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A mulher o turbulento início do século 21

Autor original: Viviane Gomes

Seção original: Artigos de opinião

Por: Diva Benevides Pinho*

Exaltada por historiadores e analistas políticos, a “revolução silenciosa” das mulheres teve um pico internacional de “protestos agressivos” na década de 1960, mas tende, atualmente, a buscar a parceria masculina para que ambos possam se fortalecer pela cooperação ao invés de se enfraquecerem pela oposição.

Essa tendência, aliás, já foi destacada pela própria Betty Friedan (2), a grande líder feminista dos EUA nos anos 1960, ao reconhecer, recentemente, que as mudanças no decorrer das últimas décadas impõem a aliança entre homens e mulheres para sua luta contra os efeitos perversos da competitividade da economia de mercado.

1. Do lar para importantes e variadas atividades

No século 20, marcado por intenso e rápido progresso tecnológico, a trajetória do trabalho da mulher passou do limitado mundo do lar e da família para postos de responsabilidade em todos os setores, inclusive naqueles até então considerados domínios exclusivos dos homens. Atualmente, porém, a Internet, modernos notebooks e sofisticados celulares facilitam a combinação de atividades do lar e de prestação de serviços profissionais à distância.

As principais consequências econômicas, sociais e políticas da entrada da mulher no mercado de trabalho tornaram-se mais visíveis quando jovens solteiras e casadas da classe média começaram a se profissionalizar no decorrer do século 20, período que Hobsbawm denominou Era de Ouro (3).

2. Da Era de Ouro à crise no final de 2008

Essa Era teve 30 anos de prosperidade, com início após as grandes catástrofes internacionais do século 20 (duas Grandes Guerras, Grande Depressão, ditaduras nazista, fascista e outras formas de governo autoritário) e término na segunda metade da década 1970, quando a recessão e a estagnação econômica mergulharam o mundo em tumultos e incertezas.

Durante os 30 anos de dinamismo econômico, o mundo ficou mais rico, produziu bens e serviços em grande quantidade e variedade; o padrão de vida melhorou; o progresso nos setores de comunicação e de transporte encurtou as distâncias entre pessoas e nações, entre pensamento e ação. Acelerou-se o crescimento demográfico e, com ele, houve o aumento da população universitária, marcada pela presença feminina, a princípio tímida, mas crescente a partir da década de 1960. A agricultura perdeu espaço para florescentes atividades urbanoindustriais, o êxodo dos rurícolas “inchou” a periferia das metrópoles, e o trabalho do proletariado urbano deixou de ser predominantemente braçal.

Ao mesmo tempo, a Europa se enfraqueceu como polo de poder, riqueza, cultura e civilização e, com ela, o eurocentrismo, enquanto os EUA fortaleceram-se política, econômica e tecnologicamente, ultrapassaram a fase do bipolarismo com a implosão da URSS e dominaram hegemonicamente o mundo até a decadência da “era Bush” e o surgimento de novas perspectivas com a eleição de Obama (final de 2008).

A “alternativa Barack Obama” nos EUA significou, para o mundo, a esperança em uma "outra América" - corajosa, não violenta, democrática, defensora dos direitos humanos, disposta a aceitar a pluralidade e a reabrir o diálogo com os recém-chegados à cena da história (inclusive países emergentes e “povos inimigos”).

Ainda no final de 2008 houve outro fato importante: a grande reviravolta que abalou a economia mundializada com o estouro da bolha de crédito imobiliário nos EUA (subprime) desencadeando a pior crise mundial desde a Grande Depressão dos anos 1929/30 derrubou Bolsas, espalhou pânico pelos mercados financeiros mundiais e sacudiu a economia real de todos os países.

Com o decorrer do tempo, várias rupturas afetaram também – e profundamente – a Família como principal núcleo de continuidade da espécie humana e de sua socialização. A mulher assumiu importantes papéis sociais e profissionais como profissional liberal, empresária, assalariada de empresas públicas e privadas, operária da indústria ou trabalhadora rural. E como mãe, continua sendo importante agente de transmissão de valores e de progresso social.

Todavia, estão ocorrendo várias distorções de difícil correção. Por exemplo, diante da crise que se instala, a atual necessidade de enxugar custos indica tendência de aumento da substituição de homens por mulheres com a mesma escolaridade, nas empresas privadas e públicas, porque elas aceitam remuneração menor.

