Autor original: Viviane Gomes
Seção original: Artigos de opinião
A importância da comunicação no terceiro setor
Caminhos para elaborar uma estratégia de captação consistente
* Eduardo Homem da Costa
Resumo
A comunicação é uma área do conhecimento vital para o ser humano e não é de hoje que o interesse nesse campo busca estabelecer conceitos e modelos para a compreensão do seu funcionamento. No entanto, não é objetivo desse trabalho propor ou abordar essas teorias. O enfoque é o de estudar o processo de comunicação nas organizações, em particular nas organizações sem fins lucrativos, com um recorte mais profundo sobre a comunicação externa para a captação de recursos e os caminhos que a conduzem para o sucesso.
Sendo assim, torna-se importante conhecer os diferentes processos de comunicação de marketing, identificar e estabelecer formas de uso das ferramentas existentes, reconhecer a importância da integração das interfaces para uma comunicação eficiente e analisar e planejar a comunicação de uma empresa.
Introdução
O processo de construção de uma imagem sólida é de grande importância para qualquer negócio e o terceiro setor não escapa disso. Aliás, isso é fundamental para a continuidade do seu trabalho, afinal, de tempos em tempos surge um escândalo que não traz benefícios para as instituições corretas. Basta uma manchete nos jornais para que se generalize e transforme as instituições sem fins lucrativos em um celeiro de irregularidades, desvios e lavagem de dinheiro. Acontece o mesmo com a classe política. Verdades absolutas como "político é ladrão" são disparadas sem a menor preocupação com a isenção. É verdade também que os políticos brasileiros não têm ajudado muito a modificar isso nos últimos tempos, mas o que se quer dizer é que a ignorância deveria estimular o indivíduo na busca da informação e do conhecimento para em seguida efetuar o seu julgamento.
Ajuda muito a ampliar o rol de defensores de uma instituição investir estrategicamente em marketing e comunicação, pois notoriedade e credibilidade não se constroem apenas com um bom projeto, mas também com um esforço de comunicação, que será a expressão do seu esforço de marketing. Investir em uma campanha para divulgar os resultados ou propostas de um projeto ou ação social é uma maneira inteligente de se apresentar para novos financiadores, doadores e parceiros. Não se deve deixar de fora também que pode ser visto como uma forma de estimular outras empresas e parceiros a investirem nas questões sociais. Instituições sem fins lucrativos sabem disso, mas costumam ser tímidas nesse tipo de investimento.
São inúmeras as formas de comunicação. No entanto, pode-se organizar a distribuição do orçamento de comunicação através de seis meios que definem a composição do mix de comunicação e marketing, definidos por KOTLER e KELLER (2006:552) como sendo "propaganda, promoção de vendas, relações públicas e assessoria de imprensa, eventos e experiências, forças de vendas e marketing direto.".
Independente de atuarem no mesmo segmento, ONGs ou empresas podem aplicar seus recursos das mais variadas formas. As opções escolhidas devem refletir a estratégia adotada e, a partir disso, estabelecer formas criativas de explicar meios e canais adotados para aumentar a eficiência para atingirem objetivos e metas estabelecidos.
Cada ferramenta possui características exclusivas e não necessariamente existe a obrigação de aplicar todo o mix. Existem negócios que por características próprias podem aplicar apenas duas ou três. Não existe nada de equivocado nisso. No entanto, na maior parte dos casos a verba destinada ou mesmo a verba existente torna-se o fator limitador.
Comunicação e terceiro Setor
A situação é bem comum: uma instituição sem fins lucrativos tem um excelente produto a ser vendido. Trabalho de resultados, reconhecido pelo porte de seus parceiros, pelo público atendido, mas passa por problemas financiamento. O discurso é velho e cansativo acerca das dificuldades e "injustiças": "Tantos projetos ruins, tantos recursos sendo aplicados em propostas absolutamente fracas, sem a relevância de um projeto como o que trabalhamos..."
Foi dito acima produto? Esse é outro ponto crítico: a linguagem a ser usada e a ligeira aversão ao uso de técnicas como marketing e comunicação. Compreende-se que a grande maioria dos envolvidos no terceiro setor busca uma transformação da sociedade ou ainda minimizar a situação das nossas camadas populares, que passam por dificuldades críticas. "Falar em produto é linguagem empresarial e o terceiro setor não é um negócio. É um ideal". No entanto onde estão os recursos? De onde eles vêm? Governo? Financiadores internacionais? Nacionais? Empresas? Indivíduos? Os dois primeiros reduziram drasticamente o aporte de recursos desde o final da década de 1980 e ao longo da década seguinte1.
