Autor original: Viviane Gomes
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Dia 7 de maio de 1997. Essa é a data do leilão de privatização da Companhia Vale do Rio Doce, então estatal brasileira lucrativa e eficiente. Foi uma operação controversa realizada com financiamento subsidiado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social [BNDES], que desrespeitou trâmites de processos judiciais e teve o objeto do leilão sub-avaliado em 28 vezes de seu valor real. “Em 1997, mais de cem ações populares foram impetradas em diversos Tribunais de Justiça do país para impedir o leilão de privatização da Companhia Vale do Rio Doce. Se há ações populares contra o leilão, elas deveriam ser julgadas antes de o leilão ser autorizado, mas isso não aconteceu. O leilão foi feito e as ações continuam à espera de julgamento. Por isso, afirmamos que o leilão de privatização da Companhia Vale do Rio Doce judicialmente não tem validade, não respeitou os trâmites legais”, explica Renato Monteiro, da secretaria operativa da Campanha “A Vale é Nossa”.
Para compreender a campanha é preciso olhar além da questão da Vale do Rio Doce. Isso porque a campanha está inserida em dois processos de participação popular: as Assembléias Populares e o Plebiscito Popular. A Assembléia Popular é uma metodologia voltada para a constituição de um espaço político próprio dos movimentos sociais; de intercâmbio de experiências e de informações para o fortalecimento de alianças e articulações de cunho popular; para a afirmação da autonomia dos setores populares frente às opções políticas e ideológicas do governo. Reuniões de mobilização são organizadas para disseminar informações e definir estratégias para a realização dos Plebiscitos Populares, que culminam na consulta ao povo sobre um determinado tema.
Por esse motivo Marcelo entende que a campanha não é uma iniciativa isolada, porque sua finalidade é fazer com que a população entenda mais sobre os processos políticos, reveja modelos de participação e adote esse sistema para participar das decisões políticas do país através da pressão popular. “Nossa idéia é fazer com que a sociedade se movimente e se indigne e, finalmente, pressione o governo a considerar a opinião popular em todas as decisões que atingem diretamente a população - seja na exploração de recursos naturais, na segurança, na habitação, na saúde, educação, energia ou na transposição do rio São Francisco."
Para Marcelo, este momento é decisivo para a Campanha "A Vale é Nossa!". O plebiscito será realizado de 1 a 7 de setembro, podendo se estender até o dia 9. Por isso, em agosto serão intensificadas as reuniões e os debates sobre a campanha. As pessoas interessadas em organizar um núcleo de votação devem entrar em contato com um dos 19 comitês estaduais [a lista está no site da campanha] e aproveitar o mês de agosto para realizar cursos de formação sobre o tema. No site, há cartazes, cartilhas, jornais e um vídeo, com três partes, acessível no You Tube [ver link ao lado]. De acordo com Marcelo, os materiais são de fácil entendimento, têm linguagem simples e foram desenvolvidos com o propósito de facilitar a sensibilização da sociedade sobre o destino da segunda maior mineradora do mundo.
As urnas podem ser montadas em sindicatos, fábricas, escolas, associações de moradores, praças, igrejas e em espaços de grande circulação de pessoas. Cada estado tem autonomia para organizar o plebiscito, assim como o trabalho de conscientização junto à população e as mobilizações de rua. Mesmo assim, a secretaria da campanha está divulgando algumas orientações para a organização do Plebiscito Popular. As urnas podem ser confeccionadas até mesmo artesanalmente. Para uma pessoa participar da votação basta levar qualquer documento oficial de identidade. Das cédulas poderão constar até quatro perguntas. Isso porque, o comitê nacional da campanha, reunido no dia 28 de julho, deliberou que o plebiscito poderá ser feito de duas formas: com apenas uma pergunta sobre a privatização da Companhia Vale do Rio Doce; ou com quatro perguntas, englobando outros três temas.
No primeiro caso, a pergunta é: "Em 1997, a Companhia Vale do Rio Doce - patrimônio construído pelo povo brasileiro - foi fraudulentamente privatizada, ação que o Governo Federal e o Poder Judiciário podem anular. A Vale deve continuar nas mãos do capital privado?". Para a segunda opção, três perguntas são sugeridas: 1) “O Governo deve continuar priorizando o pagamento das dívidas externa e interna, em vez de investir na melhoria das condições de vida e trabalho do povo brasileiro?”; “Você concorda que a energia elétrica continue sendo explorada pelo capital privado, com o povo pagando até oito vezes mais que as grandes empresas?”; e, por fim, “Você concorda com uma reforma da previdência que retire direitos dos/as trabalhadores/as?”.
Os organizadores deverão disponibilizar também uma lista de votação. A recomendação é que os menores de 16 anos, crianças e adolescentes votem em urnas separadas - e a contagem destas também deve ser em separado. Após o escrutínio, os núcleos devem encaminhar os documentos e as cédulas aos comitês locais até o dia 12 de setembro. Os comitês estaduais devem receber o resultado consolidado até o dia 17. O resultado final do plebiscito deverá ser divulgado até o dia 20 de setembro e será entregue aos três poderes – Judiciário, Legislativo e Executivo.
Marcelo conta que finalidade geral da campanha é fazer com que o Governo Federal se posicione em relação às decisões judiciais. Isso porque os processos referentes à anulação do leilão de privatização da Companhia Vale do Rio Doce foram suspensos pelo Superior Tribunal de Justiça em setembro de 1997. Na época, o STJ determinou que todas as ações fossem reunidas e que não houvesse julgamentos em outras instâncias. As ações foram encaminhadas para o Tribunal de Justiça do estado do Pará, que julgou sete ações e arquivou 69, sem julgamento do mérito. Houve recurso, e em 2005, a 5ª Turma do Tribunal Regional Federal, em Brasília, anulou a decisão do Tribunal do Pará, determinando que todas as ações fossem analisadas. Ao mesmo tempo, o Superior Tribunal de Justiça manteve a decisão do juiz de Belém.
A situação atual é que o STJ deferiu liminar em favor da Companhia Vale do Rio Doce em setembro de 2006, numa ação em que a companhia alegava que as decisões deveriam ser reunidas e que não houvesse julgamentos diferentes, conforme determinação do próprio STJ. A liminar suspende os processos até que a 5ª Turma do TRF de Brasília preste informações quanto ao julgamento proferido em dezembro de 2005, que, segundo a Vale, não cumpriu a determinação da Justiça, dando sentenças diferentes para as ações. A 5ª Turma do TRF de Brasília já entregou os documentos solicitados no dia 31 de outubro de 2006, ao Ministro Luiz Fux, do STJ, para avaliação e decisão final.
“Também nos preocupamos com a volta da Companhia Vale do Rio Doce para o controle estatal. Afinal, nas mãos do governo a companhia produziu desastres ambientais e invasão de terras indígenas e quilombolas. Mas esse é um problema que deverá ser discutido após o plebiscito. Agora, pretendemos sensibilizar a sociedade para reverter um leilão de privatização realizado de maneira ilegal. Queremos que o governo federal, antes chefiado por Fernando Henrique Cardoso, e agora por Lula, se movimente no sentido de descobrir quem autorizou a realização de um leilão com tantas ilegalidades. Nosso desafio é fazer com que a riqueza gerada pela Vale produza benefícios não para seus atuais donos e sim para seus donos legítimos, ou seja, o povo brasileiro”, esclarece.
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