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Fortalecer a governança da Internet e os processos de políticas digitais
São Paulo, Brasil, 30 de abril de 2024
Preâmbulo
Este é o resultado não vinculante de um processo de baixo para cima, aberto e participativo, envolvendo pessoas de governos, do setor privado, da sociedade civil, da comunidade técnica e do meio acadêmico de todo o mundo. Sua aspiração é fortalecer a governança da Internet e os processos de políticas digitais.
1. Desafios da governança da Internet e dos processos de políticas digitais
De 2014 a 2024: Contexto das Diretrizes de São Paulo Reunidos em São Paulo, Brasil, em abril de 2024, membros da academia, da sociedade civil, de governos e organizações internacionais, do setor privado e da comunidade técnica de todo o mundo reafirmaram a necessidade de melhorar a governança da Internet e os processos de políticas digitais. O evento demonstrou como é possível reunir todas as partes interessadas, indivíduos, culturas, países e economias distintas para enfrentar desafios em comum. Estes desafios transcendem as nossas divergências e só podem ser resolvidos utilizando-se a força dos nossos conflitos, discussões e esperanças para moldar um futuro melhor para todos.
A rápida transformação digital, a inovação contínua e a difusão de inúmeras tecnologias e aplicações baseadas na Internet, incluindo o papel das novas tecnologias digitais e disruptivas, como a Inteligência Artificial, apresentam oportunidades e desafios que afetam as esferas econômica, política e cívica. Estas questões precisam de ser tratadas no âmbito da governança da Internet e dos processos de políticas digitais.
Essas tecnologias oferecem grandes oportunidades para acelerar o desenvolvimento humano, social e econômico e combater as desigualdades, construindo sociedades mais inclusivas. Ao mesmo tempo, se não forem devidamente reguladas, em conformidade com o direito internacional e a legislação internacional de direitos humanos, também podem gerar incertezas, insegurança e assimetrias de poder entre e dentro de países, economias e partes interessadas, aprofundando as brechas, afetando a esfera civil e causando impactos ambientais. Nenhuma parte interessada pode enfrentar estes desafios sozinha.
Mais do que nunca, a governança da Internet e os processos de políticas digitais demandam uma coordenação e uma cooperação sem precedentes entre as partes interessadas para efetivamente disponibilizar os benefícios desta enorme transformação para todos, em qualquer lugar, e para prevenir e remediar os abusos online de forma colaborativa.
Como já destacado em discussões históricas, como a Agenda de Túnis e os “Princípios para processos de governança da Internet” do NETmundial de 2014, a governança da Internet e os processos de políticas digitais devem envolver, de forma plena, o meio acadêmico, a sociedade civil, os governos e as organizações internacionais, o setor privado, a comunidade técnica e os usuários finais. Estes grupos são considerados partes interessadas para efeito das discussões anteriores e atuais.
Para fortalecer os espaços de participação multissetorial, é necessário aperfeiçoar os mecanismos de geração de consenso e de elaboração de diretrizes e recomendações para que as vozes das comunidades tenham impacto nos processos multilaterais e em outros processos de tomada de decisão a fim de encontrar e implementar soluções efetivas para os desafios que enfrentamos.
O evento NETmundial de 2014 foi inovador e estabeleceu um marco significativo na evolução da governança da Internet. Ao nos aproximarmos do 20º aniversário da Cúpula Mundial sobre a Sociedade da Informação (World Summit on the Information Society – WSIS) e da Agenda de Túnis, e uma década depois do NETmundial, é chegada a hora de abordarmos uma questão persistente e ainda não resolvida: como ajudar todos os atores a contribuir em um processo multissetorial para construir uma arquitetura de governança global em rede, centrada nas pessoas, sustentável e orientada para o desenvolvimento, como demanda a sociedade em rede.
Neste contexto, o foco do NETmundial+10 foi reforçar a arquitetura de governança da Internet, reunindo as partes interessadas relevantes para fazer recomendações concretas e não vinculantes de como fortalecer a abordagem multissetorial como base para a geração de consenso e a governança democrática, inclusive nas estruturas multilaterais existentes e em outros fóruns de decisão relevantes.