"A década de 90 vai se caracterizar por um refreamento do fluxo de ajuda financeira de agências de cooperação para a América do Sul e, particularmente o Brasil. O problema agravou-se devido ao fato de que muitas agências não consideram mais a região como prioritária para investir recursos. Novos problemas atraem o interesse da sociedade européia. Primeiro os que dizem respeito a sua situação interna: desemprego, crescimento do nacionalismo discriminatório, aumento do fluxo migratório em direção ao continente, oriundo de países situados em regiões vizinhas. Segundo, os relacionados aos problemas dos países do Leste Europeu e da África, considerados pela sociedade européia como regiões prioritárias para o investimento de recursos destinados a cooperação internacional." 2
No Brasil, as instituições financiadoras são poucas. Restam as empresas e o cidadão comum com o desejo e colaborar.
Chegar até uma empresa é fácil. Difícil é ser atendido e ser ouvido. Chegar até uma pessoa também é relativamente fácil. Complicado é conseguir que ela faça uma doação e, mesmo que consiga, provavelmente será de valor inferior ao que se precisa. Ou seja, precisaria chegar a um número suficientemente grande de pessoas para atingir algo razoável e torcer para que elas colaborem regularmente.
A questão é: como abrir canais de comunicação com as empresas e com pessoas dispostas a participar? Vê-se que não basta ser reconhecido, ou melhor, ter uma marca reconhecida apenas em seu círculo de relações. Não ajuda ser um nome que não seja reconhecido ao ser apresentado. O projeto pode ser genial e repleto de prêmios, as dúvidas e os questionamentos serão sempre os mesmos. Isso quer dizer que poucas pessoas doam às cegas. Muitas pessoas dizem que doar é um ato de amor. É verdade, mas acima de tudo é um ato de confiança. Poucas pessoas tiram dinheiro do bolso para doar a quem não conhecem, principalmente se for um intermediário, ou seja, alguém pedindo para uma instituição. Empresa, então, nem se fala. O apelo tem que ser racional. Empresa não tem "coração", isto é, não tem emoções. Bobagem insistir nisso. Um indivíduo quando está em cargo de gerência, não está e nem deve estar sujeito a se emocionar com o dinheiro do acionista. Enfim, um bom caminho é "se apresentar". Comunicar-se, divulgar-se.
Que nome vem primeiro à mente quando tratamos de uma organização sem fins lucrativos? Sabe-se que ela faz e onde fica? Se todas essas respostas forem positivas, teremos atingido um grau de penetração razoável e, provavelmente, teremos uma ONG que investe em estratégias de comunicação. Isso faz com que ela tenha espaço na mente de beneficiados, doadores, parceiros, financiadores de projetos e sociedade em geral, ou seja, doadores em potencial.
Se a comunicação for bem trabalhada, certamente a instituição estará à frente das demais, principalmente das que vivem à sombra. Comunicação é a base de tudo. Para captar recursos unto a financiadores, por exemplo, a ONG tem que ter credibilidade. Mas como ser crível sem ser conhecida? Para captar recursos a instituição tem que divulgar suas ações. Mais uma vez: que empresa ou indivíduo vai ajudar uma instituição da qual nunca ouviu falar ou ouviu vagamente?
É evidente que notoriedade e credibilidade se constroem com um bom projeto, mas também com um esforço de comunicação. Para conquistar a simpatia do público e ter suas portas abertas é preciso deixá-lo convicto de sua seriedade e de seus resultados. Esse processo é dinâmico e constante, não estaciona em uma única ação, mas em um conjunto de ações conjugadas com a comunicação de resultados concretos.
Os passos são simples e os instrumentos, bem conhecidos, principalmente por que trabalha com marketing: assessoria de imprensa, publicidade e propaganda, relações públicas. Enfim, planejamento estratégico de comunicação integrada de marketing.
É nesse ponto que se esbarra em algo comum a praticamente todas as instituições: a falta de recursos humanos e financeiros para a execução de tais ações. A instituição não tem verba alocada para marketing/comunicação? Mau negócio. Não tem recursos humanos qualificados para tal empreitada? Nem um voluntário? Péssimo. Aliás, não poderia ser pior. Mesmo para instituições que não "precisam" deste tipo de ação. Afinal, prestação de contas não é apenas enviar um relatório com a aplicação dos recursos. Transparência não é convidá-lo para festas ou visitas. Hoje, doador; amanhã, ex. Como fica?
