país", conta o coordenador de projetos do Instituto, Jorge Garcia. Ele acrescenta que o estado não tem nenhuma tradição na organização social de pessoas e entidades.

Segundo Garcia, apesar de todas as dificuldades, a região tem um grande potencial econômico, uma enorme diversidade cultural, natureza exuberante e um povo criativo. "Foi para colaborar com essa gente, trazendo um pouco de experiência do nosso grupo e bastante vontade de fazer a coisa certa, que decidimos somar o Brasil que estava dividido", explica o coordenador, justificando o nome da entidade.

Atuando mais especificamente no município de Cabedelo e em seu entorno, o principal objetivo do Soma Brasil é a promoção do desenvolvimento humano e econômico de microrregiões. Para isso, desenvolve projetos com viés de sustentabilidade e que não dependam exclusivamente das instituições do governo. "O importante em nossas ações é fazer com que a transformação local se dê por transferência de conhecimento técnico por parte do ISB, somando o saber, a dinâmica, o potencial e as forças sociais da região. É o que muitos chamam de 'empoderamento'", destaca.

Fato curioso observado por Garcia é que a tecnologia de trabalho social utilizada pela instituição é pouco conhecida na região, o que por vezes provoca reações iniciais de estranheza e desconfiança. No entanto, passados os contatos preliminares e vencidos os traumas de outras épocas, as coisas avançam. "Mesmo que o trabalho demore mais do que o normal em outras localidades, o resultado tende a ser mais duradouro", acredita.

Atualmente, sete projetos estão em andamento: Comunidade Boas Práticas, Cinturão Verde, A Trajetória da Capoeira na Paraíba, Telecentro de Informação e Negócios, Histórias do Quilombo Serra do Telhado, Loucos por Letras e Culturas 2007. A variedade de temas das iniciativas se deve à quantidade de problemas que o estado enfrenta e que Jorge classifica como "todos urgentes". E o objetivo de todas essas ações é um só: inclusão social.

O projeto Comunidade Boas Práticas é dedicado à inclusão digital e à promoção social e cultural de jovens do Recanto do Poço, em Cabedelo (PB). Já foram atendidos 200 jovens na comunidade, afetada por problemas como drogas, desemprego, escola de má qualidade e saúde deficitária, entre outros. As atividades desenvolvidas incluem capacitação profissional, incentivo à leitura, promoção de arte e cultura e orientação psicossocial.

Garcia conta que a entidade tem insistido em ações em que os jovens são prioridade por acreditar que prepará-los para gerir o futuro é uma saída viável e necessária. A população jovem é mais vulnerável e também é a primeira a sentir os efeitos das desigualdades sócio-culturais. Para o coordenador, "se conseguirmos fazer com que eles [jovens] aprendam a somar os seus interesses de uma vida digna, será possível, num futuro próximo, que também dividam os resultados de forma mais equânime".

Outras alternativas

Cinturão Verde é uma ação dedicada à agricultura familiar com capacitação e adoção de tecnologias sociais para produção de alimentos orgânicos. As atividades são realizadas na comunidade do Baixo Gramame, em João Pessoa (PB). O projeto A Trajetória da Capoeira na Paraíba, por sua vez, é um trabalho de pesquisa e resgate da história dos grupos de capoeira da Paraíba e conta com a parceria do Ministério da Cultura.

Outra iniciativa que ganha forma é Histórias do Quilombo Serra do Talhado, com a população quilombola da cidade de Santa Luzia. A comunidade é composta por famílias de baixa renda que passam por muitas privações e onde os jovens afro-descendentes, segundo Garcia, "são obrigados a abandonar suas raízes e se aventurar noutras cidades sem condição alguma de sobrevivência digna".

A busca de uma vida melhor acaba por esbarrar em problemas como alcoolismo e drogas, formando um grupo de jovens desempregados em conflito com a lei. O coordenador explica que o intuito da ação e resgatar a trajetória cultural e econômica da localidade, que produzia artesanato e cultivava algodão, e disseminar alternativas modernas para que possam permanecer em sua região e dela tirar seu sustento.

Na área de educação, a entidade desenvolve o Loucos por Letras, que atua na capacitação de professores da rede pública de Ensino Fundamental para incentivo à leitura. A iniciativa abrange dez municípios do estado e também conta com apoio do Ministério da Cultura. Por último, o Culturas 2007, que envolve uma mostra universitária realizada na Universidade Federal da Paraíba para apresentar as principais manifestações de culturais e artísticas da região Nordeste e de países de língua latina.

Somando

Em todos os projetos realizados, a entidade segue a mesma filosofia de construção compartilhada, unindo talentos, competências e potenciais. "Desta forma construímos uma rede local capaz de subsistir após a saída do ISB, pois a população se apropria do conhecimento e novos multiplicadores são formados", esclarece Garcia.

Outro ponto importante do trabalho é a elevação da auto-estima das pessoas atendidas, especialmente dos jovens constantemente expostos a situações de risco social. "Pode ser uma conversa amiga, um local limpo pra passar um tempo, um ambiente acolhedor pra distrair a cabeça ou uma atividade em grupo para criar novas amizades", explica. "São coisas simples, que fazem bem à alma e vão fazer bem ao corpo, vão ajudar a manter a vida do jovem".

Nessa equação de transformação, o Instituto Soma Brasil espera criar uma rede de instituições do terceiro setor no estado para elevar o capital social da região. "Somente assim vamos chamar a atenção para as coisas boas que estão sendo feitas aqui, estabelecer novas relações com instituições locais e externas e romper o paradigma de que a Paraíba nunca será um lugar desenvolvido", conclui.

Mariana Hansen