O NETmundial+10 reafirma os princípios do NETmundial de 2014 para orientar a governança da Internet e os processos de políticas digitais, propõe procedimentos para implementá-los de forma efetiva e oferece informações que podem contribuir para as discussões e a tomada de decisões intergovernamentais, nacionais e regionais sobre o futuro da governança da Internet e dos processos de políticas digitais. O NETmundial+10 reafirma a necessidade de criar uma arquitetura de governança multissetorial eficaz e funcional, que promova o engajamento informado, participativo e transparente das partes interessadas em um modelo multissetorial.
Esta é a melhor forma de contribuir para a construção de um futuro digital que respeite os direitos humanos e as liberdades fundamentais e que promova o progresso para atingir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e para o desenvolvimento de sociedades inclusivas que promovam a paz, a prosperidade e a sustentabilidade ambiental para todos.
Para ajudar a enfrentar esses desafios, o NETmundial+10:
Ratifica a declaração do NETmundial de 2014, que afirma que a Internet é um recurso global que deve ser gerido no interesse público, em conformidade com o direito internacional e a legislação internacional de direitos humanos;
Reconhece a relevância da transparência e da prestação de contas para melhorar a governança da Internet e os processos de políticas digitais;
Reafirma que os 10 princípios para os processos de governança da Internet adotados em 2014 permanecem relevantes e recomenda a sua aplicação no tratamento dos desafios atuais e futuros das políticas digitais;
Propõe diretrizes operacionais para a implementação desses princípios em diferentes situações;
Faz contribuições para diversos processos em andamento relacionados à evolução da arquitetura de governança para as políticas digitais e
Recomenda que os princípios e as diretrizes apresentados neste documento sejam implementados por todas as partes interessadas, em todos os níveis.
Este documento é resultado de um processo colaborativo, aberto e inclusivo. Foi redigido com base em 154 contribuições online por escrito de representantes de governos, do setor privado, da sociedade civil e das comunidades técnica e acadêmica, coletadas em uma consulta pública realizada entre março e abril de 2024. A consulta foi estruturada em torno de três temas principais: Princípios para Processos de Governança Digital, Diretrizes para a Implementação de Mecanismos Multissetoriais e Contribuições para Processos de Governança em Andamento.
Com base na consulta realizada, também foram reunidas valiosas contribuições de mais de 700 participantes presenciais e online durante os dois dias do evento.
2. Princípios para Governança da Internet e Processos de Políticas Digitais
2.1. Os princípios de processo do NETmundial 2014 resistiram ao tempo
Princípios de Processo de Governança da Internet do NETmundial 2014
https://www.cgi.br/media/docs/publicacoes/4/Documento_NETmundial_pt.pdf
Multissetorial
Aberto, participativo e orientado por consenso
Transparente
Responsável
Inclusivo e equitativo
Compartilhado
Distribuído
Habilitador da participação significativa
Acesso e barreiras mínimas
Agilidade
O encontro NETmundial de 2014 adotou um amplo conjunto de princípios fundamentais para orientar a governança da Internet. Também adotou um conjunto específico de dez Princípios para processos de governança da Internet (os Princípios de Processo), que foram o foco principal do NETmundial+10. Estes Princípios de Processo descrevem como o sistema de Governança da Internet deve ser aplicado em todo o escopo de tecnologias e de questões de políticas públicas relacionadas à Internet. Continuam a definir como manter a Internet aberta e interoperável – responsabilidade fundamental e valor central da governança da Internet e dos processos de políticas digitais.
Mesmo com as rápidas transformações técnicas, sociais e econômicas que ocorreram desde então, estes Princípios de Processo permanecem relevantes e válidos para tratar os desafios atuais da governança da Internet e das políticas digitais. Representam uma referência única e relevante para todas as partes interessadas de como a governança da Internet e os processos de políticas digitais devem ser definidos. Como ainda não foram totalmente implementados, a sua plena aplicação demanda esforços colaborativos, que ofereçam mais e melhores oportunidades para que todas as partes interessadas participem de forma relevante, especialmente em mecanismos multilaterais de política digital.
Os Princípios de Processo da NETmundial 2014 devem ser a base de qualquer evolução futura da governança da Internet e dos processos de políticas digitais e é fundamental que todos os interessados os implementem em sua totalidade, como visão compartilhada desta comunidade.