Se comunicação de marketing não fosse importante, empresas não gastariam bilhões de dólares nisso. Se não fosse importante para o terceiro setor, ninguém saberia nada ou muito pouco sobre as, dizem, 250 mil instituições que existem no Brasil3. O dinheiro está escasso e, quando isso acontece, a concorrência aumenta. Portanto, é hora de investir mais. E nessa hora o gestor social, mesmo que não "transforme" seu projeto em produto, tem que mudar seus paradigmas e enxergar que marketing não é venda, e comunicação é fundamental.
O uso das ferramentas
Pode-se aplicar o mix da seguinte forma:
Propaganda
Pelo que já foi apresentado, a construção de uma imagem forte é indiscutivelmente importante no terceiro setor. Antes mesmo de solicitar recursos para o seu projeto uma instituição deve apresentar "garantias" do retorno desse investimento feito pelo doador. Normalmente, isso passa pela sensação de segurança gerada pelo desenvolvimento adequado da marca da instituição.
Como são muitas as formas e utilizações da propaganda seria muito extenso apontá-las e sucinto demais ao generalizá-las. Ainda assim, pode-se afirmar que as suas características são inigualáveis quanto ao impacto que tem no público algo. Tem forte apelo e penetração. O custo, muitas vezes proibitivo para uma instituição, faz com que seja utilizado, principalmente, em campanhas institucionais.
Promoção de vendas
O conceito de promoção de vendas passa pela concessão de algo para o público alvo com o intuito de concretizar o negócio imediatamente. Deve ainda ter prazo estabelecido para o seu término, caso contrário a ação perde a credibilidade, pela disponibilidade eterna do benefício.
O uso da promoção de vendas por instituições sem fins lucrativos é bem complexo. Essa ferramenta é para uso da captação de recursos e a sua aplicação não cabe em qualquer plano sério de captação. No entanto, pode-se pensar em uma linha de produtos vendidos por uma ONG e a partir daí elaborar o processo natural de venda e promoção de vendas.
Relações públicas e assessoria de imprensa
É destinada não apenas para promover, mas para proteger a imagem de uma organização. Se em um negócio "com fins lucrativos" essa ferramenta costuma ser relegada ao segundo plano, em uma ONG isso não ocorre. Como transmite alta credibilidade, devido às suas características de "espontaneidade" e pela tendência da população em geral a crer em matérias e entrevistas mais do que anúncios, o seu uso é obrigatório no terceiro setor.
Marketing direto
Não costuma ser uma ferramenta com custo acessível, mesmo com o advento da internet. Para ser eficiente exige a manutenção de um banco de dados atualizado e sistemas que permitam a personalização e interatividade.
O custo é proibitivo para ONGs se não for utilizado pela internet ou exclusivamente por telemarketing. Aliás, por mais detestado que o telemarketing seja para muitos, existem instituições que utilizam e estão satisfeitas. A questão é que os métodos de pressão e sedução são eficientes no público alvo, por mais constrangedor que possa parecer para o mercado atual. Apadrinhamento, relatos, dramas e afins têm seu mercado.
Eventos e experiências
Categoria que foi destacada de Relações Públicas e assessoria de imprensa pelas características bem específicas. É capaz de envolver o público alvo sem a agressividade direta da venda e por colocar o potencial doador em contato pessoal com a causa em questão.
Nos Estados Unidos, é largamente utilizado para captação de recursos. No Brasil, nem tanto. No entanto, ONGs ativas na defesa de sua causa costumam utilizar para enviar a sua mensagem e, em harmonia com a assessoria de imprensa, conseguir espaços na mídia. Os resultados para a construção de uma imagem positiva ou simplesmente para relacionar a instituição à causa costumam ser satisfatórios.
Venda pessoal
Caracterizada pela interação entre as partes. A capacidade de observar respostas e reações do interlocutor e poder argumentar estabelecendo um relacionamento, muitas vezes, pessoal tornam essa ferramenta muito eficaz. A linguagem corporal e todos os elementos que compõem uma apresentação não podem ser desprezados, principalmente no terceiro setor.
Utilizada em abundância por instituições sem fins lucrativos para captar recursos, essa ferramenta é fundamental para transmitir credibilidade e desconstruir obstáculos à doação. A figura do captador de recursos é onipresente. Praticamente todos trabalham em função disso. Mesmo que não seja o captador de direito, todo são de fato.
Materiais utilizados e as suas conseqüências
A prática de instituições não revela um quadro rico e diversificado no que diz respeito ao uso pleno de todas as ferramentas. Os recursos nem sempre permitem, principalmente porque a grande maioria das instituições é de pequeno porte, quando não são iniciativas desprovidas quase que totalmente de recursos.
