Nos últimos anos, a agenda política brasileira tem assistido à emergência da pauta dos direitos LGBT. Entre retrocessos e vitórias, a população LGBT conquistou o direito à união civil estável em decisão do Supremo Tribunal e ao casamento civil, em resolução do Conselho Nacional de Justiçã (CNJ), ao mesmo tempo em que viu o governo federal recuar na distribuição do kit anti-homofobia nas escolas e assiste há anos o projeto de criminalização da homofobia – defendido por boa parte do movimento LGBT – arrastar-se no Congresso. Os três poderes têm, de uma forma ou de outra, se posicionado nessas questões, o que foi mapeado pela pesquisadora Rosa Oliveira (Pagu/Unicamp) no estudo “Direitos Sexuais de LGBT no Brasil: Jurisprudência, Propostas Legislativas e Normatização Federal”.O estudo foi publicado ano passado e sai agora em edição revisada. Fruto de consultoria prestada ao Ministério da Justiça a partir do Plano Nacional de Combate à Homofobia, a pesquisa vasculhou decisões judiciais, projetos de lei e medidas do Executivo para traçar um panorama da situação dos direitos da população LGBT no país.No balanço das iniciativas tomadas por cada um dos três Poderes, Rosa Oliveira destaca que o Judiciário, através dos Tribunais Superiores, tem sido o lugar de referência, tomando decisões inclusivas que garantem e promovem os direitos dessa população. Das 318 decisões analisadas, 175 são consideradas favoráveis e 104 desfavoráveis.Apesar disso, persistem concepções tradicionais sobre gênero e sexualidade, conforme decisões que negam o direito ao casamento a pessoas do mesmo sexo. O Congresso, por seu lado, tem sido um terreno fértil para o crescimento de setores religiosos conservadores que patrocinam projetos contrários à garantia e ampliação dos direitos LGBT. Tramitaram entre 1995 e 2011 97 projetos de lei. O PL 122, que equipara a homofobia ao racismo e a outros crimes de ódio, está há quase 20 anos em tramitação e, recentemente, sofreu alterações diante da pressão de parlamentares religiosos. Além disso, projetos que visam impedir o casamento entre pessoas do mesmo sexo, assim como a adoção de crianças, e a mudança de nome para pessoas transexuais.Em meados do ano passado, o projeto de decreto legislativo que visava a sustar resolução do Conselho Federal de Psicologia que proíbe a formulação e prática de terapias para a homossexualidade protagonizou a agenda política nacional. A matéria ganhou espaço na Comissão de Direitos Humanos da Câmara, presidida pelo deputado Marco Feliciano (PSC-SP), e ganhou o nome de “cura gay”. Para Rosa Oliveira, tal iniciativa ganhou uma dimensão despropositada. “Certas movimentações são claramente para conseguir mídia. Temos que estar atentos para saber reconhecer o que de fato é uma ameaça aos direitos da população LGBT e o que não é”, afirma.O fortalecimento de tais setores tem obrigado o governo federal a recuar em medidas para a população LGBT, em nome da governabilidade. Em 2011, a presidente Dilma Rousseff foi forçada a suspender a distribuição do kit anti-homofobia para preservar a estabilidade da aliança no Congresso. “O governo federal já teve uma atuação mais inclusiva e aberta às demandas LGBT. No entanto, tem havido retrocessos nos últimos anos, o que é lamentável, pois direitos não devem ser matéria de negociação”, afirma Rosa Oliveira.Em junho do ano passado, o governo federal também suspendeu, sob pressão de tais setores, campanha de promoção da visibilidade das prostitutas, o que gerou repúdio em meio aos movimentos pelos direitos sexuais. Os direitos reprodutivos também estão sendo moeda de troca nessa dinâmica de alianças, com o governo eximindo-se de tratar a questão do aborto no contexto da saúde pública e dos direitos das mulheres. A reforma do Código Penal traz, no texto aprovado em comissão no Senado e que deverá ser apreciado no plenário antes de ir para a Câmara, conteúdo restritivo ao aborto, retirando a previsão de aborto em caso de “risco à saúde da mulher”.De acordo com Rosa Oliveira, há um processo de ameaça aos direitos sexuais e reprodutivos que demandam novas estratégias de enfrentamento. “Não se pode ficar apenas na institucionalidade. Somos um país plural, é preciso colocar tais temáticas nas ruas, mobilizar a sociedade civil e a opinião pública. É preciso criar fatos que forcem o poder público a agir. Infelizmente, o movimento LGBT está burocratizado, apegado a reuniões e formalidades com autoridades. O momento político é complicado. Por isso, precisamos renovar a resistência, seja para lidar com ações que não representam perigo e que buscam promover figuras politicamente, seja para enfrentar propostas que retiram e interditam os direitos da população LGBT”, afirma Rosa Oliveira.Os exemplares impressos do estudo poderão ser solicitados à assessoria de direitos humanos da Secretaria de Reforma do Judiciário, por email ou pelo telefone 61-20259564.Fonte: Clam
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