2.2. O princípio de processo “multissetorial” precisa ser plenamente implementado por todas as partes interessadas
Segundo o texto do Princípio de Processo de 2014 relativo a multissetorialismo:
Multissetorial: a governança da Internet deve ser construída através de processos democráticos multissetoriais, assegurando a participação significativa e responsável de todos os intervenientes, incluindo governos, setor privado, sociedade civil, a comunidade técnica, a comunidade acadêmica e usuários. Os respectivos papéis e responsabilidades das partes interessadas devem ser interpretados de modo flexível em relação aos temas em discussão.
Cada parte interessada tem diferentes papéis e responsabilidades, dependendo dos temas e das etapas de cada processo. A distribuição de papéis e responsabilidades entre as partes interessadas é um tema de debate contínuo (e controverso).
É preocupante que inúmeros processos de governança ainda não conseguem aplicar adequadamente o Princípio de Processo multissetorial, especialmente devido à falta de participação inclusiva e significativa de todas as partes interessadas relevantes. Incluir todas as partes interessadas relevantes no processo de tomada de decisão, em genuíno pé de igualdade, pode, de fato, ser essencial para evitar o fracasso.
As abordagens multissetoriais à governança da Internet e aos processos de políticas digitais funcionam melhor quando são inclusivas e quando as partes interessadas identificam o seu próprio interesse em um tema e participam dos processos para tratá-lo. São bem-sucedidas quando há atitude de abertura a novas ideias e disposição – de todas as partes interessadas envolvidas – de entender os pontos de vista dos outros e de fazer concessões para chegar a um consenso.
Para obter maiores benefícios da governança da Internet e dos processos de políticas digitais, os papéis e as responsabilidades das partes interessadas devem ser interpretados de forma flexível e aberta. Setores, organizações e indivíduos não devem ser excluídos de um determinado processo em razão de categorizações desatualizadas, sugeridas no passado.
Dito isto, um componente essencial para proteger e melhorar tais processos é garantir que incorporem as formas relevantes de conhecimento e de experiência necessárias durante as diferentes fases da discussão de uma questão específica. A capacitação é essencial para melhorar a compreensão e aumentar a capacidade das partes interessadas participarem em pé de igualdade. Isto também demanda uma análise realista das – e uma resposta às – assimetrias de poder entre e dentro das partes interessadas em uma discussão.
2.3. A coordenação dos espaços de governança é essencial
Surgiram diversas iniciativas e processos para tratar a ampla gama de questões decorrentes da transformação digital. Às vezes, vários processos tratam das mesmas questões em paralelo, o que tem impactos positivos e negativos.
Iniciativas dispersas para tratar uma determinada questão permitem a inclusão de abordagens e perspectivas diversas. Por outro lado, existe o risco de que discussões em separado sobre uma questão específica gerem resultados incompatíveis e até contraditórios. Também dificultam o acompanhamento de processos simultâneos e duplicados pelos interessados, especialmente os do Sul Global.
É importante evitar a fragmentação e a duplicação de fóruns para garantir a eficácia da governança da Internet e dos processos de políticas digitais. Por isso, é fundamental que haja maior coordenação entre processos que tratam de questões que se sobrepõem.
O Fórum de Governança da Internet (IGF) pode desempenhar esse papel ao fortalecer suas funções de coordenação e de compartilhamento de informações. Também deve servir de espaço para o acompanhamento de acordos multilaterais de políticas digitais (ver Seção 4), considerando seu mandato abrangente. A natureza aberta, a abordagem híbrida, os processos intersessionais, as conexões com iniciativas locais, nacionais e regionais e o formato inclusivo fazem com que o IGF seja o foro adequado para assumir estas responsabilidades.
Para cumprir as expectativas de coordenação e de compartilhamento de informações, pode ser necessário desenvolver novos métodos de trabalho, assim como obter novos recursos financeiros e humanos. Estes métodos devem ser concebidos para tornar a coordenação e compartilhamento de informações mais eficientes e para melhorar a deliberação e a percepção dos resultados. Também podem fortalecer a conexão entre os processos de governança e a implementação de resultados, aumentando a eficácia da governança da Internet e dos processos de políticas digitais em geral.