Observe a seguinte tabela:
Materiais de comunicação mais comuns de uma ONG
Material: Folder ou folheto.
Importância, uso e freqüência: Esse tipo de material é quase uma obsessão. Vai produzir em comunicação? Certamente, vão incluir um desses.
Sua importância deriva do fato de que pode ser uma opção barata e de fácil utilização.
Material: Relatório de atividades.
Importância, uso e freqüência: Muito importante por colaborar para a aferição do grau de transparência da instituição e como prestação de contas, mas nem sempre é produzido de forma que se transforme em uma peça de comunicação atraente, utilizando linguagem árida e com informações irrelevantes.
Instituições de pequeno porte fazem pouco uso, mesmo com a possibilidade recente de gerar um arquivo digital e disponibilizá-lo na internet.
Material: Vídeo institucional.
Importância, uso e freqüência: Costumava ser mais raro, pois demandava equipamento e produção adequada para não transformar o momento da magia em tortura.
Hoje em dia, com o mercado inundado de câmeras, costuma surgir com mais freqüência algo próximo de um vídeo institucional que sirva para apresentar algo.
Possibilita ao parceiro, doador ou quem quer que seja que não tenha possibilidade de estar in loco de tangibilizar o trabalho.
Material: Site.
Importância, uso e freqüência: Difícil encontrar instituição que não tenha pelo menos um, mesmo que simplório.
Principal ponto de contato atual. Não ter o cuidado de ter um bem desenvolvido pode parecer desleixo.
Material: Boletim.
Importância, uso e freqüência: Tanto impresso quanto eletrônico é bem comum uma instituição ter. Ou pelo menos já teve.
É bom para desenvolver relacionamento e prestação de contas.
Material: E-mail marketing.
Importância, uso e freqüência: O spam4 levou a um controle maior de para quem é enviado. Antes era usado indiscriminadamente por muita instituição. Passou a fazer parte de uma estratégia de relacionamento.
Existem outras mídias interessantes e exploradas com maestria como camisetas, faixas, placas, cartões de visita, mídias alternativas em geral. Retirar água de cinza é com ONG mesmo. Na ausência dos recursos, simplesmente dão um jeito. Dão um "jeito" ... Essa virtude pode ser um problema. Os materiais acima relacionados devem ser levados a sério. É impressionante a quantidade de "amigos" ou "filhos" que "entendem" e fazem tudo voluntariamente. A situação piora quando se trata de internet. Mais vale um material bem feito e que impressione do que vários que "quebram o galho". Eles simplesmente vão depor contra e o esforço terá sido em vão.
O ideal é ter uma agência de publicidade para fazer isso, pois a comunicação é vital para a sua sobrevivência e deve ser levada a sério. Ocorre que muitas pessoas, quando fazem uma doação, desejam que a verba seja aplicada na questão que as sensibilizou. Tais doadores não compreendem que uma instituição é um empreendimento e precisa de outros departamentos inerentes a qualquer negócio para gerenciar os recursos que lhe são confiados.
Normalmente, ninguém se queixa que parte do dinheiro seja destinada, por exemplo, para uma empresa responsável pela contabilidade da organização. Mas, quando entra em cena a comunicação, costuma incomodar a aplicação dos valores captados. Falta a percepção de que foi graças à comunicação que, certamente, esse doador chegou até a instituição.
Não existe nenhum problema em contratar profissionais para fazer isso. O que não pode acontecer é o desperdício de recursos. Aliás, como quem qualquer negócio, se uma agência de publicidade for contratada e remunerada por isso, o que importa é o resultado positivo ao final dos trabalhos.
O problema é que se entende que a própria agência poderia doar o seu trabalho. É o mesmo equívoco de sempre. "Se podemos ter de graça, por que pagar?". Porque "cavalo dado não se olha os dentes". Em linguagem menos coloquial, porque problemas podem acontecer no relacionamento com uma agência. Por exemplo, em uma campanha qualquer se tende a aceitar um trabalho abaixo das expectativas porque os prazos estouraram ou porque é doado. Outro problema comum é a falta de uma data-limite para a veiculação. Além disso, quando a preocupação é maior (da agência) em prêmios do que no resultado em si da campanha, pode gerar idéias inadequadas aos objetivos e ao posicionamento da instituição.
O ideal é construir a parceria certa com boa dose de comunicação clara e transparente. Se a instituição irá trabalhar com uma agência que não está interessada em dar um tratamento profissional ao trabalho, talvez esta não seja a parceria ideal. A agência tem que entender o quanto é importante a campanha ou o material a ser produzido para o seu cliente.
