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Qualificação e trabalho para portadores de deficiência em debate

Autor original: Flavia Mattar

Seção original: Notícias exclusivas para a Rets

Empresas com até 200 funcionários são obrigadas, por lei, a preencher 2% de suas vagas com pessoas deficientes. Esse percentual aumenta para 3% quando a instituição emprega até 500 profissionais; para 4% quando o número de funcionários chega a mil e, ao exceder este número, passa para 5%. Essa foi a forma encontrada pelo governo de incluir o deficiente físico, mental e sensorial, ou seja, quem não enxerga e não ouve, no mercado de trabalho. O assunto - que tem gerado polêmica - foi tema de um seminário realizado no final de setembro, em Campinas, São Paulo, promovido pela Fundação Síndrome de Down.


O decreto 3298 foi editado pelo governo federal em dezembro de 1999. Trata-se de um texto extenso, que contém toda a política direcionada para os portadores de deficiência. O ponto mais polêmico da lei é o artigo 36, que fala da obrigatoriedade de contratação dessa parcela da sociedade. "Essa obrigatoriedade, na verdade, existe desde 1991, mas não era cumprida. A Organização Internacional do Trabalho (OIT), que investe no país, questionou o descumprimento da lei, o que fez com que o Brasil a reeditasse e passasse, com a ajuda do Ministério Público do Trabalho, a fazer uma fiscalização junto às empresas, com possibilidade de multar aquelas que não cumprirem o acordo", explica um dos palestrantes do evento, o consultor da área de Trabalho Voltado para Deficientes do Departamento Nacional do Senai, João Baptista Cintra Ribas.


Segundo João, os grandes economistas e empresários estão se movimentando para achar uma forma de cumprir a lei. O problema é que, de acordo com ele, o decreto está mal redigido e terá que ser alterado. "Eu estou sendo chamado por uma série de empresas que querem descobrir uma forma de tentar cumprir a lei. Um argumento forte é que em uma firma com 30 mil empregados, teriam que ser feitas 1500 novas contratações. Ou seja, daí ocorre um impasse: a empresa pode não estar preparada para contratar esse número de funcionários de uma hora para outra; para contratar poderá se ver obrigada a demitir 1500 funcionários sem deficiência, o que geraria conflito e desemprego; ou pode simplesmente afirmar que pode contratá-los e não encontrar um número tão grande de portadores qualificados. O decreto precisa ser mudado", avalia. A necessidade de uma maior capacitação é uma das razões pelas quais João Baptista está ajudando o Senai a implementar um projeto piloto para que os cursos profissionalizantes da instituição sejam abertos para pessoas portadoras de deficiência física ou mental.


Os empresários estão tentando elaborar propostas de alteração ao decreto do governo. Uma delas seria o fim das cotas, já que eles têm a clareza de que é importante empregar portadores de deficiência. Outra saída seria a criação de um fundo que seria usado para a reabilitação dos portadores de deficiência e para a alteração da arquitetura dos prédios dessas instituições empresariais. "O problema é que existe um receio de que haja desvios desses recursos, uma vez que temos os exemplos da LBA e do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT)", diz. Além disso, os empresários sugeriram que o número de portadores de deficiência que trabalham nas firmas que terceirizam serviços fosse contabilizado na cota de suas empresas. "Outra sugestão foi a contratação de uma instituição assistencial para a realização de trabalhos. Isso é um pouco complicado, uma vez que existem instituições e empresas que fazem isso de forma abusiva. Ou seja, os portadores de deficiência não têm qualquer vínculo empregatício e ganham uma quantia ínfima pela atividade que desempenham, entre outros problemas", explica João.


A proposta do consultor seria fazer uma emenda que permitisse que os empresários que não puderem contratar portadores de deficiência de imediato, desenvolvessem projetos em parceria com escolas, creches e outras instituições na comunidade onde a empresa está sediada para a capacitação e a melhoria da qualidade de vida dessa parcela da população. "Acredito também que essas empresas poderiam estimular a criação de incubadoras, cooperativas, além de desenvolver projetos de capacitação. Existe uma metalúrgica muito forte em São Paulo que faz um treinamento na própria indústria, dando um certificado para os deficientes", conta. João acredita que apenas um número muito pequeno de portadores de deficiência não pode trabalhar. Para ele, a tendência é que, futuramente, não seja mais necessário que haja uma lei para que esses profissionais estejam inseridos no mercado de trabalho. "Na minha opinião, será como foi com o uso do cinto de segurança: no iníco, as pessoas tinham resistência e precisavam de uma lei para usá-lo. Hoje já é um hábito totalmente incorporado ao dia a dia", conclui.

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