Um grupo de organizações da sociedade civil, movimentos sociais e cidadãos comuns, incluindo o ISA, encaminhou, no dia 6 de maio, à Secretaria Geral da Mesa da Câmara Federal, uma representação inédita, por quebra de decoro parlamentar, contra o deputado Leonardo Quintão (PMDB-MG), relator do Projeto de Lei (PL) 37/2011, o novo marco legal da mineração.É a primeira vez que uma representação popular, por quebra de decoro, é apresentada contra um parlamentar pelo fato dele relatar um projeto de interesse direto de seus financiadores de campanha. Apesar disso, a regra que abre essa possibilidade existe no Código de Ética da Câmara desde 2001. Nos últimos anos, algumas representações por quebra de decoro foram apresentadas por cidadãos à mesa da Câmara. A informação disponível, porém, é que nenhuma foi encaminhada e analisada pelo Conselho de Ética da casa.O inciso VIII do Art. 5º do Código de Ética da Câmara afirma que fere o decoro parlamentar “relatar matéria submetida à apreciação da Câmara dos Deputados, de interesse específico de pessoa física ou jurídica que tenha contribuído para o financiamento de sua campanha eleitoral”.Dos cerca de R$ 2 milhões arrecadados por Quintão na campanha de 2010, em torno de 20% foram doados por grandes empresas de mineração e metalurgia, segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). São elas: a Acerlormittal, Gerdau, Usiminas, Ecosteel e LGA.“Sou financiado, sim, pela mineração, legalmente. Alguns ambientalistas dizem que não posso ser relator porque sou financiado pela mineração. De forma alguma”, disse Quintão, durante uma audiência pública promovida na Câmara, em dezembro. “Não tenho nenhuma vergonha de ser financiado, dentro da lei, por mineradoras. Eu defendo sim o setor mineral”, afirmou.Com base na norma, a representação lembra que o parlamentar deveria ter rejeitado a relatoria do projeto e pede, como punição, que ele seja afastado da função de relator da matéria.“Esse é um caso evidente de conflito de interesse. O relator não tem a independência necessária para relatar esse assunto”, alerta Raul do Valle, coordenador de Política e Direito do ISA. “Esperamos que esse caso sirva de exemplo para outros casos, como um precedente positivo para a moralização da política em um ano de eleição, às vésperas do Supremo Tribunal Federal decidir sobre o fim do financiamento por empresas das campanhas eleitorais”, completou.A representação está sendo encaminhada por um conjunto de organizações da sociedade civil que defende a moralização da atuação parlamentar e também alterações no PL 37/2011 que garantam os direitos socioambientais de populações afetadas por grandes projetos de mineração. Integram o grupo a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), ISA, Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) e o Movimento dos Atingidos pela Mineração (MAM), entre outras dezenas de organizações que fazem parte do Comitê Nacional em Defesa dos Territórios frente à Mineração (saiba mais), além do WWF, Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais (Abong) e Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma Política.“Acho que o ano eleitoral é um ano propício para a Câmara sinalizar que não está satisfeita com esse sistema de financiamento de campanha”, afirma José Antônio Moroni, da Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma Política.Para chegar ao Conselho de Ética, a representação precisa ser analisada pelo presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), pelo corregedor da casa, deputado Átila Lins (PSD-AM), e pela própria Mesa Diretora, que tem sete membros titulares e quatro suplentes.O secretário geral da Mesa da Câmara, Mozart Vianna de Paiva, informou que não há prazo para a análise nessas três instâncias, mas que o documento deverá ser analisado rapidamente por Alves e Lins. Paiva recebeu a representação em mãos dos representantes das organizações da sociedade civil.Interesses das mineradorasQuintão vem defendendo de forma irredutível os interesses das grandes mineradoras. Seu relatório não traz nenhum tipo de salvaguarda aos direitos de populações indígenas e tradicionais afetadas por esses projetos e chega a propor que a oficialização de Unidades de Conservação, Terras Indígenas, territórios quilombolas e assentamentos de reforma agrária tenha anuência da Agência Nacional de Mineração (ANM).“Acho que essa representação é uma forma importante de declarar que Leonardo Quintão não nos representa”, disse Sandra Vita Santos, da Associação Comunitária Nascentes e Afluentes da Serra do Caraça, do município Catas Altas (MG). A comunidade de Sandra é uma das afetadas pelos projetos de mineração da região.A representação está sendo encaminhada em meio a uma mobilização da sociedade brasileira para moralizar a política partidária, em especial pelo fim ao financiamento de empresas nas campanhas eleitorais, principal expediente que subordina mandatos parlamentares a grandes interesses econômicos.Fonte: Abong
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