Outro problema é que não é possível controlar uma campanha bonificada5. Não existe exatamente um planejamento de mídia para esse tipo de ação. São oportunidades de veiculação que surgem. É tarefa ingrata e, diante da impossibilidade de medição de resultados, controle de veiculação etc., deve ser tratada como um plus, ou seja, algo que se vier será bem-vindo.
Uma agência tem um dia a dia corrido e atribulado. Deve-se entender que ela existe para gerar lucro para o seu proprietário. O trabalho doado por ela certamente deixa de ser prioridade quando algo remunerado surge. No entanto, basta uma dose de visão de negócios para perceber que aquele trabalho voluntário, para a instituição, pode ser uma ótima alternativa de divulgação institucional positiva. Conseqüentemente, pode gerar novos negócios e até mesmo prêmios.
Contratar um profissional é sempre a melhor escolha, mas algumas instituições preferem trabalhar com um voluntário, umas por falta de recursos, outras por falta de visão. Sendo mais sintético, se o que a instituição desejar for prioritário, melhor contratar. Se for algo periférico ou adicional, opte pelo voluntário. Observe que na maior parte dos casos, a comunicação voluntária não é eficiente se agir isoladamente, portanto, deve-se ter o cuidado de tentar articular o que for possível.
Se contratar um profissional, exige sim um perfil adequado para o profissional de comunicação que trabalha no terceiro setor. Deve ser criativo, ético, paciente e conseguir equilibrar-se com orçamentos escassos. Fora isso, a qualificação técnica exigida é a mesma que a de profissionais que trabalham em comunicação nos demais setores.
Pode-se perceber que tudo isso leva ao caminho do planejamento, definição de estratégias e de um orçamento para a comunicação. Contudo, se não for percebido como prioridade para a organização, é possível trabalhar sem orçamento definido. Trabalhar com voluntários e com a doação de materiais traz a enorme vantagem do baixo custo. Por outro lado, esse custo se reflete no resultado final, na maioria das vezes, no quesito qualidade. Como executar um planejamento baseado na boa vontade e disponibilidade de terceiros? Mesmo quando o trabalho é pago, existem inúmeras dificuldades que podem atrapalhar o resultado final. Inserir mais uma variável e dessa magnitude e ainda querer atingir o mesmo resultado é não entender como funcionam as engrenagens de um trabalho voluntário e de uma doação.
Tal qual uma empresa com fins lucrativos, uma ONG deve se estruturar para desenvolver um plano anual de comunicação. E quando falamos em comunicação, falamos no sentido total da palavra. Usar meios e veículos certos com a mensagem precisa, no tempo adequado, para o público certo é de suma importância. Por exemplo, nem sempre estar na televisão pode ser a melhor opção. Assim como enviar a mensagem certa para o veículo errado pode significar mais problema que solução. O planejamento deixará claro o que se pretende. Nele, inclusive, pode estar estabelecido o que pode aceitar como doação ou voluntariado e o nível de qualidade aceita.
Não se pode esquecer que uma ONG, por natureza, é uma organização de estrutura horizontal. Ou seja, a participação de todos é fundamental na criação e condução do trabalho. Nesse sentido, a comunicação interna permite consolidar os conceitos trabalhados, determinar posturas de ação e viabilizar a operação da instituição. Todos os stakeholders6, normalmente, são consultados, ou, no mínimo, informados do que está sendo feito. A eficiência do sistema interno de comunicação é o ponto-chave para atingir os objetivos traçados.
Algumas considerações importantes para o planejamento
Campanhas institucionais x captação de recursos
Uma campanha de comunicação de uma ONG não tem que obrigatoriamente ser institucional. Quando se faz uma campanha para estimular a venda de um produto não dizemos que é institucional. Quando uma instituição pede recursos pra um projeto, ela está vendendo o projeto, apontando, por exemplo, vantagens, benefícios e resultados. A lógica é a mesma. Quando alguém doa para uma instituição, ela está adquirindo, ou ainda, comprando algo (status, satisfação, visibilidade, posicionamento etc.). Ela pode, inclusive, estar divulgando um produto ou serviço dela como forma de captação de recurso.
Muitas instituições fazem um mix de institucional com captação. Elas estão apenas cumprindo uma "regra" de que trabalha nessa área: peça sempre. Não está exatamente errado. Mas a mensagem dever ser precisa para atingir o resultado desejado. Pedir na hora de agradecer pode não ser uma coisa muito inteligente. Buscar a conscientização da sociedade para uma questão sobre meio ambiente e pedir dinheiro tampouco o é.
