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O falso dilema entre responsabilidade de plataformas e liberdade de expressão

Estamos submetidos a decisões obscuras de empresas privadas estrangeiras

Paulo Rená da Silva Santarém, Paloma Rocillo e Jonas Valente

fonte: Folha de São Paulo, 25-08-2025

O projeto de lei 2628/2022 (ECA Digital), aprovado na Câmara dos Deputados nesta semana, prevê regras equilibradas para proteger crianças e adolescentes dos graves riscos de violações de direitos no ambiente digital.

Durante os debates, circulou entre seus críticos o argumento inconsistente de um suposto perigo de censura. Mas esse temor some com a simples leitura do texto, que contempla garantias para preservar e, mais, fortalecer a liberdade de expressão.

Um dos cuidados ao longo do processo legislativo foi inclusive prever meios para superar a censura privada atualmente praticada pelas plataformas digitais.

De modo inédito, por consenso entre governo e oposição —e como resultado da participação ativa da sociedade civil durante as discussões do texto—, o relatório do deputado Jadyel Alencar, aprovado no plenário da Câmara dos Deputados, incorporou um mecanismo chave para defender a plena liberdade de expressão online: o devido processo na moderação.

Esse instituto jurídico serve para corrigir assimetrias de poder e ampliar a transparência aos usuários ao prever um conjunto de regras que exigem, por exemplo, a explicação do motivo para eventuais medidas de interferência das plataformas digitais em conteúdos e contas e a possibilidade de correções de erros.

O artigo 30 do Eca Digital prevê de modo específico cinco garantias ao usuário cujo conteúdo ou perfil sofra moderação. São elas: notificação, explicação de motivos, indicação de ação humana ou automatizada, meios para recurso e definição de prazos para os procedimentos.

São cinco elementos de um devido processo que concretizam a ampla defesa e o contraditório dentro da própria plataforma, direito fundamental.

As redes sociais moderam conteúdos e contas em escala gigantesca, com erros frequentes dos sistemas automatizados.

Tanto o deputado federal da extrema direita Marcos Pollon (PL-MS) quanto o influenciador de esquerda Jones Manoel tiveram suas contas derrubadas recentemente sem maiores explicações.

Nosso exercício da liberdade de expressão está submetido a decisões obscuras de empresas privadas estrangeiras. O desenho previsto no projeto de lei é o melhor antídoto contra qualquer receio de censura, pois protege o usuário de abusos e do arbítrio.

Atualmente, quem não tem fama e repercussão social só pode contar com o Poder Judiciário para reverter remoções injustas. Mas judicializar a questão leva tempo e custa caro. Poucas pessoas podem pagar bons advogados e levar uma demanda até o fim.

A previsão legal do devido processo na moderação democratiza a liberdade de expressão no ambiente digital: o Eca Digital cria uma dinâmica segura e imediata entre usuário e plataforma, com deveres legais detalhados e proporcionais.

Madura e equilibrada, a proposta é firme na retirada de conteúdos que violem direitos de crianças e adolescentes (artigo 29) e garante o devido processo (artigo 30). Em vez de escolher entre proteger crianças ou resguardar a liberdade de expressão, o projeto faz as duas coisas ao mesmo tempo.
Por isso, é crucial que o Senado aprove rapidamente o projeto de lei 2628/2022.

O Brasil deve se tornar referência internacional contra os atuais índices alarmantes de violência online contra crianças e adolescentes, gerados em nome do lucro e da comodidade das plataformas digitais.

O texto do projeto de lei 2628/2022 protege direitos prioritários à luz dos pilares da democracia: liberdade de expressão, direito à comunicação e segurança jurídica.

 

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