Enquanto grupos de pesquisas, instituições científicas e de promoção de direitos civis, as instituições abaixo assinadas vêm a público manifestar repúdio à forma deliberadamente distorcida que o conceito de gênero tem sido tratado nas discussões públicas e denunciar a tentativa de grupos conservadores de instaurar um pânico social, banir a noção de “igualdade de gênero” do debate educacional e reificar as desigualdades e violências sofridas por homens e mulheres no espaço escolar.Signatário dos principais documentos internacionais de promoção da igualdade (como a Convenção Para Eliminar Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher – CEDAW; o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e da Campanha pela igualdade e direitos de população LGBT da ONU), o Brasil acompanhou a institucionalização dos estudos de gênero enquanto um profícuo campo científico nas últimas décadas e conta hoje com centros de pesquisas interdisciplinares reconhecidos internacionalmente. As discussões de gênero ganharam legitimidade científica nas maiores universidades brasileiras a partir dos anos 1970 e, desde então, têm norteado políticas públicas para garantia de igualdades constitucionais.Ao contrário de “ideologias” ou “doutrinas” sustentadas pela fundamentação de crenças ou fé, o conceito de gênero está baseado em parâmetros científicos de produção de saberes sobre o mundo. Gênero, enquanto um conceito, identifica processos históricos e culturais que classificam e posicionam as pessoas a partir de uma relação sobre o que é entendido como feminino e masculino. É um operador que cria sentido para as diferenças percebidas em nossos corpos e articula pessoas, emoções, práticas e coisas dentro de uma estrutura de poder. E é, nesse sentido, que o conceito de gênero tem sido historicamente útil para que muitas pesquisas consigam identificar mecanismos de reprodução de desigualdades no contexto escolar.Embora a Constituição Federal Brasileira de 1988 garanta, em seu Artigo 6º, que a Educação é um direito irrevogável de todas e todos e assegure a igualdade de condições para acesso e permanência escolar, pesquisas mostram que esse direito é constantemente violado a partir das estruturas hierárquicas de gênero. Um exemplo de como a desigualdade de gênero se correlaciona com a educação tem sido visto em pesquisas que identificam o “fracasso” e as altas taxas de evasão escolar dos meninos como consequência dos referenciais de masculinidades difundidos socialmente. Uma identidade masculina baseada na agressividade e na indisciplina tem cada vez mais afastado os meninos dos bancos escolares (37,9% deles segundo dados do IBGE em 2011), negando-lhes seu direito à educação e reproduzindo uma cultura da violência. Professoras são vítimas de agressões em sala de aula, meninas são estupradas por seus colegas de turma e meninos são afastados das escolas neste ciclo de desigualdade perpetuado por noções hierarquizadas do que é ser homem ou mulher. Também são notáveis, por outro lado, as pesquisas que mostram o quanto a discriminação de gênero contra as pessoas que fogem dos padrões socialmente estabelecidos de identidade ou sexualidade tem desencadeado processos institucionalizados de discriminação, agressões e exclusão escolar: as violências contra gays, lésbicas, bissexuais, travestis, mulheres transexuais e homens trans excluem essa população do direito constitucional à educação e contribuem para as estatísticas que fazem do Brasil um dos países mais inseguros para pessoas LGBT (conforme demonstra o relatório do Grupo Gay