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TIE - pontes para a comunicação estratégica de ONGs

Autor original: Viviane Gomes

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Depois de cinco anos trabalhando como publicitária em Londres, a canadense Philippa White decidiu aplicar suas competências em iniciativas de intercâmbios internacionais. Ela deixou o emprego numa grande agência londrina e mudou-se para Olinda (PE) para se dedicar exclusivamente à TIE [The International Exchange]. A organização promove a vinda ao Brasil de profissionais de comunicação do Reino Unido, que, junto com agências publicitárias locais, elaboram projetos de comunicação para entidades sociais brasileiras.

“Todo mundo ganha. As agências locais têm a oportunidade de interagir com profissionais que conhecem um mercado diferente. Os visitantes ganham experiência de vida. E as ONGs acabam com um projeto de comunicação qualificado, que vai trazer resultados para a sua prática”, afirma Philippa White.

A Rets conversou com Philippa e com Ryan Fisher, publicitário inglês da Wieden + Kennedy que está em Recife para produzir uma campanha de divulgação do projeto 'Cozinha Solidária' da ONG GTP+. Os publicitários compartilharam sua visão sobre a importância da comunicação para organizações não-governamentais e contaram como a experiência do intercâmbio enriquece as organizações e os voluntários.

Para participar da proposta da TIE, a organização brasileira precisa ter um trabalho reconhecido, sede própria e uma pessoa de referência que possa se comunicar em inglês. Não há custos financeiros para a ONG, mas há o compromisso de auxiliar o visitante em sua empreitada. A fase piloto do projeto aconteceu no ano passado, quando Chris Jackson, da Leo Burnett, juntamente com a agência Mart Pet, elaborou uma campanha de mobilização de recursos para a ONG pernambucana Gestos. Logo depois, Penny Brough, profissional de atendimento da Wieden + Kennedy, trabalhou junto com a agência brasileira Arcos Comunicação na divulgação dos projetos da Plan International, entidade sediada em Cabo de Santo Agostinho.

A experiência foi tão boa que o número de agências britânicas interessadas em participar do projeto vem crescendo bastante. Em 2009, seis profissionais ingleses deverão vir ao Brasil para desenvolver projetos de comunicação. Em 2010, esse número deve subir para 15. De acordo com Philippa, a idéia agora é reforçar o trabalho promovendo novas parcerias locais – entre ONGs e agências – para que a demanda também aumente.

Rets -Como surgiu a idéia de criar uma entidade para articular o trabalho de voluntários ingleses junto a organizações brasileiras?

Philippa White - Depois de cinco anos de carreira como publicitária em Londres, eu percebi que poderia fazer mais com as competências que eu havia desenvolvido. Após conversar com alguns colegas sobre experiências de intercâmbio internacional, percebi que não era a única com este sentimento. Também me dei conta da necessidade de assistência em comunicação no mundo das ONGs. Parecia haver um número significativo de organizações em países em desenvolvimento que poderiam beneficiar-se bastante de um apoio profissional em comunicação.

Vi também a oportunidade de propiciar uma formação diferente a profissionais de comunicação do Reino Unido. Percebi que tirá-los de suas rotinas e colocá-los para trabalhar numa cultura diferente, com pessoas diferentes, com pouco tempo e em circunstâncias desafiadoras, realmente os ajuda a desenvolver suas competências, especialmente para lidar com questões como desenvolvimento e direitos humanos.

Com a TIE, promovemos uma troca de idéias, experiências e práticas. Na verdade, temos uma troca de realidades. Acho que é uma situação em que todo mundo ganha. Todos têm a oportunidade de desenvolver suas práticas e ainda fazer alguma diferença para a sociedade.

Assim, com o apoio de muitos amigos e conselheiros, depois de muita pesquisa no Brasil e no Reino Unido, nasceu a TIE. Em 2006, recebemos um recurso da Foundation for Social Entrepreneurs, que nos ajudou a iniciar nosso trabalho.

Rets - Quais são os principais benefícios deste tipo de ação para as entidades que recebem os profissionais de comunicação?

Philippa White - Basicamente, tentamos fazer com que as vozes das ONGs sejam ouvidas. Com melhores estratégias de comunicação, as pessoas podem saber mais sobre as organizações e o trabalho que elas fazem. Por enquanto, o período de desenvolvimento do projeto é de apenas um mês, mas já estamos imaginamos outras formas de se realizar o intercâmbio.

Há muitos benefícios para as organizações que participam da experiência TIE. Na área de advocacy podemos melhorar a visibilidade da luta de grupos específicos - como crianças em situação de rua, pessoas vivendo com o HIV ou pessoas com deficiência, por exemplo. Atuamos com sensibilização a partir do aumento da consciência sobre o trabalho da ONG, dos atores envolvidos, das mensagens principais e dos programas oferecidos. Na promoção, buscamos oferecer mensagens de mudança de comportamento. Em relação às estratégias de influência, nos concentramos em trabalhar com políticas públicas e controle social de ações governamentais. Finalmente, na área de assistência desenvolvemos estratégias para mobilização de recursos.

Há outros benefícios, tais como: intercâmbio de perspectivas e de novas maneiras de pensar; troca de práticas e aprendizados; oportunidade de construir relacionamentos com indivíduos talentosos e organizações de prestígio; construção de relações com profissionais de língua inglesa que podem ajudar na construção de estratégias internacionais de comunicação; promoção de meios de troca de mensagens de países em desenvolvimento para países desenvolvidos, promovendo a conscientização sobre os diversos temas; etc.

Rets - Como você avalia os esforços de comunicação das ONGs brasileiras? É possível fazer um paralelo entre as estratégias de comunicação e captação de recursos entre as entidades sem fins de lucro brasileiras e inglesas?

Philippa White - No Brasil, temos nos relacionado e nos deparado com ONGs que vêem a comunicação de formas completamente diferentes. Vemos desde organizações extremamente competentes e organizadas em suas estratégias de comunicação até aquelas que ainda não se deram conta da necessidade e da importância de ter esse setor bem definido e operante. Como ONGs inglesas e brasileiras lidam com realidades e contextos tão diferentes entre si, não imagino que possamos fazer uma comparação justa entre as duas realidades.

Rets - Quantas organizações o projeto já atendeu? Há previsão de expansão da atividade - tanto para recrutamento de voluntários em outros países quanto para a oferta do serviço para entidades em outros estados brasileiros?

Philippa White - Até agora tivemos duas experiências-piloto. Em 2009, já selecionamos sete profissionais para vir ao Brasil e esperamos que mais alguns sejam incorporados ao projeto. No total, imaginamos trazer oito ou nove pessoas ao Brasil. Em 2010, esperamos que esse número suba para 15.

Assim que tivermos um modelo de negócios operacional em Pernambuco, esperamos nos expandir para outras áreas do Brasil e também para outros países. Uganda e Malawi devem ser os próximos países a receberem o projeto.

Rets - Por que a comunicação é tão importante para as ONGs?

Philippa White - Antes de mais nada porque se trata de um direito humano. Assim como todas as pessoas têm direito à comunicação, os diversos grupos de interesse – entre eles as ONGs – devem também poder tratar de suas demandas na esfera pública da comunicação, ou seja, do direito à comunicação.

Mais até do que uma ferramenta que deve ser usada para informar, mobilizar recursos ou potencializar articulações, os processos de comunicação, quando exercidos de maneira profissional e coordenada, podem fazer com que determinados grupos e segmentos se tornem visíveis na sociedade, facilitando também o acesso aos outros direitos.

Viviane Gomes


Entrevista com Ryan Fisher

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