Personalização de imagem
Se o indivíduo em questão for uma figura relevante abrirá muito mais oportunidades. A desvantagem é a mesma de qualquer negócio que depende, por exemplo, de um único cliente ou fornecedor. Sem contar que um está ligado ao outro. O que afetar a uma das partes irá afetar a outra. Um outro ponto importante é que a instituição provavelmente deve resistir mais ao tempo do que um indivíduo.
No curto prazo existem vantagens. Contudo, a causa deve ser maior do que as pessoas que nelas atuam. Assim, em um primeiro momento, se o líder da organização for uma pessoa carismática, poderá abrir espaço na mídia, conquistar parceiros e captar recursos mais facilmente. No longo prazo, isso pode se inverter, caso a pessoa saia de moda ou tenha alguma postura controversa.
O Briefing7
Certamente, essa palavra surgirá com freqüência. A primeira dificuldade é a própria falta de recursos humanos capacitados nas organizações a elaborarem um briefing. Poucas instituições, normalmente as maiores, têm um profissional de comunicação em seus quadros fixos ou de voluntários. Do lado da agência, falta conhecimento específico das características do setor que, algumas vezes, mantém uma postura assistencialista. O resultado disso, normalmente, é um briefing insuficiente e ineficaz. Dependerá muito da sensibilidade e criatividade do diretor de criação.
Para construir um briefing adequado algumas considerações precisam ser feitas. A primeira delas é construir um que seja bem mais prático. Mesmo assim, devemos dar especial atenção ao produto, concorrência, background, objetivos, target, posicionamento, ações de comunicação desejada e verba. O briefing deve ser útil, relevante para a criação das peças. O que não for importante deve ser tirado. Poderia confundir mais do que embasar.
Planejar, planejar, planejar
É comum o uso de assessoria de imprensa, contudo, não significa dizer que isso é suficiente. Algumas vezes, a instituição faz uso de outras ferramentas, mas não percebe. Confunde a comunicação com propaganda em mídias como televisão, outdoor, entre outras. O simples fato de enviar um relatório de prestação de contas para um financiador é uma ação de comunicação e relacionamento institucional. Produzir folhetos e boletins, idem. A questão central é planejar a comunicação e, aí sim, verificar o que é mais adequado aos objetivos e metas traçados. Então, definir objetivos e metas passa a ser prioridade para o planejamento de sucesso, pois, para quem não sabe aonde vai, qualquer lugar serve.
Conhecer
Não tem cabimento delegar o planejamento para quem não conhece a instituição ou o projeto. Se o profissional que irá planejar não conhecer a fundo o objeto do planejamento, será complicado. Compreender a ONG ou o projeto significa saber dissecar a sua proposta de trabalho, entender o seu posicionamento, identificar os seus stakeholders e ganhar com isso possibilidades reais de alcançar o resultado desejado.
Avaliar
Os indicadores de sucesso de comunicação dependerão dos objetivos desejados e de qual é a campanha tratada. Um indicador, por exemplo, é o share of mind8 dentro do público-alvo. Outro, mais difícil, é o de transformação de hábitos culturais como em campanhas de reciclagem, de uso de camisinha etc. Portanto, depende do que se quer comunicar.
Dados de resultados de campanhas no Brasil
Quando se trata de campanhas de captação isso é sempre complicado. Na maior parte dos casos, o montante arrecadado não é divulgado. No que diz respeito a divulgar o que se gastou e arrecadou a questão se torna mais crítica. Uns gestores consideram isso um dado estratégico. Outros não fazem porque não têm um controle efetivo da contabilidade da instituição. Quando se trata de campanhas institucionais é quase a mesma coisa. Contudo, os resultados gerados pela ONG (número de pessoas atendidas, índices de desempenho etc.) são, normalmente, divulgados por ser uma forma de apresentar o impacto e a importância da instituição.
Conclusão
Não seria estranho captar recursos para viabilizar a comunicação, por mais esquizofrênico que isso possa parecer, pois se a instituição irá captar, e já é difícil isso porque destinar para a comunicação e não para aplicar a sua atividade fim? Porque seria razoável captar um valor menor para multiplicá-lo no mercado captando mais de terceiros. No entanto, isso não costuma ser feito, pelo menos no Brasil.
Ainda que a comunicação seja percebida como relevante internamente, ela necessita analisar e tentar identificar as reações da sociedade em que está inserida buscando escapar da percepção de desperdício de recursos. Para Goldschimidt9, a "comunicação pode consumir recursos financeiros significativos e, desta forma, deve ser planejada criteriosamente para que a organização obtenha os resultados desejados." Não é possível alcançar resultado positivo se o público alvo tiver a sensação de desperdício de recursos.