Estes métodos de trabalho devem tentar evitar conflitos com processos existentes ou a sua duplicação e a criação de novos ônus. Além disso, devem garantir a participação de baixo para cima, em genuíno pé de igualdade, assim como a transparência e a prestação de contas de tais processos.
Melhorias efetivas da coordenação beneficiam a todos os interessados, assim como a capacidade da governança da Internet e dos processos de políticas digitais de tratar as questões pertinentes.
3. Aplicar a abordagem multissetorial e melhorar os processos multilaterais
3.1. Melhorar a participação em processos multilaterais
Os processos multilaterais devem ser mais inclusivos para garantir a participação efetiva de todos os interessados, especialmente os do Sul Global. A inclusão de vozes diversas e de múltiplas visões de mundo, ampliando a contribuição dos interessados, fortalece os processos multilaterais. Os processos inclusivos permitem tomar decisões mais acertadas e garantem melhor comunicação dos resultados para obter deliberações mais adequadas e geração de consenso, com base nas diretrizes e etapas de processo descritas abaixo.
A fim de conquistar estes avanços, todos os interessados devem ser empoderados para que possam contribuir de forma significativa em todas as fases de um processo que trate de questões de interesse. A indicação de consultores/especialistas e/ou de plataformas com recursos adequados deve ser incentivada para efetivamente viabilizar e analisar as diversas contribuições recebidas desde a fase de definição da pauta, durante as deliberações até a redação das resoluções e de textos, de acordo com as diretrizes e prazos acordados e levando em conta considerações éticas e de interesse público. Da mesma forma, investimentos significativos em capacitação e educação para fortalecer cada etapa do processo são essenciais para que as contribuições sejam efetivas. É importante que tais investimentos levem em conta as assimetrias relativas de poder entre e dentro das diferentes partes interessadas e grupos de partes interessadas.
Segundo os princípios multissetoriais, os processos multilaterais devem evoluir. Devem compartilhar o escopo do seu trabalho e publicar um compromisso com a transparência do processo, incluindo – mas não limitado a – um cronograma indicando as principais oportunidades de participação. Como parte desse compromisso, um calendário para informar o progresso do processo – ou sua ausência – deve ser disponibilizado regularmente e incluir o acesso público a resultados específicos. A documentação de como as contribuições foram feitas, avaliadas e incorporadas no processo é tão importante quanto o registro de opiniões dissidentes e divergentes. Tais mecanismos devem cumprir com padrões de acessibilidade e oferecer alternativas efetivas para permitir a participação em outros idiomas além do inglês.
Mecanismos robustos de prestação de contas devem fazer parte de todos os processos multilaterais para que as etapas e os prazos para a implementação das recomendações sejam claros. Mecanismos concretos de análise de impacto das decisões e o andamento da implementação das recomendações são fundamentais para a sua continuidade. Devem ser envidados esforços para documentar com precisão cada processo multilateral, incluindo medidas concretas para identificar conexões com outros processos.
Portanto, é fundamental criar um ambiente seguro, confiável e justo, que resolva as assimetrias entre os participantes e que possibilite que a sociedade civil, o setor privado, o meio acadêmico e a comunidade técnica participem de forma efetiva nos processos multilaterais. A principal responsabilidade dos governos é garantir as condições para assegurar a diversidade e gerar processos multilaterais robustos.
3.2. Diretrizes para a geração de consenso e tomada de decisões multissetoriais (Diretrizes Multissetoriais de São Paulo)
Propomos um conjunto de diretrizes e etapas de processo associadas (“Diretrizes Multissetoriais de São Paulo”) e apelamos à comunidade mundial que o adote e utilize na governança da Internet e nos processos de políticas digitais. Este conjunto é baseado em documentos fundacionais existentes, boas práticas atuais e experiência. Embora não possam ser aplicadas em todas as situações, as Diretrizes podem ajudar as comunidades subnacionais, nacionais, regionais e globais a gerar confiança e a estabelecer e implementar processos e mecanismos de colaboração multissetoriais, bem como a avaliar processos e mecanismos apresentados como multissetoriais, mas que não o são de fato. Como mencionado na Seção 3.1, também podem servir de inspiração para a evolução e a melhoria dos processos multilaterais.
