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Antiterrorismo ou criminalização?

Autor original: Maria Eduarda Mattar

Seção original: Artigos de opinião






Antiterrorismo ou criminalização?
Gun Flood | Peter Kuper

Alexandre Nápoles Filho*
 
Após o Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República entregar ao Ministério da Justiça um anteprojeto de lei, no dia 12 de março, que trata dos crimes de terrorismo e de seu financiamento[1], um grande temor surgiu nas pautas de discussão da sociedade civil. Afinal: qual será a verdadeira intenção dessa política antiterrorista, em que pese o Brasil até então não ser considerado alvo de atentados terroristas?


Tendo em vista que o anteprojeto não tipifica o que é terrorismo, questão que até mesmo o Conselho de Segurança da ONU não chegou a uma definição satisfatória, e que serão os juízes de primeira instância que terão a atribuição para identificar se uma ação é ou não terrorista, abre-se condições suficientes para que o Judiciário conservador decida em desfavor das classes subjugadas.


Cézar Britto, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em entrevista concedida à Agência Brasil, no último dia 28, demonstra estar preocupado com a possibilidade de que atos e manifestações promovidos por movimentos sociais venham a ser julgados com base na lei que se quer criar com a aprovação do anteprojeto de lei. [2]


Como se percebe, essa manobra política demonstra ser influência norte-americana e um favor aos anseios elitistas dos grandes latifundiários que desejam, a todo custo, frear as lutas dos movimentos sociais em benefício dos direitos humanos. Mas, engana-se quem entende que a estigmatização como terrorista dos defensores de direitos humanos seja articulação nova, pós 11 de setembro, basta lembrar do fatídico e desastroso atentado a bomba do Riocentro, em 30 de abril de 1981.


Tal episódio marcou a decadência do regime militar, quando setores mais radicais do Exército, buscando criminalizar os integrantes radicais da esquerda (do partido PCB) e paralisar a lenta abertura política, implantou um automóvel recheado de explosivos no Pavilhão do Riocentro onde acontecia um evento em comemoração ao Dia do Trabalho. Contudo, a farsa foi por água abaixo, o veículo explodiu ainda quando os integrantes do DOI-Codi, o capitão Wilson Luís Alves Machado e o sargento Guilherme Pereira do Rosário, estavam a bordo.


Além de não ser novidade, o enquadramento como terrorista dos atos praticados em prol da defesa dos direitos humanos, não é exclusividade do Brasil e dos países do Cone Sul. Em várias partes do mundo se exalta à "guerra contra o terror" e à segurança nacional como pretexto para as discriminações e perseguições políticas. Como informa a Anistia Internacional [3], no Uzbequistão, país da Ásia Central, entre 2005 e 2006 os acusados de terrorismo foram julgados a portas fechadas ou até secretamente, não tendo acesso a seus familiares nem a advogados de sua escolha. No Irã, no último dia 02, duas defensoras dos direitos da mulher foram presas, pelo crime contra a segurança nacional, por estarem coletando assinaturas para uma petição contra as discriminações dos direitos da mulher [4].


Não que devemos negligenciar o notável crescimento da ramificação dos grupos terroristas em países com fraca presença das instituições estatais, como é o caso do Brasil, mas não se pode confundir luta pela implementação das garantias fundamentais, que estão sublinhadas em nossa Constituição Federal, com atitude que coloque em risco a segurança nacional. Os movimentos sociais, como o MST, são nossas armas de combate à desigualdade social e não podem ser engessados por legislações que restrinjam os direitos humanos.


* Alexandre Nápoles Filho é estagiário do dhInternacional, estudante do 6° período do curso de Direito.


[1]  O anteprojeto ainda será examinado pela Casa Civil e depois será encaminhado para apreciação do Congresso. Em seu artigo 1º, estabelece que serão punidos como atos terroristas os que forem cometidos para infundir estado de pânico ou insegurança na sociedade, intimidar o Estado, organização internacional ou pessoa jurídica, ou coagi-las a agir ou omitir-se a respeito de algo. Ele visa também proibir, dentre outras coisas, manifestações em rodoviárias e ocupação de prédios públicos e de propriedades privadas, ações peculiares dos movimentos sociais.


[2] http://www.direitos.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=2815&Itemid=1, acesso em 04/04/07.


[3] http://www.br.amnesty.org/index_noticias.shtml?sh_itm=33d0eb6c29b01ef78f01ff325cac4b82, acesso em 04/04/07.


[4] Dados da ONG internacional Front Line. http://www.frontlinedefenders.org/news/3681, acesso em 04/04/07






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