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Crianças na balança

Autor original: Joana Moscatelli

Seção original: Os mais interessantes e ativos projetos do Terceiro Setor






Crianças na balança
Capa do livro "Overcoming Obesity in
Childhood and Adolescence"

Fisiologistas, nutricionistas, psicólogos, fisioterapeutas, endocrinologistas e pediatras. No Instituto Movere de Ações Comunitárias, criado em 2004, esses profissionais têm um só objetivo: estimular hábitos alimentares mais saudáveis e combater o sedentarismo de mais de 100 crianças e adolescentes na cidade de São Paulo (SP).

No Brasil, principalmente nas regiões Sul, Sudeste e Centro-oeste, o número de crianças obesas e acima do peso tem crescido muito nos últimos anos. Segundo a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), houve um aumento de 240% nos casos de obesidade infantil nos últimos 20 anos no país. O que antes era considerado um problema de países ricos preocupa agora países em desenvolvimento como o Brasil.

Além da grande oferta de fast-foods, refrigerantes, gorduras e açúcares, cada vez mais as tradicionais brincadeiras infantis de ruas são substituídas pelo computador e pela televisão. Atividades sedentárias, portanto. Assim como os adultos, crianças de todas as faixas de renda praticam cada vez menos exercícios físicos e se alimentam cada vez pior. Na Inglaterra, até agora uma das soluções encontradas para combater o problema foi proibir o anúncio de guloseimas sem valor nutritivo para as crianças na televisão. Enquanto isso, em alguns estados do Brasil, como o Rio de Janeiro, chegou-se a proibir a venda de salgadinhos, balas e refrigerantes nas cantinas das escolas.

Além de aumentar o risco de desenvolver doenças do coração, diabetes e hipertensão, a obesidade tem trazido sérios riscos à vida emocional e social de crianças, que desde pequenas são alvos das chamadas “chacotas” nas escolas. “Baleia”, “elefante” e “bola” são alguns dos muitos apelidos que os mais cheinhos têm que enfrentar na sala de aula. 

Durante as dinâmicas de grupo realizadas no Instituto, os profissionais puderam verificar, através dos depoimentos das crianças e adolescentes, que a comida muitas vezes estava servindo como uma compensação de problemas emocionais, como tristeza e ansiedade.

Para a presidente do Instituto, Vera Lúcia Perino Barbosa, a obesidade está associada a muitos problemas familiares e emocionais, por isso enfatiza tanto a necessidade de se trabalhar sempre em conjunto com os pais da criança atendida na organização. “Mudar hábitos é muito difícil, ensinar a uma criança a se alimentar melhor exige também todo um entrosamento com sua família. Afinal de contas, quem compra os alimentos são os pais. Além disso, um ambiente familiar que estimule a prática de atividades físicas também é importante. Por isso, os pais devem saber o quão importante essas atividades são não só para seus filhos como para eles mesmos”, ensina Vera, que é especialista em Nutrição Materno Infantil.

Apesar de parecer paradoxal, a especialista associa esses altos índices de obesidade com uma antiga preocupação brasileira: a desnutrição. “Na verdade, tudo tem a ver com má alimentação e qualidade de vida. As crianças desnutridas de hoje são os gordinhos de amanhã, porque acabam desenvolvendo uma pré-disposição para engordar. Além disso, hoje em dia, pessoas mais pobres acabam consumindo mais carboidratos por serem mais baratos e desconhecerem a necessidade de outras fontes de nutrientes”, explica.

Além de promover a reeducação alimentar e atividades físicas, no instituto existe toda uma preocupação com o estímulo à auto-estima. Na cozinha experimental do Instituto, as crianças aprendem inclusive como preparar seus alimentos de forma mais saudável. Desde pequenos, são ensinados a colocar em prática aquilo que aprenderam nas aulas teóricas sobre nutrição e alimentação saudável.

A Santa Casa de São Paulo é um dos principais parceiros do Instituto. Lá são realizados todos os testes bioquímicos, assim como o encaminhamento das crianças ao Instituto. Além do hospital, apóiam o trabalho da organização o Movere - Núcleo de Atividades Esportivas, a empresa Pepsico e a ONG BrazilFoudation.

Em 2006, a metodologia do projeto Movere foi adaptada e aplicada na Escola Joaquim Nabuco, em São Paulo, onde cerca de mil alunos da 1ª a 8ª série foram atendidos juntamente com suas famílias. Inicialmente, foram realizados testes e questionários sobre hábitos alimentares, atividades físicas e custos familiares. Os estudantes que apresentaram problemas mais sérios foram encaminhados para Santa Casa e/ou para o Instituto.

Além dos alunos e familiares, as professoras e merendeiras também puderam participar das atividades de prevenção e alimentação saudável. De acordo com Vera, o projeto teve tanto sucesso que a meta agora é expandi-lo para outras escolas. A intenção esbarra, no entanto, na burocracia dos órgãos municipais de São Paulo que, segundo a presidente do instituto, estão criando empecilhos para a aplicação do projeto em outras escolas públicas.

Joana Moscatelli

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