As diretrizes a seguir complementam e operacionalizam os Princípios de Processo de Governança da Internet do NETmundial 2014. Levando em conta que a colaboração multissetorial está em evolução constante, estas diretrizes não são definitivas e devem ser consideradas um documento vivo. Precisam continuar a evoluir, tanto em termos de sua implementação prática, quanto da sua formulação concreta.
Recomendamos, portanto, que o IGF seja o fórum adequado para atuar como depositário, isto é, guardião, deste primeiro conjunto de diretrizes e esperamos que o IGF considere a sua implementação nos seus próprios processos e sua discussão e evolução subsequentes. Essas discussões futuras poderão incluir, entre outros, a priorização e/ou agrupamento das diretrizes, o desenvolvimento de métricas para medir sua aplicação, sistemas de avaliação e prestação de contas dos processos multilaterais e multissetoriais e/ou elaborar diretrizes ilustrativas adicionais sobre a sua aplicação, como kits de ferramentas, recursos visuais e fluxogramas.
Diretrizes e etapas de processo (“Diretrizes”) para a colaboração multissetorial, a geração de consenso e a tomada de decisões
Diretrizes
1. Os processos multissetoriais devem levar em conta as assimetrias de poder entre as diversas partes interessadas e empoderá-las, fornecendo-lhes as informações, os recursos e as competências necessários para que participem de forma efetiva, construtiva e contínua. As medidas de transparência devem ter como objetivo fazer com que os processos de políticas sejam conhecidos, acessíveis, compreensíveis e contestáveis.
2. Os processos multissetoriais devem envolver discussões informadas e deliberativas entre as partes interessadas. O diálogo construtivo é um mecanismo para a prevenção de conflitos durante todas as etapas do processo.
3. Os processos multissetoriais devem esforçar-se por tratar todas as partes interessadas de forma justa e equitativa, considerando suas respectivas necessidades, capacidades, realidades e vulnerabilidades. As partes interessadas devem participar em pé de igualdade, tratar-se com respeito mútuo, reconhecendo o valor dos diversos pontos de vista e contribuições, assim como a natureza diversa de seus papéis e responsabilidades de acordo com cada questão específica.
4. Os processos multissetoriais devem ser regidos pelo Estado de Direito e pelo respeito aos princípios internacionais dos direitos humanos, incluindo direitos econômicos, sociais, culturais, civis e políticos.
5. Os processos multissetoriais devem respeitar e valorizar a diversidade linguística dos participantes e ser acessíveis a todos os interessados, independentemente da sua formação, posição ou nível de especialização.
6. Todas as partes interessadas devem compartilhar as responsabilidades e defender a transparência e prestação de contas, em seus respectivos papéis, pelos resultados do processo multissetorial, ao passo que os governos permanecem os principais responsáveis, jurídica e politicamente, pela proteção dos direitos humanos e o setor privado, pelo respeito aos direitos humanos, em conformidade com os Princípios Orientadores da ONU sobre Empresas e Direitos Humanos.
7. A governança da Internet e os processos de políticas digitais devem ser ágeis e adaptar-se à mudança das circunstâncias, à evolução das tecnologias, a problemas emergentes e às variações das dinâmicas geopolíticas.
8. Devem ser estabelecidos mecanismos para a resolução de conflitos entre as partes, no âmbito dos processos colaborativos multissetoriais, para viabilizar a tomada de decisões.
9. Uma abordagem global multissetorial à governança da Internet e aos processos de políticas digitais deve reconhecer a necessidade da ação colaborativa além das fronteiras nacionais e grupos de partes interessadas e, ao mesmo tempo, levar em conta e alavancar as perspectivas locais e regionais.
10. As decisões devem considerar as implicações de longo prazo e a sustentabilidade dos resultados em relação aos direitos humanos e ao desenvolvimento inclusivo e sustentável, de acordo com a agenda de Túnis.
11. Devem ser implementadas ações de capacitação que promovam o conhecimento e as competências dos interessados, especialmente aqueles de países em desenvolvimento e comunidades sub-representadas, ao longo de todas as etapas de um processo multissetorial.
