Nas ruas ou em entrevistas, desde a juventude, o conhecido líder Ailton Krenak sempre foi questionado: “De onde você veio?”. Alguns até arriscavam: “O senhor é peruano?”. Ailton costuma responder com uma provocação: “Por que é mais fácil você identificar um peruano ou até um japonês andando nas nossas ruas e não aquele que é índio, um nativo daqui?”.Essa é uma das memórias e reflexões contidas no primeiro livro, lançado em abril, desse que é um dos mais importantes líderes indígenas no Brasil. Sua luta nas décadas de 1970 e 1980 junto ao movimento indígena foi determinante para a conquista do “Capítulo dos Índios” na Constituição de 1988, que garantiu – pelo menos no papel – o direito indígena à diferença e à terra.O livro reúne 14 entrevistas concedidas por Krenak entre 1984 e 2013, que contam a trajetória do líder, que caminha com a formação e a consolidação do movimento indígena. A liderança fala sobre sua infância no Rio Doce (MG), o genocídio dos índios Krenak - caso tratado no capítulo “Violações de direitos humanos dos povos indígenas” do relatório da Comissão Nacional da Verdade e o movimento de união entre seringueiros e indígenas, a chamada a Aliança dos Povos da Floresta.Ailton está percorrendo o Brasil realizando uma série de debates sobre o livro. A publicação será lançada neste sábado (4/7) em programação paralela à Festa Literária Internacional de Paraty.Em apresentação na Semana de Ciências Sociais da USP, em abril, Krenak fez um resgate da luta dos indígenas nas últimas décadas, remontando à criação da União das Nações Indígenas (UNI): “A gente podia ter todas as diferenças, mas começamos a nos articular em torno da ideia de 'defesa dos nossos territórios'. Os índios tinham que lutar pelos seus territórios, se não ia ser todo mundo dizimado. E a luta pela terra não parou até hoje! É escandaloso!”. No evento, lembrou ainda de outras lideranças indígenas, como Álvaro Tukano, Mário Juruna e Marçal de Souza Tupa'i que, em suas palavras “Levantam a cabeça e são fuziladas”.“Eu acho que teve uma descoberta do Brasil pelos brancos em 1500, e depois uma descoberta do Brasil pelos índios na década de 1970 e 1980. A que está valendo é a última. Os índios descobriram que apesar de eles serem simbolicamente os donos do Brasil não têm lugar nenhum para viver nesse país. Terão que fazer esse lugar existir dia a dia”, diz ele, em trecho da última entrevista do livro, concedida ao organizador da publicação, Sergio Cohn, em dezembro de 2013.A publicação tem a apresentação do antropólogo Eduardo Viveiros de Castro, que destaca a importância da obra frente ao recrudescimento das ofensivas anti indígenas em curso: “É justamente porque as coisas vão mal para os povos originários deste ‘nosso país’, batizado com o nome de uma mercadoria – uma árvore que, por ter sido implacavelmente explorada, está ameaçada de extinção –, que é importante que o ano de 2015 possa começar pela leitura do livro de Ailton, como um antídoto salutar ao nosso inauspicioso presente”.O livro foi publicado pela Azougue Editorial e está à venda no site da editora.
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