da Bahia de 2012 e o relatório de violência homofóbica da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República).Quando se reivindica, então, a noção de “igualdade de gênero” na educação, a demanda é por um sistema escolar inclusivo, que crie ações específicas de combate às discriminações e que não contribua para a reprodução das desigualdades que persistem em nossa sociedade. Falar em uma educação que promova a igualdade de gênero, entretanto, não significa anular as diferenças percebidas entre as pessoas (o que tem sido amplamente distorcido no debate público), mas garantir um espaço democrático onde tais diferenças não se desdobrem em desigualdades. Exigimos que o direito à educação seja garantido a qualquer cidadã ou cidadão brasileira/o e, para isso, políticas de combate às desigualdades de gênero precisam ser implementadas.Além disso, é preciso ainda ressaltar que, acima das negociações legislativas locais, a Constituição Nacional Brasileira de 1988 estabelece também que “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença” e o ensino deve estar baseado no princípio de liberdade de divulgação do pensamento e do pluralismo de ideias. Assim, não cabe às esferas locais de decisão realizar ocultamentos, censuras ou proibições de discussões reconhecidas no campo científico e, muito menos, a imposição de uma visão de mundo delimitadora nos currículos escolares. Em defesa do pluralismo de saberes e do reconhecimento do campo científico nacional e internacional, defendemos que é um direito fundamental das/os estudantes brasileiras/os o acesso aos conhecimentos e pesquisas produzidos pelos estudos interdisciplinares sobre o conceito de gênero. Nossa defesa é por uma educação democrática, inclusiva e, também, que repudie qualquer forma de censura.Assinam:ABA - Associação Brasileira de AntropologiaABEH Associação Brasileira de Estudos da HomoculturaABGLT – Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e TransexuaisCEM - Centro de Estudos da Metrópole - USP e CEBRAP/São PauloCentro Acadêmico de Serviço Social - UNIOESTE/ParanáCentro de Educação em Direitos Humanos - UNIFESP/São PauloCLAM – Centro Latino-Americano em Sexualidade e Direitos Humanos – UERJ/ Rio de JaneiroColegiado do Curso de Ciências Sociais da UNIOESTE - Campus de Toledo/ ParanáColetivo ASA - Artes, Saberes e Antropologia - USP/São PauloColetivo Feminista Filhas da Luta - UNIPAMPA/ Rio Grande do SulComissão da Diversidade Sexual e Combate a Homofobia da OAB/ São PauloComissão de Direitos Humanos do Conselho Federal de PsicologiaComissão de Diversidade Sexual da OAB/ ParanáComissão de Estudos sobre Violência de Gênero da OAB/ ParanáComissão Regional de Direitos Humanos do Conselho Regional de Psicologia do Rio de Janeiro/ Rio de JaneiroCOMTER – Núcleo de estudos sobre memória e conflitos territoriais - UFC / CearáConselho Regional de Psicologia da 3ª Região BahiaCurso Técnico em segurança do Trabalho do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Minas Gerais – IFMG (Unidade Remota, Ijací) / Minas GeraisCUS - Grupo de Pesquisa em Cultura e Sexualidade – UFBA/ BahiaDemodê – Grupo de Pesquisas sobre Democracia e Desigualdades UnB/ Distrito FederalDiversiones - Direitos humanos, poder e cultura em gênero e sexualidade – UFPE/ PernambucoEdges – Grupo de Estudos de Gênero, Educação e Cultura Sexual – USP/ São PauloEnlace - UNEB/BahiaFAGES – Núcleo de Família Gênero e Sexualidade – UFPE/ PernambucoFocus - Grupo de Pesquisa sobre Educação, Instituições e Desigualdades - UNICAMP/São PauloGADvS - Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual e de GêneroGEERGE – Grupo de Estudos em Educação e Relações de Gênero - UFRGS/ Rio Grande do SulGEM - Centro de Estudos e Pesquisas sobre mulheres, gênero, saúde e enfermagem - UFBAGEMA – Núcleo de Pesquisa em Gênero e Masculinidade – UFPE/ PernambucoGênero, Corporalidades, Direitos Humanos e Políticas Públicas – UEL/ ParanáGeni - Grupo de Estudos em Gênero, Sexualidade e Interseccionalidades – UERJ/ Rio de JaneiroGEPEM - Grupo de Estudos e Pesquisas “Eneida de Moraes” – UFPA/ ParáGEPS - Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Sexualidades – UNESP/ São PauloGEPSEX – Grupo de Estudos e Pesquisas em Sexualidades, Educação e Gênero da UFMS/Mato Grosso do SulGERA - Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Formação de Professores e Relações Étnico-Raciais – UFPA/ ParáGESECS -Grupo de Estudos e Pesquisas em Gênero, Sexualidades e Interseccionalidades – UFAM/ AmazonasGESED - Grupo de estudos e pesquisas em Gênero, Sexualidade, Educação e Diversidade - UFJF/Minas GeraisGETEPOL - Grupo Estudos em Teoria Política - UEL/ParanáGIV – Grupo de Incentivo à Vida/ São PauloGPLutas – Grupo de Pesquisa Marxismo, Direito e Lutas Sociais – UFPB/ ParaíbaGRUPESC -Grupo de Pesquisa Saúde, Sociedade e Cultura – UFPB/ ParaíbaGrupo Arco-Iris de Cidadania LGBT/Rio de JaneiroGrupo de estudos “Campo educacional e o estudo das categorias interseccionais” / Núcleo de Estudos e Pesquisas em Direitos Humanos , Bioética e Educação - UFF/ Rio de JaneiroGrupo de Estudos e Pesquisa : Avaliação e Intervenção Psicossocial - prevenção, comunidade e libertação - PUC-Campinas/São PauloGrupo de Estudos e Pesquisa em Gênero e Sexualidades – UESB/ BahiaGrupo de Estudos em Saúde Coletiva, Educação e Relações de Gênero -EACH -USP/ São PauloGrupo de Estudos Gênero, Direitos Humanos, Raça/Etnia – Fundação Carlos ChagasGrupo de pesquisa "Legado intelectual e produção literária de autoria feminina na América Latina" – UEL/Paraná Grupo de Pesquisa (R)existências e metaquestões dos marcadores de diferença - UEL/ParanáGrupo de pesquisa Cidade, Aldeia e Patrimônio – UFPA / ParáGrupo de Pesquisa e Intervenção Violência e gênero nas práticas de saúde – FMUSP/ São PauloGrupo de Pesquisa em Sexualidade, Entretenimento e Corpo - UFSCar/ São PauloGrupo de Pesquisa Fundamentos do Serviço Social: Trabalho e "Questão Social" - UNIOESTE/ ParanáGrupo de pesquisa- Gênero, Políticas Públicas Família – UEL/ ParanáGrupo de Pesquisa Saúde, Sexualidade e Direitos Humanos da População LGBT - FCMSCSP/ São PauloGrupo de Pesquisa Sexualidade e Escola - GESE-FURG / Rio Grande do SulGrupo de Pesquisa Representação, Imaginário e Educação - UFF/ Rio de JaneiroGrupo de Pesquisas “Trilhas do empoderamento de Mulheres” / NEIM - Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a mulher – UFBA/ BahiaGrupo de Trabalho Gênero, Sexualidade e Educação - Anped/ Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em EducaçãoGrupo Humanidades e Saúde Coletiva – FMUSP/ São PauloGrupo Transas do Corpo - Ações Educativas em Gênero, Saúde e SexualidadeILADH - Instituto Latino Americano de Direitos HumanosImpróprias - Grupo de pesquisa em gênero, sexualidade e diferenças – UFMS/ Mato Grosso do SulInstituto de Estudos de Gênero – UFSC/ Santa Catarina Instituto Patrícia Galvão-Mídia e Direitos / São PauloLABIN - Laboratório de Investigação em Corpo, Gênero e Subjetividade na Educação - UFPR/ ParanáLaboratório de Estudos de História – UFSC/ Santa CatarinaLaboratório de Experimentações Etnográficas – UFSCar/ São PauloLaboratório de Relações de