12. Deve-se buscar ativamente a cooperação e o diálogo com outros fóruns e processos de governança para evitar a duplicação de esforços e para compartilhar resultados, melhores práticas e lições aprendidas.
13. Os processos de colaboração devem ser orientados para a obtenção de resultados práticos e aplicáveis, que tenham efeitos tangíveis e promovam mudanças positivas na governança da Internet e nos processos de políticas digitais.
Diretrizes orientadas às etapas de processo
Etapas de processo recomendadas para um processo multissetorial aberto e inclusivo:
1. Definir o escopo da questão: definir a questão ou conjunto de questões a serem consideradas pelo processo de colaboração multissetorial, considerando, sempre que possível, todas as perspectivas afetadas.
2. Identificar as partes interessadas: Identificar todas as partes interessadas relevantes da forma mais inclusiva e flexível possível, incluindo indivíduos, grupos, organizações e comunidades afetadas pela decisão ou colaboração.
3. Engajar as partes interessadas: Engajar ativa e continuamente todas as partes interessadas ao longo do processo, utilizando métodos como consultas públicas, enquetes, oficinas e fóruns para reunir contribuições e feedback.
4. Compartilhar informações: Fornecer informações claras e completas sobre o processo, seus objetivos e seus resultados a fim de garantir a transparência e a compreensão pelas partes interessadas, utilizando registros digitais acessíveis, incluindo a documentação relacionada ao processo.
5. Garantir a participação equitativa: Garantir a participação equitativa de todas as diferentes perspectivas e interesses relevantes, incluindo grupos marginalizados ou sub-representados.
6. Promover o diálogo: Promover o diálogo aberto, a colaboração e a deliberação entre as partes interessadas relevantes, incentivando a comunicação respeitosa e a geração de consenso.
7. Preparar resultados preliminares: redigir os resultados preliminares para consulta com base nos diálogos entre as partes interessadas relevantes e consultar a comunidade em geral sobre os resultados.
8. Considerar o feedback da comunidade em geral: ajustar os resultados preliminares considerando as contribuições feitas durante a consulta, informando de forma transparente como estas contribuições foram consideradas e os seus motivos.
9. Tomada de decisão aberta: utilizar processos de tomada de decisão colaborativos que envolvam todas as partes interessadas relevantes ao identificar soluções, buscar compromissos e obter acordos.
10. Poderes da comunidade: submeter os resultados finais à consideração da comunidade em geral, disponibilizando mecanismos que permitam que a comunidade conteste resultados que não estejam alinhados aos interesses gerais da comunidade.
11. Implementação e responsabilização na tomada de decisões: Estabelecer mecanismos para implementar decisões e responsabilizar as partes interessadas por seus compromissos.
12. Monitorar e adaptar: Monitorar o progresso, avaliar os resultados e estar disposto a adaptar o processo com base no feedback e em mudanças das circunstâncias.
4. Contribuições a processos em andamento
Como mencionado nas seções 2.3 e 3.2, há vários processos em curso no contexto da ONU. São relativos à governança da Internet e aos processos de políticas digitais; em particular, mas não limitados a negociações relacionadas ao Pacto Digital Global ( Global Digital Compact, GDC), no âmbito do Pacto para o Futuro da Cúpula do Futuro e à Revisão WSIS+20. Incluem recomendações e possíveis caminhos para uma maior consolidação de uma Internet aberta, global, interoperável, segura e livre e de um ecossistema de políticas digitais mais abrangente, que contribua para atingir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
Como reunião sem paralelo, que busca articular um caminho concreto para fortalecer e melhorar o multissetorialismo na governança da Internet e nos processos de políticas digitais, o NETmundial+10, como evento independente, propõe ideias específicas para esses processos, cujos objetivos são fortalecer os existentes, otimizar a alocação de recursos e estabelecer sinergias, coordenação e complementaridade. Além disso, há inúmeros processos multilaterais, regionais, nacionais e não governamentais que inspiraram e que se beneficiariam ao aplicar os princípios e diretrizes estabelecidos neste documento.
4.1. Fórum de Governança da Internet (IGF)
O Fórum de Governança da Internet consiste em um evento anual, trabalho intersessional que inclui coalizões dinâmicas, fóruns de melhores práticas e redes de políticas, trilhas parlamentares e judiciárias, IGFs nacionais e regionais e iniciativas para a juventude em todos os níveis. Reúnem diversos grupos de partes interessadas de diferentes partes do mundo.