Mas além da discriminação salarial, persiste a dupla jornada de trabalho das mulheres, apesar de aliviada, atualmente, pela moderna tecnologia aplicada aos trabalhos do lar, bem como as facilidades de “fast food” nas cidades. No Brasil, entretanto, faltam adequadas estruturas de apoio, especialmente creches, transporte escolar, cursos de 1º e 2º graus em tempo integral, programas educacionais que enfoquem o modelo de família e de lar que está sendo esboçado, bem como uma nova divisão de trabalho dos casais no lar, quando ambos trabalham para prover as necessidades da família.

3. Perspectivas e mais Mudanças

3.1. Força política recente

Torna-se também evidente que a força política das mulheres está crescendo desde o aumento do movimento feminista nos EUA, na década de 1960, liderado por elites intelectuais femininas e apoiado por mulheres da classe média e de outros segmentos sociais, em todo o mundo ocidental, inclusive nos países emergentes.

3.2. Grandes mudanças na estrutura da Família

Por outro lado, as mudanças que em todo o mundo, neste final de século, vêm abalando as principais instituições sociais, estão provocando importantes transformações nas características básicas da família, como declínio do casamento formal, enfraquecimento do patriarcado, divisão legal do pátrio poder entre o marido e a esposa, deterioração da família nuclear, que foi o grande modelo da sociedade ocidental nos séculos 19 e 20.

3.3 Outras mudanças

Relativamente aos padrões de conduta sexual, parceria e procriação registra-se o aumento dos divórcios, das separações e do número de mulheres-chefes-do-lar, sem a corresponsabilidade de um companheiro. A crescente profissionalização da mulher impõe a postergação da maternidade até por volta dos 40 anos para que a mulher possa se afirmar, o que aumenta os problemas da distância cultural entre as gerações dos pais e dos filhos.

Ao mesmo tempo, modifica-se o papel da juventude feminina e masculina, que deixa de ser apenas um estágio preparatório para a vida adulta. Aliás, o próprio conceito de idade torna-se multidimensional, desvinculado dos modelos comportamentais rígidos que até então norteavam as sequências das diferentes fases do ciclo da vida humana (infância, adolescência,
maturidade e velhice).

4. Necessidade de Reformulação Organizacional

É cada vez mais urgente a necessidade de formas organizatórias mais abrangentes, tanto no lar quanto nos locais de trabalho, para atendimento da demanda atual das mulheres e casais que trabalham fora o dia inteiro, e também de mulheres sozinhas e homens divorciados ou separados, para que possam assumir, individualmente, a responsabilidade de cuidar dos filhos (consolida-se o modelo da “mãe solteira” e ganha espaço o modelo do “pai solteiro”).

Em síntese, além da necessidade de reformas que ofereçam melhor infraestrutura para a mulher, é preciso reciclar a mulher jovem e adulta para a nova cultura de igualdade do gênero, já que ela é a principal responsável pela transmissão, aos filhos, da herança cultural e dos padrões de comportamento social.

A mulher o turbulento início do século 21 (1). Na Sessão Solene de instalação do I Fórum Nacional de Gênero, Cooperativismo e Associativismo (Brasília, 19 a 21 de novembro de 2008), promovido pelo Ministério da Agricultura, Denacoop e Coordenação de Autogestão Cooperativista, foi homenageada a Profª Drª Diva Benevides Pinho por seus estudos e pesquisas sobre o Gênero Cooperativo.

Ao agradecer às autoridades, a homenageada dirigiu-lhes um apelo de apoio à participação plena e conjunta de mulheres e homens nas atividades das cooperativas, e de priorização da educação e do treinamento como meios de fortalecimento da igualdade do gênero nas cooperativas.

2. Em entrevista à revista brasileira Veja (30/08/1995), Betty Friedan defendeu a necessidade de união entre homens e mulheres para a construção de uma comunidade que transcenda a divergente política de grupos de homens e mulheres separadamente.

3. Hobsbawm, Eric. A era dos extremos. São Paulo: Cia das Letras, 1995.

(*) Economista, advogada e professora titular da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo, Diva Benevides Pinho organizou e presidiu a Comissão de Gênero e Desenvolvimento Integrado em Cooperativas (GEDEIC), da Organização das Cooperativas Brasileiras junto à ACI, durante a gestão de Roberto Rodrigues na direção da Aliança Cooperativa Internacional (Genebra, Suíça), e 1967 a 2000.

Fonte: Fundação de Estudos e Pesquisas Econômicas [Fipe]

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