Gênero e Família do Centro de Ciências Humanas e da Educação – UDESC/ Santa CatarinaLaboratório do Núcleo de Antropologia Urbana – USP/ São PauloLaboratório Genposs - Gênero, Serviços Sociais, e Política Social – UnB / Distrito FederalLaboratório Interdisciplinar de Ciências Humanas, Sociais e Saúde – Unifesp/ São PauloLAPEE – Laboratório de Psicologia Escolar e Educacional – UFSC/ Santa CatarinaLAPPEL – Laboratório de pesquisa em psicanálise, epistemologia e linguagem – UFMS/ Mato Grosso do SulLEFAM – Laboratório de Estudos da Família, Relações de Gênero e Sexualidade – USP/ São PauloLIDIS - Laboratório Integrado em Diversidade Sexual e de Gênero, Políticas e Direitos da UERJMandacaru - Núcleo de Pesquisas em Gênero, Saúde e Direitos Humanos – UFAL/ AlagoasMovimento "Jesus cura a homofobia"NaMargem - Núcleo de Pesquisas Urbanas - UFSCar/São PauloNEIM – Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher – UFBA/ BahiaNEPAIDS – Núcleo de Estudos para a Prevenção da AIDS – USP/ São PauloNEPJI - Núcleo de estudos e pesquisas sobre Juventude, Cultura, Identidade e Cidadania - UCSal/ BahiaNEPTA - Núcleo de Estudos de Políticas Territoriais na Amazônia -UFAM/ AmazonasNIGS - Núcleo de Gênero e Subjetividade – UFSC/ Santa CatarinaNós do Sul: Laboratório de Estudos e Pesquisas Sobre Currículo - FURG/ Rio Grande do SulNúcleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT – UFMG/ Minas GeraisNúcleo de Estudos Críticos em Subjetividades Contemporâneas e Direitos Humanos - UFRN/ Rio Grande do NorteNúcleo de Estudos de Gênero – UFPR/ Paraná Núcleo de Estudos de Sexualidade e Gênero – UFRJ/ Rio de JaneiroNúcleo de Estudos Heleieth Saffioti – UNIFESP/ São PauloNúcleo de Estudos, Pesquisas e Extensão em Sexualidade, Corporalidades e Direitos - UFT/ TocantinsNúcleo de Pesquisa Gênero Corpo Sexualidade - UFRN/ Rio Grande do NorteNúcleo de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher da Defensoria Pública do Estado de São PauloNúcleo Especializado de Combate à Discriminação, Racismo e Preconceito da Defensoria Pública do Estado de São PauloNúcleo Margens: modos de vida, família e relações de gênero – UFSC/ Santa CatarinaNUDISEX - Núcleo de Estudos e Pesquisas em Diversidade Sexual - UEM/ParanáNUMAS – Núcleo de Estudos sobre Marcadores Sociais da Diferença da USP/São PauloNUPSEX – Núcleo de Pesquisa em Sexualidade e Relações de Gênero – UFRGS/ Rio Grande do SulNuSEX – Núcleo de estudos em Corpos, Gênero e Sexualidades – Museu Nacional/ Rio de JaneiroNUSS - Núcleo de Pesquisas sobre Sexualidade, Gênero e Subjetividade - UFC/ CearáObservatório da Violência de Gênero no Amazonas - UfAM/ AmazonasOPEM - Grupo de Pesquisa Observatório de Pesquisas e Estudos Multidisciplinares - UEPB/ ParaíbaPagu – Núcleo de Estudos de Gênero – Unicamp/ São PauloPROGED - Programa de Educação para a Diversidade - UFOP/Minas GeraisPrograma de Pós-Graduação em Serviço Social – ONIOESTE (Campus de Toledo)/ ParanáQuereres - Núcleo de Pesquisa em Diferenças, Gênero e Sexualidade – UFSCar/ São Paulo RIZOMA - UEFS/ BahiaRUMA - Grupo População, família e migração na Amazônia - UFPA/ParáSer-Tão, Núcleo de Estudos e Pesquisas em Gênero e Sexualidade - UFG/ GoiásSEXGEN – Grupo de Pesquisa Corpo, Gênero e Sexualidade – UFPA/ ParáSociedade Brasileira de SociologiaTirésias - Núcleo Interdisciplinar de Estudos em Diversidade Sexual, Gênero e Direitos Humanos - UFRN/ Rio Grande do NorteVIOLAR - Laboratório de Estudos sobre Violência, Cultura e Juventude da Unicamp/ São PauloFonte: CLAM
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