O IGF tem sido um espaço efetivo de debates e cooperação sobre a governança da Internet e políticas públicas digitais, apesar de não ter os recursos financeiros necessários para cumprir o seu mandato de forma ideal. O IGF tem, comprovadamente, poder de convocação e capacidade de explorar e desenvolver abordagens multissetoriais inovadoras para a deliberação de políticas e processos de tomada de decisão. Se for fortalecido, poderá se consolidar como espaço preferencial para o compartilhamento de informações e para uma melhor coordenação entre os processos de governança digital. Sua natureza aberta, abordagem híbrida e estrutura inclusiva respaldam uma ampla participação.
Um IGF fortalecido terá que continuar a lidar com os desafios e as oportunidades das tecnologias emergentes. Pode ser necessário desenvolver e adotar novos métodos de trabalho que possam melhorar efetivamente a coordenação, a visão e o compartilhamento de informações a fim de evitar conflitos com processos existentes ou gerar novos encargos para as partes interessadas participantes e para o Sistema da ONU.
Um Fórum de Governança da Internet fortalecido:
demanda sustentabilidade de longo prazo através do aumento de recursos financeiros, técnicos e humanos para estabelecer-se como plataforma deliberativa fundamental para a coordenação de debates participativos sobre a governança da Internet e processos de políticas digitais;
pode dar coesão e promover a participação no contexto de um ecossistema de governança digital distribuído e crescente, assegurando a participação mais inclusiva e diversificada de países, comunidades, grupos e setores sub-representados, em particular do Sul Global; e
demanda melhores procedimentos para garantir a deliberação inclusiva, transparente e responsável para gerar legitimidade e resultados eficazes.
Também é necessário melhorar o diálogo e a coordenação entre o IGF global e as iniciativas regionais e nacionais para que as discussões e pautas possam retroalimentar tais processos para estabelecer a sua continuidade, desde a perspectiva local até a global.
Na sua evolução, o potencial do IGF de produzir resultados tangíveis (como recomendações de políticas baseadas em evidências, diretrizes de melhores práticas e projetos-piloto para testar as soluções propostas) com o objetivo de capacitar e informar os formuladores de políticas deve ser otimizado. Isto demanda o compromisso e a participação de todas as partes interessadas.
O Secretariado, o Painel de Liderança e o Grupo Consultivo Multissetorial do IGF, no desempenho das suas respectivas funções, têm um papel fundamental nesse sentido. Os mecanismos de colaboração e troca de informações com outros organismos internacionais e fóruns de governança devem ser aperfeiçoados, bem como o trabalho intersessional do IGF. O fortalecimento dos IGFs nacionais e regionais, como espaços de definição de objetivos e desafios comuns para orientar a pauta do IGF global, contribui para combater a fragmentação da governança.
O IGF é o processo do sistema das Nações Unidas mais capacitado para diminuir a brecha entre a discussão e a ação através do estabelecimento de laços mais estreitos com outras organizações fundamentais para o funcionamento da Internet, assim como com instituições multilaterais, através da inovação e experimentação contínuas dentro de marco do IGF.
O IGF deve ser renovado, pelo menos por mais 10 anos, como a principal plataforma global para a ampla participação pública e o diálogo relativos a todas as questões de governança da Internet e políticas digitais. O fortalecimento do IGF permitiria que o sistema da ONU utilizasse o legado e a relevância do modelo, e simultaneamente, evitasse uma maior fragmentação dos debates sobre a governança da Internet e políticas digitais. O processo de seleção do país anfitrião deve ser mais transparente e levar em conta os direitos humanos, a inclusão, a acessibilidade e condições equitativas de participação. A participação livre, segura e aberta deve estar disponível a todos, especialmente aos grupos historicamente excluídos.
