Autor original: Marcelo Medeiros
Seção original: Notícias exclusivas para a Rets
Em visita ao Brasil, a diretora da Unidade sobre Direito à Alimentação da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), Barbara Ekwall, conversou com a Rets sobre segurança alimentar, uma das maiores preocupações da entidade. Para Ekwall, o governo brasileiro tem realizado um bom trabalho nessa área, mas ainda há muito a ser feito.
Em relação ao medo de várias organizações e movimentos sociais de que o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) atinja a produção de alimentos ao estimular a produção de soja e cana, a diretora afirma ser esta uma preocupação mundial. Diz que cada caso deve ser analisado com cuidado, mas que esse processo pode ter aspectos positivos, como a geração de empregos.
Rets - Qual era o objetivo da missão da FAO nessa visita ao Brasil?
Barbara Ekwall - A FAO tem um grande compromisso com o exercício do direito à alimentação, por isso quisemos discutir com o governo brasileiro o andamento de políticas públicas nesse sentido, assim como conhecer mais de perto a realidade brasileira.
Rets - Como foram essas conversas?
Barbara Ekwall - O resultado foi ótimo, encontramos portas abertas em todos os setores. Tivemos reuniões com os ministérios da Saúde e do Desenvolvimento Social, com o Consea e a Secretaria Especial de Direitos Humanos. Em todas pudemos abordar todos os pontos com clareza. A variedade de pastas visitadas, aliás, mostra o tamanho da multidisciplinaridade da questão do direito à alimentação. O Brasil precisa, no entanto, e acredito que já esteja nesse caminho, estabelecer uma forma de monitoramento de políticas públicas para garantir que elas respeitem esse direito fundamental. Para isso é preciso ter capacitação para mostrar ao cidadão como recorrer quando vir seu direito desrespeitado. A Losan [Lei Orgânica de Segurança Alimentar], que foi aprovada recentemente, discute a operacionalização disso tudo. Espero que o tema seja tratado como prioridade.
Rets - O governo brasileiro lançou há pouco o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), que, entre outras coisas, pretende estimular a produção de bens agrícolas como a soja e a cana-de-açúcar. Há críticas, porém, de que esse estímulo pode afetar a produção de alimentos. Esse assunto foi discutido nessa visita?
Barbara Ekwall - Conhecemos o PAC agora, logo não posso opinar sobre ele. O que posso dizer é que este é um assunto tratado internacionalmente, que deve ser visto sempre da ótica da garantia de direitos. Por outro lado, pode ter aspectos positivos. Para se alimentarem, as pessoas precisam de emprego, e geralmente esse avanço produz empregos. Isso pode ser um efeito positivo, mas que precisa ser analisado com cuidado. Novamente, a política nacional deve ser pensada sempre a partir do ponto de vista do direito à alimentação, do efeito que cada ação pode ter em relação a ele. Isso implica o empoderamento da população, para que ela possa participar da construção dessas políticas e ter garantias de participação.
Rets - É possível perceber melhoras relativas à segurança alimentar no Brasil nos últimos quatro anos? O assunto foi tratado como prioridade no primeiro mandato do atual governo.
Barbara Ekwall - Houve melhoras e também redução da desigualdade, isso é possível dizer. No entanto ainda há muito a fazer e muita coisa a melhorar.
Rets - Há diversos casos de desnutrição no país, principalmente em tribos indígenas. A senhora conheceu alguma dessas realidades de perto?
Barbara Ekwall - São fatos muito tristes, com certeza. Não tive tempo de ver de perto nenhuma dessas realidades, mas, pelo que nossos interlocutores relataram, a situação de algumas tribos é bastante preocupante.
Rets - A FAO fez algum tipo de recomendação ao governo?
Barbara Ekwall - A FAO não tem competência para fazer recomendação a nenhum governo, mas sempre enfatizamos a necessidade de uma abordagem de direitos humanos em relação à alimentação. Dar comida a uma pessoa com fome não deve ser visto como uma atividade assistencialista, mas como o exercício do direito de ter uma vida digna.
Rets - A FAO tem uma parceria de quase três anos com a Abrandh. Qual é a avaliação desse trabalho?
Barbara Ekwall - É um trabalho muito bom e profissional. A Abrandh [Ação Brasileira pela Nutrição e Direitos Humanos] possui capacidade técnica para a atividade e tem contribuído bastante para as discussões relacionadas à segurança alimentar no Consea, na Secretaria de Direitos Humanos e na aprovação da Lei Orgânica de Segurança Alimentar. Gostaríamos de continuar com a parceria.
Theme by Danetsoft and Danang Probo Sayekti inspired by Maksimer