Planejar a aplicação dos recursos na falta desses é difícil em qualquer negócio. O importante é conduzir o planejamento de forma criativa e integrada. As ferramentas existem não para uma prescindir da outra, mas para serem integradas, complementando ou ampliando a mensagem a ser transmitida.
O surgimento de novos tipos de mídia na década de 1990 e o aumento da sofisticação dos consumidores ampliou a discussão em torno da comunicação integrada de marketing (CIM). Segundo OGDEN (2002:4),
"Comunicação integrada de marketing é uma expansão do elemento de promoção do mix de marketing. Ela é essencialmente o reconhecimento da importância de comunicar a mesma mensagem para os mercados-alvo, o reconhecimento de que todas as variáveis da CIM comunicam algo e que existe uma sobreposição na comunicação que essas variáveis fornecem. Cada uma das variáveis da CIM afeta o programa de marketing como um todo, de modo que, para garantir a eficácia, todas devem ser gerenciadas".
Entenda-se por expansão, o aumento do grau de consciência da necessidade de transmitir uma mensagem coesa, independentemente da ferramenta de comunicação utilizada, com o objetivo de criar consistência na comunicação.
Kunsch, citada por Casali10 compreende que a
"(...) comunicação integrada passa a ser uma arma estratégica para a sobrevivência e o desempenho de uma organização em uma realidade complexa e que se altera de forma muito rápida. Hoje em dia, não é possível mais pensar de forma isolada, sem o envolvimento de todas as subáreas da organização."
Isso significa que o conceito de comunicação integrada busca a interação entre profissionais de diferentes áreas e o planejamento das ações de comunicação sintonizando os conteúdos das mensagens e transmitindo uma mensagem única em diferentes ferramentas de comunicação. Não se trata de uma repetição enfadonha do conteúdo, mas a centralização de uma comunicação. Em geral, a mensagem pode transmitir informações distintas em cada veículo ou mídia. Esses podem atuar de forma a complementar ou reforçar a mensagem.
Pode-se organizar o raciocínio cumprindo oito passos para desenvolver uma comunicação eficaz (KOTLER E KELLER, 2006:539):
1. Identificar o público-alvo;
2. Determinar os objetivos;
3. Elaborar a mensagem;
4. Estabelecer o orçamento;
5. Decidir as ferramentas do mix de comunicação que serão utilizadas;
6. Medir os resultados da comunicação;
7. Gerenciar o processo de comunicação integrada de marketing.
Não podemos esquecer que é necessário levantar os pontos de contato do público alvo com a instituição. Assim como a instituição se dirige ativamente até o potencial doador, passivamente isso também pode acontecer, de forma planejada ou não. Torna-se, portanto, útil a avaliação dos tipos de experiências e exposições que porventura venham a acontecer. Isso vale desde o anúncio publicado até as vestimentas ou o tapete que pode estar na recepção. Essa compreensão ajudará a empresa a distribuir melhor os seus recursos.
Percebe-se, portanto, que a construção de uma estratégia de comunicação, com resultados sólidos e satisfatórios, e a sua implementação, exigem não apenas recursos, mas um esforço para quebrar barreiras internas e culturais para torná-la uma realidade.
Uma ação social sem uma boa comunicação11 não é inviabilizada. Contudo, pode não gerar o impacto ou resultado desejado. Como as verbas já são curtas, tudo que possa ser feito para ampliar a eficácia das ações sociais deve ser tentado. O importante nisso tudo é ter a consciência de que a comunicação não pode ser o resultado das oportunidades surgidas, tampouco o espasmo da obrigação (recursos acabando, patrocinador não renovando convênio etc.) Tanta passividade certamente será punida quando chegar a hora da verdade12, ou seja, a hora em que a instituição precisar captar recursos e a realidade demonstrar que ela não está preparada para isso.
1. É discutível a questão da década de 1980 ser considerada a "década perdida". No entanto, é do conhecimento geral os problemas enfrentados pelo mercado financeiro internacional e seus reflexos no Brasil.
2. www.unesco.org.uy. Acessado em 10/05/2007.
3. Esse número parece ser um consenso. Não existem levantamentos precisos quanto a isso. Se o interessado for pesquisar fontes irá encontrar dados que variam de 200 a 400 mil instituições no Brasil.
4. Spam é uma mensagem enviada sem consentimento do destinatário.
5. Uma companha é chamada de bonificada quando a veiculação das peças é gratuita. O espaço de inserção na mídia foi doado pelo veículo de comunicação.