4.2. Pacto Digital Global
A fim de estabelecer as bases para um “futuro digital aberto, livre e seguro para todos”, como previsto pelo Pacto Digital Global, o NETmundial+10 reconhece o papel essencial da Internet e das tecnologias digitais para construir mecanismos de governança inclusivos e participativos, reafirmando a importância da abordagem multissetorial à governança da Internet e aos processos de políticas digitais e incorporá-la no seu núcleo. As recomendações elaboradas pelo NETmundial+10, no sentido de fortalecer a abordagem multissetorial à governança das tecnologias digitais e ao seu desenvolvimento, servem como base para garantir que as políticas e as estruturas sejam transparentes, inclusivas, democráticas e reflitam as perspectivas diversas de todos os setores da sociedade.
A fim de agregar valor e preencher as lacunas das estruturas atuais de governança da Internet e de fóruns de políticas digitais, é fundamental que o GDC evite criar novas estruturas ou processos quando os já existentes possam ser fortalecidos e melhorados para auxiliar o monitoramento da implementação e analisar o progresso do GDC. Por diversas razões, o IGF é o espaço adequado para acompanhar e monitorar a implementação dos compromissos do GDC. Os temas definidos no GDC – e que são os principais focos da governança digital – já são parte da pauta do IGF há muitos anos.
O IGF, com as suas estruturas e mecanismos multissetoriais, deve ser utilizado como espaço para facilitar a implementação, o monitoramento e o acompanhamento do Pacto Digital Global, trabalhando em colaboração com outras agências da ONU, como a UIT (União Internacional de Telecomunicações), o PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), a CNUCED (Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento), a UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) e a UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância) através das Linhas de Ação da WSIS, utilizando o Fórum WSIS e com a CSTD ( Commission on Science and Technology for Development) da ONU fornecendo uma plataforma para o engajamento intergovernamental no processo de monitoramento e acompanhamento. O GDC deve evitar minar a relevância do IGF e a abordagem multissetorial à governança da Internet e aos processos de políticas digitais.
Através da sua implementação, orientada para integrar seus resultados com o processo da WSIS e mecanismos de acompanhamento eficazes baseados nos fóruns existentes, o GDC é um instrumento de integração do digital para a aceleração da implementação dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, com base na Agenda de Túnis.
O GDC é uma oportunidade de alinhar as tecnologias digitais com as iniciativas globais que visam a inclusão digital, a cooperação e a colaboração transnacional entre as diferentes partes interessadas, a consolidação e a aplicação efetiva das atuais obrigações de direitos humanos, inclusive em situações de crise, destacando a centralidade da legislação internacional de direitos humanos como fundamento e ambiente propício para apoiar todos os aspectos da governança da Internet e dos processos de políticas digitais, inclusive através do fortalecimento da colaboração com o ACNUDH (Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos) e outros mecanismos de direitos humanos da ONU.
4.3. Revisão WSIS+20
A Cúpula Mundial sobre a Sociedade da Informação (WSIS) tem sido uma plataforma fundamental para promover a cooperação entre governos, sociedade civil, setor privado, academia e comunidade técnica para tratar coletivamente das oportunidades e dos desafios relativos a questões técnicas e políticas da governança digital. Com a proximidade do marco da WSIS+20, é necessário reafirmar os compromissos e criar estratégias inovadoras para conquistar a inclusão digital e proteger os direitos humanos online para alavancar os ODS. O modelo multissetorial, que reconhece a intrincada interação entre os diversos setores e atores na elaboração das políticas digitais, é fundamental para garantir que a WSIS continue a ser um processo dinâmico, baseado na elaboração de normas globais e mecanismos de cooperação relativos a questões digitais fundamentais, e seja ágil e receptivo à expansão das fronteiras das novas tecnologias. Ao comprometer-se efetivamente com o multissetorialismo, promover a cooperação e debater os possíveis desafios, a evolução das tecnologias e as tendências no cenário digital, a WSIS pode antecipar-se e olhar além do marco dos 20 anos. Considerando esta declaração multissetorial, a Revisão WSIS+20 deverá fortalecer ainda mais a inclusão, a transparência e a prestação de contas da governança da Internet e dos processos de políticas digitais, assim como garantir sua atenção à sustentabilidade ambiental e às tecnologias emergentes que forjam o futuro digital.
4.4. Outros Processos
Solicitamos que a comunidade multissetorial divulgue os resultados do NETmundial+10 nos processos nacionais, regionais, multilaterais e multissetoriais que considere relevantes.
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