6. Stakeholders são todos os impactados e interessados direta e indiretamente por um negócio e que afetam estrategicamente o mesmo. De forma geral, podemos dizer que são stakeholders os seguintes atores: fornecedores, clientes, comunidade, sociedade civil, governo etc.
Para uma ONG são os mesmos, mas podemos acrescentar voluntários, beneficiários, parceiros.
7. Briefing é um documento utilizado pelas agências de comunicação para levantar as necessidades, o objetivo do cliente, as características do produto ou serviço a ser divulgado, as informações de mercado, a concorrência, o público-alvo e os demais detalhes importantes para a criação de uma campanha de comunicação. Ou seja, o que for relevante para a elaboração da estratégia e das peças.
Segundo SAMPAIO (2003): "O briefing ocorre todas as vezes que uma informação passa de um ponto para outro e o propósito de organizá-lo corretamente é o de assegurar a passagem da informação certa - da pessoa certa para a pessoa certa - na hora certa, da maneira certa com o custo certo. O sucesso ou fracasso dessa operação depende, é claro, de saber o que é certo no contexto, pois o que é certo para uma situação pode não ser certo para outra.".
8. Para RABAÇA (2001), Shire of mind é a medida de aferição do conhecimento da marca de um produto ou instituição que um determinado público tem na memória em um dado momento.
Marca é o conjunto formado pelo nome, logo, cores, e tipologia. Esses elementos devem representar, simbolicamente, os valores da instituição e seu posicionamento.
9. GOLDSCHIMIDT, Andréa. Estratégias de comunicação para o terceiro setor. CETS - Centro de Estudos do Terceiro Setor - FGV Revista Integração. Revista Integração. Acessado em 06/11/2006.
10. CASALI, Adriana Machado. Comunicação Integrada e novas tecnologias de informação. Disponível em www.eca.usp.br. Acessado em 21/08/2005.
11. Existem bons exemplos de comunicação no terceiro setor: a campanha do Betinho é um grande exemplo nacional. Além disso, instituições como Doutores da Alegria, GreenPeace, World Wild Foundation, Médicos sem Fronteiras e tantos outros costumam fazer trabalhos de primeira linha.
12. A hora da verdade é um livro escrito por Jan Carloz, publicado no Brasil pela Sextante. A "hora da verdade", para o autor, é o momento em que o cliente entra em contato com o pessoal da linha de frente: é nessas ocasiões que ele forma sua imagem da empresa e é essa experiência que o faz voltar ou não a procurar os seus serviços.
Referências
CARLZON, Jan. A hora da verdade. São Paulo, Editora Sextante, 2005.
CASALI, Adriana Machado. Comunicação Integrada e novas tecnologias de informação. Disponível em www.eca.usp.br. Acessado em 21/08/2005.
COSTA, Eduardo Antonio Resende Homem da. Comunicação e Terceiro Setor. Rede de Informações para o Terceiro Setor: www.rits.org.br, outubro de 2004.
COSTA, Eduardo Homem da; MURAD, Eduardo. Marketing Social e Cultural: apontamentos para aula. Apostila. 2005.
FRAGA, Paulo César Pontes. As ONGs e o espaço público no Brasil. Unesco. Disponível em http://www.unesco.org.uy. Acessado em 10/05/2007.
GOLDSCHIMIDT, Andréa. Estratégias de comunicação para o terceiro setor. CETS - Centro de Estudos do Terceiro Setor - FGV Revista Integração. Revista Integração. Acessado em 06/11/2006.
KELLER, Kevin Lane, KOTLER, Philip. Administração de Marketing. 12ª ed. Pearson Prentice Hall, 2006.
LUPETTI, MARCÉLIA. Planejamento de Comunicação. São Paulo: Futura, 2000.
OGDEN, James R. Comunicação integrada de marketing. São Paulo: Prentice Hall, 2002.
RABAÇA, Carlos Alberto; BARBOSA, Gustavo. Dicionário de comunicação. 2ª ed. Revista e atualizada. Rio de Janeiro, Campus, 2001.
* Eduardo Homem da Costa - Pós-graduado em marketing pela ESPM, graduado em Relações Internacionais pela Universidade Estácio de Sá. Atuou nos últimos dez anos no terceiro setor como superintendente da Cruzada do Menor e assessor de instituições como Grupo Pela Vidda.
Professor das graduações em Marketing, Comunicação Social, Gestão em Tecnologia da Informação, da pós-graduação em Comunicação Empresarial da Universidade Estácio de Sá e do MBA em Responsabilidade Social do Latec/UFF.
Autor do livro Fundamentos de Responsabilidade Social.
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